Brasil: A literatura como um direito humano
A reconstrução nacional também requer políticas de livros
e leitura. Alguns pontos são essenciais: integrar fomento, formação e difusão;
abrir diálogo entre os diversos segmentos; e estimular produção literária, com
ênfase na periferia e na diversidade
Ricardo
Queiroz Pinheiro/Outras Palavras
Trago comigo um retrato
que me carrega com ele bem antes
de o possuir bem depois de o ter perdido.
Toda felicidade é memória e projeto.
Cacaso1
A história recente
do Brasil está marcada pela exposição de nossas fraturas. A ruptura
institucional operada pelo golpe de 2016 trouxe consequências nefastas para as
políticas públicas e para os direitos sociais e exigiu uma série de movimentos
e arranjos das forças políticas construídas na Nova República, para sobreviver
à sombra do avanço da extrema direita. Este texto tenta contar uma parte dessa
história sob a perspectiva das contendas, arranjos, avanços e retrocessos em
torno das políticas públicas do livro e leitura. Discorrer de forma crítica
sobre política, cultura, direito à leitura e, de maneira mais abrangente, sobre
direitos humanos, exige equilíbrio, disposição e desprendimento para o debate.
No processo
eleitoral de 2022, o candidato Luiz Inácio “Lula” da Silva citou várias vezes o
livro e a leitura como prioridade do seu possível governo. Animou, assim, o
campo do livro e leitura, abrindo a possibilidade de construção de novos
caminhos. Algo alentador diante da herança de retrocessos legada pelos governos
de Michel Temer e Jair Bolsonaro. Eleito, Lula da Silva, em seu discurso de
posse, reafirmou o compromisso com as seguintes palavras:
“Estamos revogando os
criminosos decretos de acesso a armas e munições que tanta insegurança e mal
causaram às famílias brasileiras. O Brasil não quer e não precisa de armas na
mão no povo. O Brasil precisa de segurança, de livros, de educação e de cultura
para que a gente possa ser um país mais justo.”
Antonio Candido, em seu texto A literatura é
um direito humano2, de 1988, defendeu que a ideia de fabulação é uma
necessidade básica do ser humano e que o direito à literatura deve se
conjugar aos demais direitos políticos e sociais básicos para uma vida digna.
Podemos acrescentar à concepção de Candido que o direito à leitura se aglutina,
com precedência, ao direito à literatura, sendo assim indivisíveis. O texto
citado foi escrito e apresentado em um momento de digressão e esperança na
sociedade brasileira, às vésperas da primeira eleição direta para presidente,
logo após o processo de transição da ditadura civil-empresarial-militar para a
Nova República, no contexto da aprovação da Constituição de 1988.
A frase que dá nome ao artigo de Candido reverbera há décadas entre educadores, bibliotecários, escritores, mediadores, editores e leitores, sempre que o livro e a leitura são colocados em questão. É necessário todo um esforço dos militantes e profissionais do livro e leitura, o que inclui politização, alteridade e efetividade para que ela não se transforme num mero slogan, mas se espraie como uma conquista da sociedade brasileira. Considero que estamos num momento histórico, em que se apresenta novamente o confronto entre a democracia e o autoritarismo, que é oportuno para fazermos com que a máxima defendida por Antonio Candido, que está endossada pela Constituição de 1988, afete o maior número de pessoas. É preciso mais que boas intenções para construir um ambiente político em que o direito ao livro, à leitura e à literatura seja um valor e uma possibilidade para todas e todos. Porém, para entendermos o que e como fazer, é necessário que conheçamos onde avançamos e onde retrocedemos na história recente, as escolhas, os erros e acertos, só assim abriremos o caminho da ação diante dos desafios que se apresentam.
As consequências de um golpe
Falamos de Antonio Candido, da Constituição de 1988 e da Nova República para darmos um salto na história e nos conectarmos ao pleito de 2022, momento em que o então candidato à Presidência da República do Brasil, Luiz Inácio “Lula” da Silva, declarou em várias passagens de sua campanha, que caso fosse eleito, numa evidente analogia às prioridades do seu opositor, Jair Bolsonaro, na sua gestão os livros iriam substituir as armas. As declarações de Lula, para além dos motes e memes eleitorais, serviram de alento e mobilização para os diversos setores do livro e leitura que enfrentaram muitas dificuldades nos últimos seis anos.
