16 julho 2020

Incompetência e mesquinhez


BNDES executa só 29% do pacote anticrise
Valor Econômico
Essa matéria, que transcrevo do Valor de hoje, é emblemática da dificuldade do governo federal viabilizar, de fato, o socorro aos diversos segmentos da economia afetados pela pandemia. Não apenas por obstáculos burocráticos, mas por uma espécie de incompetência e de desconhecimento da realidade institucional e empresarial.

O pacote do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para combater os efeitos da covid-19 na economia teve execução de 29% do autorizado, mostra documento enviado ao Congresso. Dos R$ 87,1 bilhões previstos, foram liberados R$ 25 bilhões em empréstimos, doações e suspensão de pagamentos. O único programa que atingiu a meta foi o de empréstimos para capital de giro de micro, pequenas e médias empresas. Lançada em março, a linha liberou inclusive mais do que o previsto inicialmente, atingiu R$ 5,3 bilhões e já não permite mais contratações. Ela será reaberta com mais R$ 5 bilhões. Entre os desempenhos mais fracos estão os empréstimos para hospitais e laboratórios médicos se equiparem para a covid-19. Foram apenas nove clientes, atingindo só 13% dos R$ 2 bilhões colocados à disposição. O banco diz que houve baixa demanda. O superintendente da Federação Brasileira de Hospitais, Luiz Fernando Silva, explica que isso ocorreu porque a linha era para investimentos, o que tenderia a gerar ociosidade depois. “Não teria lógica pegar esse dinheiro. Depois que passar a pandemia os hospitais ficariam estocados e com uma dívida”, diz. Silva afirma que a necessidade do setor, que enfrenta dificuldades, é por linhas de capital de giro e que a oferta de recursos para isso é insuficiente. O BNDES informa que lançou uma nova linha de R$ 2 bilhões com esse objetivo, embora esse programa seja para grandes empresas do setor. As menores estão sendo direcionadas para o Programa Emergencial de Acesso ao Crédito (PEAC).
No documento consta também a campanha (“Salvando Vidas”), em que o banco dobra a doação de empresas para compra de equipamentos para hospitais públicos. Divulgada em abril com “potencial para se tornar a maior ação desse tipo na história do país”, até agora alcançou R$ 23 milhões de R$ 100 milhões autorizados.

A pior execução é o Programa Emergencial de Suporte ao Emprego (Pese), considerado um fiasco no próprio governo. A linha ofertou R$ 40 bilhões para empresas pagarem a folha de salários, com compromisso de manter os empregos por igual período, mas entregou apenas um décimo disso. O BNDES afirma que entraves foram percebidos (como o limite de faturamento baixo e exigência de financiar toda a folha) e estão sendo ajustados no Congresso para o “Pese 2”. Fontes do banco dizem ainda que muitas empresas recorreram a outra proposta do governo, que permitiu corte de salários e jornada, em vez de se endividarem para pagar a folha.

Outra medida que não atingiu todo seu potencial, segundo o documento, foi o “stand still” (suspensão dos pagamentos) dos empréstimos para empresas por seis meses (o valor não pago é recalculado com juros e acrescido às parcelas). O banco autorizou que R$ 29,5 bilhões fossem suspensos, mas só 39% dos clientes usaram isso. A instituição diz que o volume previsto considerou a hipótese extrema de todos os clientes aderirem a esse adiamento, mas essa é uma decisão individual.

O apoio ao setor aéreo, com R$ 6 bilhões disponíveis, até agora não saiu. O banco informou que continua negociando emprestar com instrumentos de mercado para as companhias do setor, que é um dos mais afetados pela crise, mas evitou entrar em detalhes. Para o presidente da Associação dos Funcionários do BNDES, Arthur Koblitz, o nível de execução reflete uma combinação de problemas. Entre eles, a elevação recente da TLP, a taxa de referência de grande parte das operações, o prêmio de risco elevado dos bancos repassadores e o desinteresse deles por algumas operações. “O ideal era modificar a TLP e trabalhar mais articulado com bancos públicos para conseguir prêmios de risco menores”, disse. O BNDES, contudo, avalia que a questão principal é a oferta de recursos e não os custos da TLP. Gerente-executivo de Economia da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Renato da Fonseca, afirma que os programas de financiamento são onde as políticas governamentais têm sido menos eficazes. O Pese, ressalta, teve muitas travas, mas há expectativas que as mudanças façam o dinheiro começar a sair, como no Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe). “Mas há dúvidas se o PEAC terá o mesmo sucesso do Pronampe, já que as garantias do governo são menores”. Relator da comissão da covid-19, o deputado Francisco Junior (PSD-GO) diz que os empréstimos são uma das principais batalhas do grupo nas audiências com a equipe econômica. “Eles dão explicações técnicas, dizem que estão fazendo o possível e responsabilizam os bancos”, disse. “A informação é de que está melhorando, mas ainda não estamos satisfeitos.”
Nem clarins, nem tambores. Muita luta, sim  https://bit.ly/2CwMpND

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