Luis Nassif, no Jornal
GGN
Entramos em um
dos mais interessantes quebra-cabeças da Lava Jato: a operação fruto da árvore
envenenada, possivelmente montada para livrar Aécio Neves e José Serra das
delações da OAS. Trata-se do vazamento parcial da delação do presidente da OAS
Léo Pinheiro, implicando o Ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal.
Peça
1 – o teor explosivo das delações
Já circularam
informações de que as delações da OAS serão fulminantes contra José Serra e
Aécio Neves. Até um blog estreitamente ligado a Serra – e aos operadores da
Lava Jato – noticiou o fato.
Em muitas
operações bombásticas, pré-Lava Jato, os acusados valiam-se do chamado “fruto
da árvore envenenada” para anular inquéritos e processos. A Justiça considera
que se o inquérito contiver uma peça qualquer, fruto de uma ação ilegal, todo o
processo será anulado. Foi assim com a Castelo de Areia. E foi assim com a
Satiagraha.
Na Castelo de
Areia, foi uma suposta delação anônima. Na Satiagraha, o fato dos
investigadores terem pedido autorização para invadir um andar do Opportunity e
terem estendido as investigações a outro.
Peça
2 – os truques para suspender investigações.
Vamos a um
arsenal de factoides criados para gerar fatos políticos ou interromper
investigações:
Grampo sem
áudio – em plena
operação Satiagraha, aparece um grampo de conversa entre Gilmar Mendes,
Ministro do Supremo, e Demóstenes Torres, senador do DEM. Era um grampo às
avessas, no qual o conteúdo gravado era a favor dos grampeados. Jamais se
comprovou a autoria do grampo. Mesmo assim, com o alarido criado Gilmar
conseguiu o afastamento de Paulo Lacerda, diretor da ABIN (Agência Brasileira
de inteligência). Veículo que abrigou o factoide: revista Veja.
O falso grampo
no STF – Recuperada a
ofensiva, matéria bombástica denunciando um sistema de escutas no STF. Era um
relatório da segurança do STF, na época presidido por Gilmar Mendes. Com o
alarido, cria-se uma CPI do Grampo, destinada a acuar ainda mais a Polícia
Federal e a ABIN. Revelado o conteúdo do relatório, percebeu-se tratar de mais
um factoide. Veículo que divulgou o falso positivo: revista Veja.
O falso pedido
de Lula – em pleno
carnaval da AP 470, Gilmar cria uma versão de um encontro com Lula, na qual o
ex-presidente teria intercedido pelos réus do mensalão. O alarido em torno da
falsa denúncia sensibiliza o Ministro Celso de Mello, o decano do STF, e é
fatal para consolidar a posição dos Ministros pró-condenação. Depois, a única
testemunha do encontro, ex-Ministro Nelson Jobim, nega veementemente a versão de
Gilmar. Veículo que disseminou a versão: revista Veja.
O caso Lunnus – o grampo
colocado no escritório político de Roseane Sarney, que inviabilizou sua
candidatura à presidência. Caso mais antigo, na época ainda não havia sinais da
aproximação de Serra com a Veja.
O suborno de
R$ 3 mil – o caso dos
Correios, um suborno de R$ 3 mil que ajudou a deflagrar o “mensalão”. Veículo
que divulgou: Veja. Fonte:
Carlinhos Cachoeira, conforme apurado na CPI dos Correios.
Peça 3 – a fábrica de dossiês
Com base
nesses episódios, procurei mapear os pontos em comum entre os mais célebres
dossiês divulgados pela mídia.
Confira:
Fato 1 – na Saúde,
através da FUNASA o então Ministro José Serra contrata a FENCE, empresa
especializada em grampo, o delegado da Polícia Federal Marcelo Itagiba e o
procurador da República José Roberto Figueiredo Santoro.
Fato 2 – em fato
divulgado inclusive pelo Jornal Nacional, Santoro tenta cooptar Carlinhos
Cachoeira, logo após o episódio Valdomiro Diniz.
Fato 3 – Cachoeira
tem dois homens-chave. Um deles, o araponga Jairo Martins, seu principal
assessor para casos de arapongagem. O segundo, o ex-senador Demóstenes Torres,
seu principal agente para o jogo político. Ambos têm estreita ligação com o
Ministro Gilmar Mendes: Demóstenes na condição de amigo, Jairo na condição de
assessor especialmente contratado por Gilmar para assessorá-lo.
