Os ETs estão chegando
Cícero Belmar*
Pode parecer exótico acreditar em extraterrestres. Estranho mesmo, no
entanto, é falar de humanos que perderam a consciência da culpa enquanto
destroem o meio ambiente; acham cafona uma abordagem de misericórdia e
compaixão quando exploram os semelhantes à fome; ou expulsam indígenas das
terras em favor do agronegócio. Sou mais os ETs.
Por esses e outros indícios de que perdemos nossa humanidade, tem tudo a
ver a realização do 5º Congresso Mundial de Ufologia, previsto para ocorrer em
Barcelona (Espanha), entre 8 e 10 deste mês. O encontro reunirá as principais
cabeças pensantes do tema, no mundo, e um dos questionamentos será: “E se
houver uma intervenção alienígena agora?”.
Haverá quem levante sobrancelhas e torça o nariz, diante do tema, afinal
isso não é papo das elites cultas. Outros podem considerar que os curiosos pelo
tema são desprovidos do saber clássico. Enquanto isso, no mundo cósmico e na
Via Láctea, “mistérios sempre há de pintar por aí”.
Um ufólogo, que não anotei o nome, disse parecer inegável que, no atual
estágio de vida, estamos diante de uma oportunidade e de um ultimato. Teríamos
esgotado todos os meios educativos do Planeta e, por isso ele entende que nos
encontramos a ponto de uma invasão de ETs. Estaríamos fracassando na nossa
humanidade. O ufólogo acha que precisamos mudar o rumo das coisas ou haverá
mesmo uma intervenção alienígena.
Claro, quem quiser pode achar maluquice. Mas, soa pretensioso dizer que
somos únicos num Universo infinito. “Há muitos planetas habitáveis”, diz a
letra da música. A conclusão do ufólogo pode ser radical e polêmica, mas a
origem do pensamento é correta. Nós avançamos em todos os estágios no jogo da
perversidade. E se antes, parecia termos consciência de nossas culpas, se antes
refletíamos, a sensação é de que está tudo banalizado.
Em muitos casos, e dependendo do País, como é o caso do Brasil, parte da
população não tem mais consciência histórica, ambiental, cultural, ética. Estar
no mundo já não traz a consciência de preservação para muita gente. Não sei em
que instante parte da humanidade perdeu a noção do bem. E o peso da culpa na
prática do mal.
Por coincidência, tomei conhecimento do congresso de ufologia quando lia
o livro “Covid-19, a Mãe Terra contra-ataca a Humanidade”, do teólogo Leonardo
Boff. Ele diz que é preciso considerar o coronavírus dentro de um contexto em
que a Terra foi agredida e que ela começou a reagir.
“O covid-19 possui duas origens: o ataque humano e o contra-ataque da
Mãe Terra. Se nossa relação (daqui por diante) não for cuidadosa e respeitosa,
ela poderá nos enviar outros vírus ainda mais letais. E, eventualmente, pode
não nos querer mais. Ela continuará, mas sem nós”.
Leonardo Boff e os ufólogos falam de coisas distintas. Um, analisa a
pandemia. Os outros, as nossas inconsequências. Mas, ambos, partem do mesmo
princípio: chegamos até aqui cometendo abusos contra a nave mãe. E combinam na
avaliação: os homens, esses seres “superiores”, se sentem no direito de fazer o
que bem entender.
Lembrei-me de uma frase do escritor russo Dostoiévski, no mega romance
“Os Irmãos Karamazov”. Diz: “Se Deus não existe, tudo é permitido?”. A
consciência que predomina em muitas pessoas é a de que podemos fazer qualquer
coisa, ainda que isso prejudique alguém. Ou de que não interessa fazer o bem,
se isso não lhes traz vantagem.
Chegamos ao ponto de que os objetivos do capitalismo selvagem é que
determinam nossos desejos, nossas ações. Vamos e venhamos, os ufólogos estão
certos: que venham os ETs.
.
**Cícero Belmar é escritor e jornalista. Autor de contos, romances, biografias, peças de teatro e livros para crianças e jovens. Membro da Academia Pernambucana de Letras.
Veja: Resistência democrática implica diálogo sem preconceitos https://bit.ly/3kbDHqq
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