São
as entranhas brasileiras
Demonstrações que Bolsonaro deveria ser investigado
com rigor não cessam
Janio de Freitas, Folha de S. Paulo
Nenhum
presidente legítimo, desde o fim da ditadura de Getúlio em 1945 —e passando sem respirar
sobre a ditadura militar— deu tantos motivos para ser investigado
com rigor, exonerado por impeachment e processado, nem contou com tamanha
proteção e tolerância a seus indícios criminais, quanto Jair Bolsonaro. Também na história entre o
nascer da República e o da era getulista inexiste algo semelhante à atualidade.
Não há polícia, não há Judiciário, não há Congresso, não há Ministério Público,
não há lei que submeta Bolsonaro ao devido.
As
demonstrações não cessam. Dão a medida da degradação que as instituições, o
sistema operativo do país e a sociedade em geral, sem jamais terem chegado a
padrões aceitáveis, sofrem nos últimos anos. E aceitam, apesar de muitos
momentos dessa queda serem vergonhosos para tudo e todos no país.
Nessa
devastação, Bolsonaro infiltrou dois guarda-costas no Supremo Tribunal Federal.
Um deles, André Mendonça, que se passa por cristão, na
pressa de sua tarefa não respeita nem a vida. Ainda ao início do julgamento, no
STF, do pacotaço relativo aos indígenas, Mendonça já iniciou seu empenho em
salvá-lo da necessária derrubada.
São
projetos destinados a trazer a etapa definitiva ao histórico extermínio dos indígenas. O
pedido de vista com que Mendonça interrompeu o julgamento inicial, "para
estudar melhor" a questão, é a primeira parte da técnica que impede a
decisão do tribunal. Como o STF deixou de exigir prazo para os seus alegados
estudiosos, daí resultando paralisações de dezenas de anos, isso tem
significado especial no caso anti-indígena: o governo argumentará, para as
situações de exploração criminosa de terras indígenas, que
a questão está sub judice. E milicianos do garimpo, desmatadores,
contrabandistas e fazendeiros invasores continuarão a exterminar os povos
originários desta terra.
Muito
pouco se fala desse julgamento. Tanto faz, no país sem vitalidade e sem moral
para defender-se, exangue e comatoso. Em outro exemplo de indecência
vergonhosa, nada aconteceu à Advocacia-Geral da União por sua defesa a uma das
mais comprometedoras omissões de Bolsonaro. Aquela em que, avisado por um deputado federal e um servidor
público de canalhices financeiras com vacinas no Ministério da Saúde, nem ao
menos avisou a polícia. "Denunciar atos ilegais à Polícia Federal não faz
parte dos deveres do presidente da República", é a defesa.
A
folha corrida da AGU é imprópria para leitura. Mas, com toda certeza, não
contém algo mais descarado e idiota do que a defesa da preservação criminosa de
Bolsonaro a saqueadores dos cofres públicos. Era provável que a denúncia nada
produzisse, sendo o bando integrado pela máfia de pastores, ex-PMs da milícia e
outros marginais, todos do bolsonarismo. Nem por isso o descaso geral com esse
assunto se justifica. Como também fora esquecido, não à toa, o fuzilamento de
Adriano da Nóbrega, o capitão miliciano ligado a Bolsonaro e família, a
Fabrício Queiroz, às "rachadinhas" e funcionários fantasmas de Flávio, de Carlos e do próprio Bolsonaro. E
ligado a informações, inclusive, sobre a morte de Marielle Franco.
Silêncio
até que o repórter Italo Nogueira trouxesse agora, na Folha, duas
revelações: a irmã de Adriano disse, em telefonema gravado, que ele soube de
uma conversa no Planalto para assassiná-lo. Trecho que a Polícia Civil do Rio escondeu do relatório de suas, vá lá,
investigações. O Ministério Público e o Judiciário estaduais e o Superior
Tribunal de Justiça não ficam em melhor posição, nesse caso, do que a polícia.
São partes, no episódio de implicações gravíssimas, de uma cumplicidade que
mereceria, ela mesma, inquérito e processo criminais. O STJ determinou até a
anulação das provas no inquérito das "rachadinhas", que, entre outros
indícios, incluía Adriano da Nóbrega.
Desdobrados
nas suas entranhas, os casos aí citados revelariam mais sobre o Brasil nestes
tempos militares de Bolsonaro do que tudo o mais já dito a respeito. Mas não se
vislumbra quem ou que instituição os estriparia.
.
Veja: O nó da terceira via
https://bit.ly/35Q9UAn
Nenhum comentário:
Postar um comentário