É importante que localizemos e apontemos quais foram essas dificuldades, para que os valores debatidos e defendidos fiquem demarcados e fatos substituam ilações. Nesse sentido, é bom frisar que não foi apenas a apologia às armas e aos valores reacionários e fascistas que marcaram os seis últimos anos de nossa história na área do livro e leitura. Como se isso já não bastasse, todas as prioridades do governo Bolsonaro, e aqui ele converge com seu antecessor, Michel Temer, foram pautadas pela lógica neoliberal, e consequentemente, por grandes cortes orçamentários na área social, cultura e educação, obviamente inclusas. Essa escolha se traduziu no esvaziamento e/ou extinção das políticas públicas, resultado da adoção de uma política fiscalista, tendo como objetivo principal o pagamento de juros da dívida interna, demanda imediata do capital.
Assim, o governo de Michel Temer e sua “Ponte para o Futuro” representaram uma mudança significativa, uma digressão em relação aos governos de Lula e Dilma. O que se seguiu ao golpe de 2016 funcionou como uma transição para que o presidente eleito em 2018, Jair Bolsonaro, e seu superministro da economia, Paulo Guedes, fossem implacáveis e diligentes na implementação de uma política ultraliberal na economia e conservadora nos costumes. Diante dessa nova realidade, o campo da cultura foi atingido duplamente, de um lado pelo sistemático ataque conservador aos seus fundamentos e valores, de outro pelos cortes significativos na peça orçamentária do Ministério da Cultura.
Na área do livro e leitura, a consequência do pós-golpe de 2016 foi o desmantelamento das políticas públicas, iniciadas pelo governo recém-empossado à época, que assumiu proporções inéditas no governo seguinte. Neste, ocorreu a extinção do Ministério da Cultura – que havia sido ensaiada ainda no governo Temer – pela drástica redução orçamentária, paralisação das políticas de fomento, difusão e formação do Departamento do Livro, Leitura, Literatura e Biblioteca, além da inutilização da estrutura administrativa, que foi alocada dentro de um “puxadinho” no recém-criado Ministério do Turismo e Cultura. Somou-se a isso a total desconsideração do Plano Nacional do Livro e Leitura e da Política Nacional de Leitura e Escrita, Lei 13.696/2018 – Lei Castilho -, que foi aprovada com muita luta e pressão da sociedade em 2018.
Outro ponto que merece destaque foram as trocas recorrentes de diretores e coordenadores nas instâncias administrativas e o perfil antidemocrático e totalmente alijado do universo do livro e leitura dessas pessoas. A leitura na era Bolsonaro saiu contrária aos seus propósitos basilares não por desleixo ou esquecimento, mas por escolha, pelo desejo de destruição. Foi, na verdade, uma escolha da força política que nega os direitos humanos e a emancipação que a cultura e a educação podem ajudar a produzir. Uma vez que alardeou constantemente uma guerra cultural no país, o governo Bolsonaro não iria mesmo investir na formação de leitores e na expansão da produção livresca e de conhecimento.
Um dos fatos mais emblemáticos dessa contraposição foi a publicação do livro Armas & Defesa: A História das Armas do Brasil, com tiragem de três mil exemplares e 120 páginas, bancada pela fábrica de armas Taurus, por meio da Lei Rouanet, que seria distribuído pelo Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas, em 2022. O livro em si não é o grande problema, mas o anúncio com pompa e circunstância de sua edição e distribuição, que deixaram evidente a prioridade e a escolha belicista defendida pelo governo Bolsonaro.
Não por acaso, Jair Bolsonaro surgiu como legitimo representante dos saudosos da ditadura e de seus valores, daí seu ódio à democracia, à soberania e às políticas que promovem a emancipação, a autonomia, e que respeitam as diferenças e a diversidade do povo brasileiro. Nesse sentido, o desejo de Lula e Candido de democratizar o livro, a leitura e a literatura (que inicia esse texto) apresentam grande conexão, sobretudo quando o primeiro faz a contraposição entre livros e armas e o segundo conjuga o direito à fabulação, proporcionada pela leitura e a literatura, aos direitos básicos do ser humano. Ambos nos mostram que a cultura e a barbárie, obviamente, se contrapõem na construção de um projeto para o país.
As bibliotecas públicas de portas fechadas
Aqui abro um parêntese para falar da situação atual das bibliotecas públicas e como elas foram afetadas pela descontinuidade das políticas públicas. Umas das consequências concretas dos retrocessos citados anteriormente se apresentam em números divulgados em relatório pelo próprio Ministério do Turismo e Cultura em abril de 2020, no qual consta que o Brasil perdeu 764 bibliotecas públicas3 entre 2015 e 2020. Saímos de 6.057 bibliotecas oficialmente registradas, em 2015, para o número de 5.293, entre municipais, distritais, estaduais e federais, nos 26 estados e no Distrito Federal. Há um entendimento de que a responsabilidade por essa queda deve ser dividida entre União, Estados e Municípios, mas é inquestionável que a falta de uma política nacional e dos respectivos recursos para as bibliotecas públicas agravaram essa perda. Nesse caso, o governo Bolsonaro aprofundou um quadro que vem se deteriorando há décadas, tendo tido apenas um hiato de recuperação durante os anos de implantação do PNLL, entre 2008 e 2010, quando foram destinados recursos substanciais do MinC à modernização e abertura de bibliotecas, principalmente municipais.
