03 junho 2017

Aparência e essência

Manifestos de associações nos jornais omitem 'a solução' dos empresários

Janio de Freitas, na Folha de S. Paulo

Do tumulto em Brasília para cá, a crise pareceu acalmar-se um pouco. Mas piorou. Inclusive nas alegadas ações por uma saída.
Os manifestos que as associações empresariais estão publicando, em páginas inteiras dos jornais, correspondem à pressão combinada que o empresariado forte faz sobre o Congresso e parte do Judiciário. Mas as publicidades omitem "a solução" exposta por empresários nos diálogos políticos. Tasso Jereissati e Fernando Henrique, embora muito citados em imprensa/TV, são alternativas, não preferências. A prioridade é a permanência de Michel Temer com Henrique Meirelles. O vínculo partidário muito rígido de Jereissati e Fernando Henrique representa, para os empresários entregues à ação política, o risco de que cedam à perspectiva das eleições em 2018. Seriam ambos propensos a buscar atenuantes à insatisfação do eleitorado trabalhador, mais do que a fazer as reformas trabalhista e da Previdência nos termos desejados pelo empresariado.
Os manifestos ocupam-se da má situação do país e da necessidade de superá-la. Apesar disso, o que os textos exalam é o propósito de obter aquelas reformas. Tudo é dito em função delas. E, na prática, a permanência de Michel Temer e seu grupo é o oposto do "entendimento necessário" que falam os textos. O que é crise para dezenas de milhões é visto por outros como oportunidade. Sumiram as citações à exigência, para candidaturas a presidente, de filiação partidária seis meses antes da eleição. Com isso, Nelson Jobim torna-se presença constante no noticiário, em justa retribuição às suas relações jornalísticas. Mas as manobras que burlaram a concorrência para construção da base naval e produtora de submarinos no Rio, entregando-a à Odebrecht como se fora empresa estrangeira, podem sair do silêncio a qualquer hora. Por envolver a Marinha, a Lava Jato finge que o assunto não existe -como fazia com a corrupção de gente do PSDB. Mas nem tudo pode ser sempre controlado por lá- como se viu com a corrupção de gente do PSDB.
Quando ministro da Defesa, Jobim esteve, com Roberto Mangabeira Unger, no centro das negociações de investimentos militares altíssimos (e, em grande parte, duvidosos como estratégia). Dado como proponente dos caças franceses e, depois, dos americanos, Jobim não os fez vencedores. A FAB conseguiu impor sua preferência pelo acordo com os suecos. Mas a contratação e suas piruetas para a base e os submarinos, inclusive o nuclear, efetivaram-se. Com ausência de explicações muito além da necessária ao aspecto militar. Jobim já teve a honra de ao menos uma citação na Lava Jato. Se candidato, à indireta ou à direta, pode esperar mais, com intenções decisivas.
Mais político do que empresário, e empresário mais rico do que a grande maioria dos empresários brasileiros, Jereissati não está imune a cobranças variadas. Lá pelos anos 1990, assinei textos na Folha sobre um sistema de sonegação de impostos no Ceará. Numerosas empresas usavam uma espécie de central contábil, na qual notas fiscais, frias ou não, e outros documentos entrelaçavam-se para a mágica de reduzir ou evaporar impostos. Empresas de Tasso Jereissati eram parte importante do sistema. Como nem o seu prestígio de governador conseguia parar as investigações da Superintendência da Polícia Federal no Estado, Jereissati obteve de Romeu Tuma, então diretor da PF, a substituição do delegado-superintendente. Pronto. Mas o caso pode voltar à superfície. Apesar de pouco citados, e de só contarem com trabalho de apoiadores discretos, dois nomes desfrutam de muito mais prestígio público do que os políticos mais citados para substituir Temer: Ayres Britto, ex-ministro do Supremo, com ampla aceitação entre os menos desinformados, e alto conceito ético e cultural; e o também ex-ministro Joaquim Barbosa, com ampla aceitação pública, mas temido pelos políticos. Nessa linhagem, Cármen Lúcia é o óbvio desde o primeiro momento -exceto na Câmara e no Senado.
Brasileirinhas:
1) Aécio Neves gastou horas de explicações, mas sem explicar por que os R$ 2 milhões tomados de Joesley Batista, "para pagar advogado", foram parar com o filho do senador Zezé Perrella, e não com sua defesa. 2) Raul Jungmann deu como mal-entendido sua afirmação de que o Exército foi chamado pelo deputado Rodrigo Maia, e não por Temer. Bem entendido, o Exército vai para as ruas sem que o ministro da Defesa precise saber sequer quem o pediu. 3) Mais um massacre, dez mortos, feito pela PM do Pará. A polícia do Pará precisa ser presa. 
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