Pernambuco derrota Bolsonaro no leilão da Bacia Potiguar
José Bertotti*, no Portal da Fundação Maurício
Grabois
A pressão do governo de Pernambuco e da sociedade por um novo modelo de
desenvolvimento derrotou objetivo de Bolsonaro de leiloar a Bacia Potiguar na
17ª Rodada da Agência Nacional do Petróleo. "A devastação da nossa
biodiversidade e a forma como o capitalismo avança nas atividades econômicas
com degradação da natureza, como fonte inesgotável de recursos naturais, não
deve mais continuar dessa forma", alerta José Bertotti, Secretário de Meio
Ambiente e Sustentabilidade de Pernambuco, neste artigo.
A
pressão popular e a firme posição do governo de Pernambuco de contestar a
inclusão da bacia Potiguar na leilão de petróleo da décima sétima rodada da ANP
foi decisiva para que o leilão não tivesse nenhuma empresa interessada em
arrematar aquele lote. Estamos tratando de um patrimônio natural da humanidade
tombado pela UNESCO há vinte anos. Esse patrimônio se colocado em risco pode
ameaçar todo o equilíbrio de um ecossistema que representa uma importante
reserva da biodiversidade do planeta.
Desde que foi anunciada a
inclusão da bacia Potiguar o Governo de Pernambuco, através da Secretaria de
Meio Ambiente sustentabilidade e da Agência Ambiental - CPRH, fizeram todos os
esforços para demonstrar que as áreas sensíveis submetidas a leilão precisavam
passar por análise prévia de sensibilidade a abalos sísmicos. Essa diretiva está
confirmada pelo relatório do ICMBio que informou ao Ministério do Meio Ambiente
e ao Ministério das Minas e Energias que seria temerária a inclusão da Bacia
Potiguar pela sua proximidade ao Arquipélago de Fernando de Noronha e ao Atol
das Rocas.
No Conselho Gestor do Parque
Nacional Marinho de Fernando de Noronha, a Semas propôs a criação de um grupo
de trabalho envolvendo as universidades que fazem parte do conselho e foi
coordenado pelo oceanógrafo e Vice Reitor da UFPE, Moacir Araújo. Ele
aprofundou os estudos sobre os riscos envolvidos na exploração de petróleo na
bacia Potiguar identificando que não se trata tão somente da proximidade do
arquipélago de Fernando e Noronha e sim de uma cadeia de montanhas submersas
que se estende pelo litoral brasileiro até Fernando de Noronha constituindo um
conjunto de estruturas rochosas submersa na qual algumas delas emergem como
Fernando Noronha.
São exatamente elas que
constituem o habitat para uma quantidade expressiva de espécies da natureza que
vão de corais a animais marinhos, de pequeno a grande porte. Tais cadeias
montanhas representam essa riqueza biológica que será colocada em risco. Por
isso, esses documentos foram citados e, mesmo assim, não causaram efeito para
que o Ministério das Minas Energia e o Ministério do Meio Ambiente se
manifestassem de forma que, seguindo o rito de processos prévio aos leilões,
solicitassem a necessária análise prévia de bacias sedimentares em áreas
sensíveis.
Ainda no esforço de impedir a
realização desse leilão, foi feita uma audiência pública em Brasília, na Câmara
dos Deputados, solicitada pelo deputado Felipe Carreras da qual eu estive
presente juntamente com Guilherme Rocha, administrador de Fernando de Noronha.
Deve-se destacar que convidado o ministro do Meio Ambiente se negou a
participar e não mandou nenhum representante. O Governo Federal apenas contou
com representantes do Ministério das Minas e Energia que apresentou uma análise
muito simplificada para justificar a não realização dos estudos prévios dizendo
que Noronha estava apenas a 200 km da bacia Potiguar e que, segundo as análises
feitas, as correntes marítimas se dirigiam de Leste para Oeste e que não causaria
nenhum dano a Noronha caso viesse a acontecer algum vazamento de petróleo.
Noronha, dessa maneira, estaria protegida. No entanto, é importante
salientar que nós enfrentamos a crise do derramamento de óleo em 2019 e
verificamos que o litoral nordestino foi afetado em toda sua extensão, e
segundo simulações, o petróleo teria sido derramado a mais de 600 Km da
costa.
Como medida última e
necessária, o governador Paulo Câmara autorizou a Procuradoria Geral do Estado
com base nas notas técnicas emitidas pela Agência Ambiental de Pernambuco -
CPRH, a entrar com uma ação impeditiva da inclusão da bacia Potiguar no leilão
que aconteceu no dia 7 de outubro, somando-se a diversas outras iniciativas do
MPF e de diversas entidades da sociedade civil.
Como resultado dessas ações,
algumas liminares foram concedidas. Mas, todas elas foram derrubadas antes da
realização do leilão, cabendo agora a análise do mérito das ações movidas.
Com relação ao leilão, ele
acabou sendo realizado. No entanto, tornou-se um imenso fracasso do Governo
Federal porque nenhuma empresa decidiu arrematar os blocos que envolvessem as
áreas sensíveis, mais especificamente a bacia Potiguar. Felizmente, a
mobilização popular, a firme decisão do governo de Pernambuco - baseada no rito
processual que deve garantir proteção a áreas sensíveis e que não se contrapõe
a processos de exploração de qualquer recurso natural que seja necessário para
garantir o desenvolvimento brasileiro - deve ter ganho um papel relevante na
decisão das empresas que estavam habilitadas e declinaram de apresentar
propostas.
Fica a lição de que exploração
de recursos naturais só pode ser feita quando se dá segurança e proteção
ao meio ambiente. Vivemos um tempo de emergência climática a devastação da
nossa biodiversidade e a forma como o capitalismo avança nas atividades
econômicas com degradação da natureza como fonte inesgotável de
recursos naturais não deve mais continuar dessa forma.
Os graves transtornos
oriundos das já sentidas mudanças climáticas indicam que a preservação do meio
ambiente não tem contradição com o desenvolvimento econômico, pois um novo
projeto de desenvolvimento precisa ser construído, novas soluções tecnológicas
que identifique mecanismos que possam avançar na inclusão social a partir da
geração de empregos sustentáveis deve ser a tônica para que o Brasil possa sair
dessa crise econômica que vive e constitua um projeto Nacional de
desenvolvimento sustentável.
*José Bertotti é Secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Pernambuco, Professor, Químico Industrial e Mestre em Engenharia de Produção
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