10 abril 2024

Enio Lins opina

Há 60 anos, nascia o primeiro dos atos institucionais inconstitucionais
Enio Lins



Ontem, 9 de abril de 2024, se vivo e se bulindo estivesse, o inconstitucional Ato Institucional nº 1 teria soprado 60 velinhas. Mas aquela execrável criação morreu cedo, atropelada pela sucessão de atos inconstitucionais que se superpuseram – cada um pior que o outro, ao todo 17 golpes dentro do golpe – desde o início do regime ditatorial militar imposto ao Brasil no Dia da Mentira de 1964.

PRIMEIRO DE UMA SÉRIE

Esses decretos, em sequência, procuravam dar uma face “legal” à carantonha ilegal e terrorista do sistema autoritário comandado pelos militares ao longo de duas décadas. Primeiro de uma série, o inconstitucional Ato Institucional nº 1 entrou para a história como a autopermissão que a caserna golpista se concedeu para meter o pé na jaca, sob o aplauso temeroso dos golpistas civis.

AOS CIVIS, BANANAS

Embora o Brasil tivesse, desde 2 de abril de 1964, um “presidente” civil, o que se viu desde 1º de abril foram os fardados, na ponta da baioneta, fazerem a cidadania rebolar até o chão, como se antecipasse o sucesso do Furacão 2000: “Tá dominado/ Tá tudo dominado/ (Eu quero ouvir geral!)/ Tá dominado/ Tá tudo dominado”... Ranieri Mazzilli era o nome do fantoche na cadeira presidencial, mas o AI-1 foi rubricado apenas pelos militares que formavam o Comando Supremo do golpe.

MILITARES NO COMANDO

Em 9 de abril de 1964, assassinando a Constituição de 1946, assinaram o AI-1: general Arthur da Costa e Silva, almirante Augusto Hamann Rademaker Grunewald, brigadeiro Francisco de Assis Correia de Melo – os três ministros militares nomeados por Ranieri Mazzili, que com este ato o descartaram formalmente, eliminando o que restava de ilusão civil sobre alguma divisão do poder.

DITADURA REAL

Via o AI-1, os golpistas meteram os coturnos na jaca: aumentaram os poderes presidenciais, estabeleceram a escolha indireta para um novo presidente, determinaram que inquéritos pudessem ser realizados a mando do governo. Suspenderam direitos de vitaliciedade e estabilidade para o expurgo de servidores civis e militares que discordassem do golpe. E autorizaram aos militares a abrirem inquéritos contra qualquer pessoa por “perturbação da ordem pública”.

PRIMEIRAS VÍTIMAS

Indo mais além, o primeiro dos atos inconstitucionais possibilitou a retirada sumária dos direitos políticos por 10 anos contra quem ousasse se opor ao novo sistema. Através do AI-1, os militares cassaram cerca de três mil pessoas, sendo que dessas vítimas, 1.330 eram militares que não concordaram com o golpe. Nessa primeira leva, perderam os mandatos 40 integrantes do Congresso Nacional.

PRÓXIMOS ATOS

No AI-1 foi instituída a eleição indireta para presidente (com o voto direto “transferido para depois”). Com o general Castelo Branco aboletado na presidência desde 15 de abril de 1964, foram permitidas as eleições para os governos estaduais em 1965. Os golpistas tinham certeza de uma vitória esmagadora, mas perderam em cinco Estados, sendo as derrotas mais sentidas as em Minas Gerais e na Guanabara, vencidas pelos oposicionistas Israel Pinheiro e Negrão de Lima, respectivamente. Em Alagoas a oposição democrática também ganhou, reconduzindo ao Palácio dos Martírios o ex-governador Muniz Falcão - que foi impedido de tomar posse, e em seu lugar colocado um interventor (gaúcho), o general Tubino. E os atos inconstitucionais seguiram sendo editados, segundo o gosto do ditador de plantão no Palácio do Planalto.

Poema de Paulo Mendes Campos com ilustração de Helena Wierzbicki https://tinyurl.com/2jw642tm

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