06 agosto 2024

Editorial do 'Vermelho'

O Copom na contramão do desenvolvimento nacional
A unanimidade por juros altos se restringe ao Copom e à Avenida Faria Lima, símbolo do rentismo.
Editorial do portal Vermelho www.vermelho.org.br

A decisão unânime do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) de manter, pela segunda vez seguida, a taxa básica de juros, a Selic, em 10,5% ao ano, que põe o Brasil na terceira colocação com o maior juro real entre 40 países, deriva da pressão e força do capital financeiro. Aliás, também por “unanimidade”, o mercado, dias antes, havia precificado a manutenção da Selic e já pressiona para que haja aumento da taxa na próxima reunião do Copom.

A unanimidade por juros altos, entretanto, se restringe ao Copom e à Avenida Faria Lima, símbolo do rentismo. Pesquisas de opinião indicam que entre 69% e 80% da população se preocupam com o impacto dos juros no custo de vida e apoiam a cruzada do presidente Lula sobre o BC para que baixe os juros.

Na mesma linha, as centrais dos/as trabalhadores/as foram às ruas na terça-feira (30) com a palavra de ordem Menos juros, mais empregos. O presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Josué Gomes, declarou que os juros atuais minam a competividade externa da produção nacional. Somando-se a este coro, uma nota da Confederação Nacional da Indústria (CNI) afirma que o patamar atual da Selic “explica parte significativa do alto custo do crédito, situação que implica severas restrições à atividade econômica brasileira.”

Como disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o momento era de corte da taxa, diante da queda do desemprego e da inflação controlada. Em comunicado, o Copom foi na contramão ao dizer “que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária”.

O vocabulário tecnicista não esconde a real intenção da medida, que pode ser traduzida como ação preventiva contra o efeito do emprego e da renda num suposto cenário futuro de mais demanda, com impacto na inflação, o que implicaria mais elevação dos juros. A equação é perversa, porque joga sobre os trabalhadores e o povo a conta salgada da prevenção “dos prêmios de risco dos ativos financeiros” (juros altos), o parasitismo que sangra o país e compromete seu desenvolvimento com inclusão social. Afronta a política de investimentos, essencial para puxar o crescimento econômico, além de atingir os setores sociais, uma das prioridades do governo Lula.

É uma decisão tomada de costas para o povo, que impacta o crescimento econômico, afeta o emprego, a renda e o consumo. Atinge o desenvolvimento nacional e a inclusão social, além de encarecer o crédito, reduzindo o mercado interno e os investimentos.

A insistência do presidente na queda da Selic está em linha com o slogan União e reconstrução, contrário à regência de Roberto Campos Neto no Banco Central dito “independente”, que tem olhos somente para o parasitismo financeiro.

Não entra, na contabilidade do Copom, sequer os recentes cortes de R$ 15 bilhões no Orçamento de 2024, divididos entre um bloqueio (adotado quando os gastos crescem mais do que o limite estipulado na receita acima da inflação) de R$ 11,2 bilhões e um contingenciamento (quando a falta de receita compromete o cumprimento da meta) de R$ 3,8 bilhões, anunciados para zerar o dito déficit das contas públicas, conforme estipulado pelo “arcabouço fiscal”.

O “arcabouço fiscal” foi a solução política possível, diante da correlação de forças no parlamento e na sociedade, para que o país enterrasse a emenda do teto de gastos. Todavia, está longe de ser o referencial fiscal mais adequado às necessidades do desenvolvimento soberano do Brasil. Parte de suas metas, notadamente o déficit fiscal zero, não se coadunam com a realidade de um país que passa por um processo de reconstrução. Precisa de um ritmo e de uma qualidade de crescimento superiores. Isso ficou, dolorosamente e pedagogicamente, demonstrado nos cortes bilionários na Saúde, Educação, Cidades, obras do PAC, entre outros ministérios.

Em seu pronunciamento no domingo (28), o presidente Lula mencionou o cenário de destruição e rombo das finanças em que encontrou o país e prestou contas “a cada família brasileira” sobre programas importantes, entre eles a Farmácia Popular, o Minha Casa Minha Vida, e o grande feito da queda do desemprego. De fato, foram muitas as conquistas, mas poderia ser muito mais sem a política contracionista do BC. Essas duas visões sobre o país impõem aos setores democráticos e progressistas o desafio do combate sistemático e organizado ao modelo que entrava o projeto de desenvolvimento, sustentáculo de interesses oligárquicos que se ligam ao circuito financeiro internacional.

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