Novo recurso
do WhatsApp, 'Comunidades' pode facilitar circulação de notícias falsas
O Globo
O anúncio do WhatsApp feito nesta quinta-feira
sobre o novo recurso que permite reunir grupos em uma só caixa de mensagens
pode ter consequências na circulação de notícias falsas. Segundo a empresa, a
novidade em fase de testes, chamada Comunidades, vai permitir que
administradores reúnam diferentes grupos sob um só guarda-chuva, ampliando o
alcance de mensagens. Atualmente, os grupos de WhatsApp podem ter no máximo 256
membros.
O recurso estará em testes nos próximos meses e deve ser lançado
no próximo ano, segundo a empresa. Não está claro se poderá ser lançado após o
segundo turno da eleição de outubro e a posse em janeiro de 2023, o que também
é motivo de preocupação. O presidente da República, Jair Bolsonaro, vem
colocando a lisura do processo eleitoral em xeque, e um WhatsApp menos restrito
para circulação de mensagens pode impulsionar mensagens de contestação do resultado
das eleições, tal como aconteceu nos Estados Unidos após a derrota do
ex-presidente Donald Trump.
"Dessa forma, as pessoas podem receber atualizações
enviadas para toda a Comunidade e organizar facilmente grupos de discussão
menores sobre o que é importante para elas. As comunidades também conterão
novas ferramentas poderosas para administradores, incluindo mensagens de
anúncio enviadas a todos e controle sobre quais grupos podem ser
incluídos", informou o WhatsApp.
A empresa diz que a atualização foi pensada para grupos de
amigos, conhecidos e familiares como escolas, clubes e organizações sem fins
lucrativos. "Enquanto outros aplicativos estão criando bate-papos para
centenas de milhares de pessoas, optamos por nos concentrar em apoiar os grupos
que fazem parte do nosso dia a dia".
Em janeiro, O GLOBO mostrou que especialistas brasileiros
demonstraram preocupação acerca da nova funcionalidade, ao serem procurados
pela empresa, no mês anterior, para uma pesquisa de mercado — ocasião em que o
recurso em testes foi apresentado. Segundo eles, o Comunidades pode turbinar a
disseminação de notícias falsas e ataques virtuais, já que o aplicativo está
presente em 99% dos smartphones no Brasil, segundo levantamento da Opinion Box,
e figura como a principal fonte de informação dos brasileiros, de acordo com
pesquisa realizada pelo Congresso em 2019.
Após O GLOBO publicar a reportagem, o presidente do Tribunal
Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, marcou uma reunião com
o chefe internacional do WhatsApp, Will Cathcart, para debater as ações que
serão implementadas pelo aplicativo de mensagens para combater notícias falsas
e apoiar o processo eleitoral no Brasil para as eleições. Na conversa, Barroso
ouviu de Cathcart que a empresa não implementaria mudanças consideráveis até o
pleito de outubro.
"Nós acreditamos firmemente em proteger a privacidade das
conversas das pessoas e acreditamos em mudanças cuidadosas como limites para o
encaminhamento de mensagens, que desencorajam a desinformação ao mesmo tempo
que respeitam a privacidade. Nós manteremos as medidas efetivas que tomamos e
não estamos planejando nenhuma mudança significativa para o WhatsApp no Brasil
durante o período eleitoral", afirmou o executivo.
O temor de especialistas e autoridades recai sobre o fato de que
a circulação em massa de mensagens com conteúdo falso, especialmente em
ambientes fechados, como o WhatsApp, foi apontada como uma ameaça na eleição de
2018, o que levou autoridades a se mobilizarem para evitar o mesmo cenário este
ano. Daqui a seis meses, o país passará por novas eleições presidenciais.
Analistas relacionam o movimento da Meta, empresa dona do
WhatsApp, Facebook e Instagram, ao crescimento do concorrente Telegram. No
Brasil, o aplicativo russo estava em 53% dos aparelhos em agosto de 2021 (o
índice era de 15% três anos antes) e tem uma filosofia de mínima moderação e
possibilidade de compartilhamento irrestrito de mensagens e, por isso, virou
terreno fértil não para desinformação e compartilhamento de conteúdo criminoso.
A plataforma permite a existência de diversos grupos e canais que negociam
venda de armamentos, comprovantes de vacina falsos, pornografia infantil,
distribuição de vídeos de tortura e execuções e conteúdo nazista e antissemita.
Além disso, o Telegram permite grupos de 200 mil pessoas e
canais com número ilimitado de inscritos. O canal de Bolsonaro, por exemplo,
possui 1,3 milhão de inscrições.
Após a reportagem do GLOBO, o Ministério Público Federal em São
Paulo questionou a empresa, num inquérito civil, acerca da preocupação com o
impulsionamento de notícias falsas no aplicativo. A empresa respondeu que
"possui uma abordagem responsável em relação à inovação e continua a
investir em limites cautelosos em relação à viralização de desinformação,
enquanto protege a privacidade das comunicações entre as pessoas", sem
especificar o que seriam "limites cautelosos".
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Veja: O nó da terceira via
https://bit.ly/35Q9UAn
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