Guerra na
Ucrânia: como isso vai acabar?
Estamos
chegando a um ponto extremamente perigoso com potencial de projetar a guerra
para um novo patamar não só em termos de capacidade destrutiva, como também em
abrangência do conflito
Luis Antônio Paulino, Vermelho www.vermelho.org.br
Acontecimentos recentes colocaram a guerra na Ucrânia em um novo
patamar. A retomada do controle, pela Ucrânia, de parte da região nordeste do
país que estava sob controle russo e ataques bem sucedidos a alvos russos
utilizando equipamento militar de alta tecnologia e apoio logístico fornecidos
pelos Estados Unidos produziram uma onda de otimismo no Ocidente e na própria
Ucrânia quanto aos rumos da guerra nos próximos meses. Começou-se a falar em
“ponto de virada” na guerra, como se a expulsão definitiva dos russos do
território ucraniano e inclusive a retomada das áreas ocupadas em 2014, como a
península da Criméia, fosse, agora, apenas uma questão de tempo e a derrota
definitiva de Putin estivesse logo ali.
Não é bem assim. Frente aos acontecimentos recentes, ao invés de
recuar, Putin dobrou a aposta. Determinou a mobilização de 300 mil reservistas
para lutar na guerra, realizou plebiscitos nas áreas já ocupadas, habitadas por
maioria russa, tornando-as parte da Federação Russa e ameaçou recorrer às armas
nucleares caso o território russo seja atacado por esse tipo de armamento pela
Otan. Muitos viram nessa ameaça um gesto de desespero e um blefe por parte de
Putin. Mas estariam os Estados Unidos e seus aliados na Otan dispostos a pagar
para ver?
Uma questão importante, portanto, é se os Estados Unidos e seus
aliados na Otan pretendem insistir na estratégia de fornecer armas, equipamento
militar avançado e treinamento para os ucranianos na expectativa de que, até o
início do inverno no hemisfério norte, os russos sejam empurrados pelo menos
ao status quo anterior
ao início da guerra ou se, diante da reação de Putin, irão recuar.
Tudo indica que nem os Estados Unidos irão recuar do objetivo de
não só impingir uma dura derrota a Putin na Ucrânia, mas, principalmente, de
enfraquecer militarmente a Rússia, e nem Putin aceitará ser derrotado sem antes
lançar mão de todos os meios que tenha à mão, como está ameaçando. No que
isso vai dar?
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O complexo industrial-militar privado dos Estados Unidos vem
trabalhando há anos no desenvolvimento do que eles chamam de armas nucleares
táticas. Essas armas vêm sendo desenvolvidas pela indústria armamentista
norte-americana desde o início dos anos 2000 como parte da chamada “guerra ao
Terror”, iniciada depois do 11 de setembro e são parte de uma nova geração de
armas nucleares, “menores”, “mais seguras” e “mais usáveis” no teatro de
guerras nucleares do século 21. Os russos também investiram nessa direção e
possuem armas nucleares do mesmo tipo. Provavelmente não usaram, ainda, porque
mesmo em se tratando de ogivas de menor potência do que as ogivas nucleares
convencionais, ainda assim seria difícil garantir que o próprio território
russo fosse afetado pela radioatividade carregada pelos ventos. Mas Putin não
costuma blefar.
Estamos chegando a um ponto extremamente perigoso com potencial
de projetar a guerra para um novo patamar não só em termos de capacidade
destrutiva, como também em abrangência do conflito. Para os Estados Unidos, até
por estarem geograficamente longe do palco da guerra, a estratégia de “lutar
até o último ucraniano” parece conveniente. Ademais, além dos interesses da
indústria armamentista norte-americana estar sempre envolvida em uma “boa
guerra”, lutando por uma “causa nobre”, como se estivessem num eterno filme de
Hollywood, parece ser para muitos, nos Estados Unidos, a única coisa capaz de
infundir energia nos nervos enfraquecidos de uma nação sem propósito e em
profunda decadência moral e política.
Para os russos, o conflito já deixou há muito de ser uma
“operação militar especial” para se tornar uma guerra verdadeira, uma questão
de vida ou morte, nomeadamente para Putin. Para eles já não se trata mais de
uma guerra apenas contra a Ucrânia, mas contra o Ocidente, como recentemente
declarou o ministro da Defesa russo Sergei Shoigu em um programa na televisão
russa. “Estamos em guerra não apenas com a Ucrânia e o exército ucraniano, mas
com o Ocidente coletivo”, declarou na ocasião.
Dissuadir norte-americanos e russos de levar a guerra às últimas
consequências não é coisa simples. Caminham como sonâmbulos para a beira do
precipício. Estão tão focados nos seus objetivos imediatos que
provavelmente não se dão conta das suas possíveis consequências. Em uma
carta a Werner Sombart, datada de 11 de março de 1895, o pensador alemão
Friedrich Engels afirmou: “toda a história até aqui, no que toca aos grandes
eventos, se processa sem consciência, isto é, estes eventos e as suas
ulteriores consequências não são queridos; os figurantes históricos ou quiseram
algo diretamente diferente do alcançado ou este alcançado traz por sua vez
consigo consequências imprevistas inteiramente diferentes”. Isso ocorreu
inúmeras vezes na história mundial e parece que está ocorrendo de novo.
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Os países da Europa Ocidental, especialmente a Alemanha, têm
muito a perder e absolutamente nada a ganhar com essa guerra. Por isso podem
jogar um papel para apressar o fim do conflito. Com a aproximação do inverno e
a disparada no preço da energia, muitos europeus, notadamente os mais pobres,
vão ter de escolher entre comer ou se aquecer. Caso a Rússia venha de fato
recorrer às armas nucleares, a Europa Ocidental, mesmo que não se envolva
diretamente no conflito, pode sofrer consequências graves com efeitos que podem
se estender por décadas. Supondo que tenha restado um mínimo de racionalidade
ao chanceler alemão, ao presidente francês e à nova primeira-ministra
britânica, porque os italianos já perderam o juízo faz muito tempo, é de se
esperar para as próximas semanas alguma ação mais incisiva para pôr fim ao conflito,
mesmo que seja um “acordo sujo” que não deixe ninguém totalmente satisfeito.
Por outro lado, como transpareceu do encontro entre Xi Jinping e
Putin na reunião da Organização de Cooperação de Xangai (OXC) na cidade de
Samarkand, no Uzbequistão, em 16/9, a China está crescentemente preocupada com
o desenrolar do conflito. Embora em nenhum momento a China tenha criticado
publicamente os russos pela invasão da Ucrânia, os chineses estão se abstendo
de apoiar militarmente a Rússia e vêm respeitando as sanções econômicas
impostas pelos Estados Unidos e seus aliados na Otan. As empresas chinesas
estão se abstendo de ocupar o espaço deixado no mercado russo pelas milhares de
multinacionais norte-americanas e europeias que deixaram o país nos últimos
meses. O ministro das Relações Exteriores, Wang Yi, vem pressionando por alguma
solução e por “todos os esforços para buscar a paz”; na mesma linha, o
embaixador da China na ONU, Zhang Jun, pediu a redução da escalada e “um acordo
político o mais rápido possível”.
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“por procuração”, na qual as duas forças em conflito são, na realidade, Rússia
e Estados Unidos https://bit.ly/3xiFCRi
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