Não é mero acaso que as bibliotecas públicas são atingidas diretamente pela desconstrução das políticas públicas, uma vez que são a representação fidedigna da necessidade de elos entre os âmbitos federal, estadual e municipal. Uma política de Estado é fundamental para a manutenção e desenvolvimento das bibliotecas públicas. Se não há conexão e sinergia entre as políticas dos entes federativos, as bibliotecas se ressentem, passando do sucateamento para a extinção como se fosse um fluxo natural. É para justificar esse quadro de abandono, na maioria das vezes de forma anedótica, que aparecem as frases proferidas como afirmação ou indagação por alguns gestores e administradores públicos, tais como: “as bibliotecas físicas não têm lugar no mundo digital” ou “quem ainda frequenta bibliotecas?” e mais, “as bibliotecas virtuais vão substituir as físicas”. De resto, essas frases representam a expressão máxima da distorção, da dissimulação e da desqualificação como justificativa do desmonte.
Destaco o caso das bibliotecas públicas porque é o local/dispositivo em que atuo há vinte e nove anos, e, dentro desse período, vivenciei diversas fases de abandono e sucateamento. Em contrapartida, vi o público e os seus usos das bibliotecas em que atuei se transformando, trazendo novos desafios, novas demandas e mostrando que a cidade e os desejos dos seus citadinos se transformam e esperam outras leituras e outras estratégias para a biblioteca pública. Daí a necessidade de elaboração, implementação e acompanhamento de políticas públicas com continuidade, que respondam a essas transformações. A verdadeira biblioteca viva, não como slogan, mas como um organismo pulsante das cidades.
Portanto, apontar os retrocessos das políticas públicas do livro e leitura nos últimos seis anos não é objeto da rinha ideológica ou um conjunto de frases animadas pela antipatia sobre este ou aquele governo, mas é, sim, elementar constatação do sucateamento das políticas existentes, esvaziamento dos orçamentos e aniquilação de estruturas, e, sobretudo, dos ataques sistemáticos à cadeia de atores e agentes da cultura, que trouxeram consequências danosas para as políticas públicas. Não foi apenas abandono, foram escolhas de desconstrução que encontraram campo fértil em um governo autoritário, de perfil neofascista em aliança com o neoliberalismo. O fechamento das bibliotecas públicas evidencia um dos sintomas dessa realidade, e esse quadro é um excelente termômetro para entendermos o que é a interrupção e a ausência de políticas públicas.
O legado de 2003-2014
Seguindo e para entender melhor a profundidade dos retrocessos do período 2016-2022, é necessário que localizemos os avanços de outrora. Esses retrocessos confirmam o que o professor e pesquisador Albino Rubim nomeia como as três tristes tradições das políticas culturais brasileiras4: a instabilidade, o autoritarismo e a ausência. Para reafirmar o conceito de Rubim, é importante localizar e nomear os avanços que ocorreram entre 2003-2015 no campo do livro e leitura e reforçar os contrapontos. Para tal, escolhi dois momentos dos governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff, que se destacam na participação social e na institucionalização dos seus organismos:
O primeiro deles foi o movimento em torno da construção do Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL), cujo marco inicial se deu entre 2005 e 2006, numa ampla mobilização e articulação nas macrorregiões do país (RS, SP, RJ, MG, CE, DF, PA), seguido da portaria interministerial de 2006, que criou o PNLL, da criação da Secretaria Nacional do Livro, Leitura, Literatura e Biblioteca (DLLLB) no Ministério da Cultura em 2008 e do decreto presidencial que institucionalizou o Plano em 2011. As marcas de identidade do PNLL são: a parceria entre Ministério da Cultura e Ministério da Educação, o arranjo entre Estado e Sociedade à luz dos quatro eixos de ação – democratização do acesso; fomento à leitura e à formação de mediadores; valorização institucional da leitura e incremento de seu valor simbólico; desenvolvimento da economia do livro. Em 2010, na construção da II Conferência Nacional de Cultura, a Pré-Conferência da Setorial do Livro,Leitura, Literatura e Biblioteca aprovou as ações do PNLL;
- A criação da
Diretoria do Livro, Leitura, Literatura e Biblioteca (DLLLB) no MinC, em
2008, promoveu impulso, lastro e diretrizes paras os programas, projetos e
ações do livro e leitura no Governo. Os eixos norteadores do PNLL foram os
principais parâmetros para a construção dos projetos e programas dentro da
DLLLB. No orçamento, o salto foi significativo, dos seis milhões usuais
até 2007, para a média de noventa e cinco milhões em 2008/2009, chegando a
cem milhões em 2010. Em 2014, após uma breve mudança da DLLLB para a
Fundação Biblioteca Nacional em 2011, foram incorporados à DLLLB o
Departamento e Coordenações-Gerais de Leitura e de Literatura e Economia
do Livro; o Sistema Nacional de Bibliotecas (SNBP) e o Programa Nacional
de Incentivo à Leitura (PROLER), estes últimos criados e até então
estabelecidos na Fundação Biblioteca Nacional.
