O futebol mudou para melhor
O inovador Manchester City
usa o esquema 2-3-5, de quando o futebol começou
Tostão, Folha de S. Paulo
O neurologista e cientista Miguel Nicolelis, autor do livro "Muito
Além do Nosso Eu", ressaltou em uma entrevista à CNN a
importância dos recursos tecnológicos para o conhecimento e, ao mesmo tempo,
alertou para a tendência de essas ferramentas diminuírem a inteligência humana,
já que a estrutura dos computadores é binária, ou seja, é isso ou aquilo, certo
ou errado, deleto ou não deleto.
O ser humano precisa também questionar, inventar, divagar,
divergir. Não é uma coisa ou outra. Há o risco de essa estrutura binária ser
cada vez mais incorporada pelos humanos e estimular a polarização, a
radicalização e a violência, como as absurdas e criminosas invasões e
destruições do patrimônio público ocorridas em Brasília. As pessoas, cada vez
mais tendenciosas, perdem o senso da realidade.
Nos últimos dias, morreram três grandes atacantes: Pelé, o maior jogador da história, o italiano Vialli e Roberto
Dinamite, o maior ídolo do Vasco, com quem convivi, por
pouquíssimo tempo, quando ele, jovem, passava para a equipe principal.
Ao me lembrar de Pelé, penso nas conquistas de 1958, 1962 e
1970. Em 1958 e em 1962, o ponta-esquerda Zagallo recuava para formar um trio
no meio-campo, com Zito e Didi. Em 1970, o técnico Zagallo deslocou Rivellino
do meio para o lado, para formar, com Gerson e Clodoaldo, o trio de
meio-campistas.
Com o tempo, o trio
do meio-campo com um ponta recuado foi substituído por três clássicos
meio-campistas. O avanço pelos lados passou a ser do autêntico ponta ou do
lateral ou do ala, no esquema com três zagueiros. Na Copa do Qatar, esse trio
pelo meio foi o esquema mais usado. A Argentina usou vários esquemas táticos,
mas sempre teve três jogadores pelo meia, Enzo Fernández pelo centro, De Paul
pela direita e Mac Allister pela esquerda.
Chama-me a atenção
nas análises a preocupação constante com o meia de ligação e a ausência de
comentários sobre os meio-campistas que atuam de uma intermediária à outra, chamados
ainda de segundos volantes, como se o meio-campo fosse dividido, como no
passado, entre o primeiro volante, o segundo volante e o meia de ligação ou
meia ofensivo. O futebol mudou, pelo menos nas grandes equipes.
Na conquista do
Mundial de 1994, o Brasil utilizou a formação clássica inglesa, com duas linhas
de quatro e com dois atacantes, Romário e Bebeto. Raí, que era um excelente
meia-atacante no São Paulo, jogou pela direita, recuado, marcando ao lado do
volante, o que não sabia fazer. Foi substituído pelo volante Mazinho. Na
conquista de 2002, Felipão seguiu o modelo da Argentina, dirigida por Bielsa,
com três zagueiros, dois alas, um volante, um meio-campista e mais três no
ataque (Ronaldo, Ronaldinho e Rivaldo).
Hoje, há muitas variações na maneira de jogar. O Manchester City é o
time mais inovador, pois atua com cinco atacantes, um ponta aberto de cada
lado, um centroavante e dois meio-campistas, que estão sempre próximos à área
adversária, já que o time marca por pressão e passa a maior parte do jogo com a
bola no ataque. Um ou os dois laterais costumam ser apoiadores, ao lado do
único volante, ou melhor, do centromédio, que também avança, Rodrigo. Parece o
esquema 2-3-5, de quando começou o futebol.
As coisas vão e voltam, com novos nomes, novos detalhes, novas
maneiras de enxergar o jogo e novos conhecimentos científicos. O encontro é
quase sempre um reencontro com o que vivemos ou com o que imaginamos.
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