26 abril 2024

Enio Lins opina

Não é brinquedo não essa alta temporada de crimes digitais

Enio Lins



“Adolescentes suspeitos de manipular imagens pornográficas com IA [Inteligência Artificial] são avo de operação policial em Alagoas”, foi manchete na semana passada. Foram cumpridos sete mandados de busca e apreensão contra jovens da chamada “classe média alta”. E agora?

DEEPFAKE

Providencialmente, aquela ação policial foi batizada de “Deepfake”, vocábulo formado pela contração de duas palavras em inglês: deep
(profunda) e fake (falsa). Termo de farto uso desde 2017 define a criação, via ferramentas de Inteligência Artificial, de imagens e áudios com aparência tão real que enganam não apenas olhos e ouvidos humanos, mas engabelam também a avançados algoritmos de segurança digital.

CRIME CONTRA A HONRA

12 jovens procuraram a polícia para denunciar que estavam sendo vítimas de deepfake simulando atos pornográficos, falsificações essas distribuídas em grupos nas redes sociais. Tanto as vítimas como os suspeitos do crime estudam em colégios particulares do mais alto nível (e custo). Os investigados são todos “dimenor”, entre 14 e 17 anos, segundo a polícia, e os pais dos jovens denunciados teriam alegado que o acontecido era “brincadeira”. Puxa, será que algum pai nessa turma faz parte do time de patriotas que defende ardentemente o mito da redução da maioridade penal?

PERIGO MUNDIAL

Touradj Ebrahimi, chefe do Laboratório de Processamento de Sinais Multimídia, da Escola Politécnica Federal em Lausanne, ouvido por Sara Ibrahim, no site www.swissinfo.ch, em 18/08/2021, declarou: “um estudo do MIT [Instituto de Tecnologia de Massachusetts] mostrou que as notícias falsas se espalham até seis vezes mais rápido do que notícias verdadeiras através da plataforma Twitter. Isto torna o fenômeno da falsificação particularmente preocupante”. O pesquisador lembrou que vários líderes mundiais, no passado, foram acusados de manipular fotos, desde Lincoln a Stalin, mas que aquelas técnicas se tornaram “brincadeira de criança” frente aos recursos de IA.

PROGRESSO IRREFREÁVEL

Para o professor Álvaro Pinheiro, pós-Doutor em Inteligência Artificial pela UFPE, “esse problema tende a se tornar recorrente, considerando que qualquer tecnologia tem o potencial de ser utilizada tanto para o bem quanto para o mal da sociedade, dependendo das intenções, e se a tecnologia for capaz de imitar a aparência e a voz de um indivíduo, isso amplia a possibilidade de uso prejudicial. No entanto, é impossível impedir o progresso tecnológico. Para minimizar o uso indevido, duas medidas são essenciais: regulamentação e educação. A primeira estabelece mecanismos legais para inibir o uso indevido, enquanto a segunda promove o letramento tecnológico, que é tão importante quanto a regulamentação.”

LIBERDADE DE CRIAÇÃO

Sem infringir à lei, é farto e fértil o campo de criação para as ferramentas de IA em publicidade, humor, cinema... isso dentro das normas vigentes, onde e quando o público tem condições de distinguir entre ficção e realidade. Deepfake e Fake News, pelo contrário, não têm como meta uma abordagem aberta, explícita, seja crítica ou adulatória, seja comercial ou cultural, de um fato e/ou de alguma pessoa – objetivam tão-somente caluniar, difamar, injuriar. Seriam “liberdade de criação e expressão” tanto quanto assim fosse a impressão e distribuição de cédulas de dinheiro falso. Pergunta-se: no velho mundo real seria brincadeirinha inocente de “jovens de bem” produzir e espalhar por aí dólares, euros e/ou reais?

As cores do tempo https://bit.ly/3Ye45TD

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