Fato 4 – todos os
principais personagens do organograma – Serra, Gilmar, Cachoeira, Demóstenes e
Jairo – mantiveram estreita relação com a Veja, como
fontes, como personagens de armações ou como fornecedores de dossiês.
Não se tratava
de meros dossiês para disputas comerciais, mas episódios que mexeram
diretamente com a República. O organograma acima não é prova cabal da
existência de uma organização especializada em dossiês para a imprensa. São
apenas indícios.
Peça
4 – a denúncia contra Toffoli.
Alguns fatos
chamam a atenção na edição da Veja.
Fato 1 – já era
conhecido o impacto das delações de Léo Pinheiro sobre Serra e Aécio (http://migre.me/uJKsj). Tendo acesso à
delação mais aguardada do momento, a revista abre mão de denúncias explosivas
contra Serra e Aécio por uma anódina, contra Toffoli.
Fato 2 – a matéria de
Veja se autodestrói em 30 segundos. Além de não revelar nenhum fato criminoso
de Toffoli, a própria revista o absolve ao admitir que os fatos narrados nada
significam. Na mesma edição há uma crítica inédita ao chanceler José Serra,
pelo episódio da tentativa de compra do voto do Uruguai. É conhecida a aliança
histórica de Veja com Serra. A
reportagem em questão poderia ser um sinal de independência adquirida. Ou
poderia ser despiste.
Peça
5 – a posição do STF e do PGR
Um dos pontos
defendidos de maneira mais acerba pelo Ministério Público Federal, no tal
decálogo contra a corrupção, é a relativização do chamado fruto da árvore
envenenada. Querem – acertadamente – que episódios irregulares menores não
comprometam as investigações como um todo.
Se a intenção
dos vazadores foi comprometer a delação, agiram com maestria.
Sem
comprometer Toffoli, o vazamento estimula o sentimento de corpo do Supremo,
pela injustiça cometida contra um dos seus. Ao mesmo tempo, infunde temor nos
Ministros, já que qualquer um poderia ser alvo de baixaria similar.
Tome-se o caso
Gilmar Mendes. Do Supremo para fora até agora, não houve nenhum pronunciamento
público do Ministro, especializado em explosões de indignação quando um dos
seus é atingido. E do Supremo para dentro? Estaria exigindo providências
drásticas contra o vazamento, anulação da delação? Vamos aguardar os fatos
acontecerem. Mas certamente, Gilmar ganha um enorme poder de fogo para fazer
valer suas teses que têm impedido o avanço das investigações contra Aécio
Neves.
A incógnita é
o PGR Rodrigo Janot. Até agora fez vistas largas para todos os vazamentos da
operação mais vazada da história. E agora?
Se ele insiste
na anulação da delação, a Hipótese 1 é que está aliado a Gilmar na obstrução
das investigações contra Aécio e Serra. A Hipótese 2 é que está intimidado,
depois do tiro de festim no pedido das prisões de Renan, Sarney e Jucá. A
Hipótese 3 é que estaria seguindo a lei. Mas esta hipótese é anulada pelo fato
de até agora não ter sido tomada nenhuma providência contra o oceano de
vazamentos da Lava Jato.
De qualquer
modo, trata-se de um ponto de não retorno, que ou consagra a PGR e o Ministério
Público Federal, ou o desmoraliza definitivamente.
Afinal, quem
toca a Lava Jato é uma força tarefa que, nas eleições presidenciais, fez
campanha entusiasmada em favor do candidato Aécio Neves. Bastaria um delegado
ligado a Serra e Aécio vazar uma informação anódina contra um Ministro do STF
para anular uma delação decisiva. Desde que o PGR aceitasse o jogo, obviamente.
Será curioso
apreciar a pregação dos apóstolos das dez medidas, se se consumar a anulação da
delação.
PS1 - A
alegação dos procuradores, de que o vazamento teria partido dos advogados de
Léo Pinheiro, visando forçar a aceitação da delação não têm o menor sentido.
Para a delação ser aceita, os advogados adotariam uma medida que, na práitca,
anula a delação? Contem outra.
PS 2 - N
semana passada o procurador Carlos Fernando dos Santos lima já mostrava
deconforto com a delação da OAS, ao afirmar que a Lava Jato só aceitaria uma
delação a mais de empreiteiras. Não fazia sentido. A delação depende do
conteúdo a ser oferecido. O próprio juiz Sérgio Moro ordenou a suspensão do
processo, sabe-se lá por que. E nem havia ainda o álibi do vazamento
irrelevante.
Leia mais sobre temas da
atualidade:http://migre.me/kMGFD
Nenhum comentário:
Postar um comentário