O
processo de construção do PNLL, marcado pela mobilização e participação social,
e a criação da DLLLB são marcos institucionais significativos, que explicitam
as diferenças entre os avanços do período de 2003-2015 e os retrocessos de
2016-2022. Em contrapartida, a guerra cultural impetrada de forma mais incisiva
no governo Bolsonaro teve efeitos nocivos no Ministério de Cultura.
Além
de causar desorganização administrativa inédita, promoveu o encolhimento
institucional e escolheu a classe artística como inimiga, tendo a Lei Rouanet
como “o paradigma da mamata”. A outra fatia da derrocada, não menos importante,
foram os cortes orçamentários, peça fundamental da cartilha neoliberal, que
foram ensaiados no governo Temer e aprofundados no período de Jair Bolsonaro.
Não por acaso, foi neste período, que a DLLLB foi sucateada e o processo de
construção do PNLL foi totalmente paralisado, apenas resistindo em alguns
estados e municípios.
Nós
perdemos e não foi pouco, há muito a fazer. Nesse sentido, a linha do tempo das
políticas pública do livro e leitura de 2003 a 2022 confirma a tríade de Rubim:
instabilidade, ausência e autoritarismo. A oportunidade em 2023 é de fechar o
ciclo de vinte anos sob o desafio de recuperar o tempo perdido e avançar no que
for possível, pois os tempos são outros. Como fazer?
Adeus
às armas
Não
é exagero dizer que a eleição de 2022, que contrapôs dois projetos antagônicos
de país, trouxe um importante debate que nos leva a algumas indagações: a
partir de 2023 voltaremos nossas ações para a Constituição de 1988 e
aprofundaremos seus avanços ou a rasgaremos de vez, aprofundando os retrocessos
de 2016-2022? Quem e por que defende os retrocessos e quem e por que defende o
caminho para a reconstrução? Para tal, abriremos espaço para um Estado ativo na
área social ou insistiremos no discurso da austeridade? Abriremos o caminho
para uma democracia popular ou cairemos novamente numa autocracia que usa a
educação e cultura como campo da guerra cultural? São perguntas que temos que
fazer e refazer para que possamos saber quem somos, o que representamos e o que
queremos nesse embate.
Os
primeiros acenos do governo Lula, na versão 2023, foram positivos. Em primeiro
lugar, a recriação do Ministério da Cultura e a nomeação da cantora, militante
e ativista, Margareth Menezes, para comandar a pasta. A criação da Secretaria
de Formação, Livro e Leitura, sob o comando do sociólogo e primeiro diretor da
DLLLB, Fabiano Piúba, e por fim, a nomeação do escritor Jefferson Assumpção
para dirigir a revigorada DLLLB.
Perguntas
feitas, novidades reportadas, nas últimas linhas desse texto vou tentar
levantar algumas questões que podem animar propostas e apontar direções para as
políticas do livro e leitura na nova fase, no terceiro governo Lula.
O
primeiro desafio de todos os segmentos do livro e leitura acredito que será a
regulamentação da Lei 13.696/2018, que estabelece a Política Nacional de
Leitura e Escrita (Lei Castilho). Além de definir as diretrizes e os parâmetros
para as políticas públicas do livro, leitura, literatura e bibliotecas, a Lei
Castilho, inspirada nos textos do PNLL (atualizados e publicados em 2010),
reafirma que o arranjo entre Educação e Cultura e a pactuação entre Estado e
Sociedade compõem a base para a sua efetivação. Outra questão importante é a
construção do novo Plano Nacional do Livro e Leitura, agora decenal, como
indicado na Lei, e a consequente continuidade da construção dos planos
municipais e estaduais do livro e leitura.
O
fortalecimento do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP), através da
revisão do cadastro nacional (que vai nos revelar as bibliotecas públicas que
realmente estão em funcionamento e suas demandas); a criação de uma rede
nacional de bibliotecas de acesso público, que inclua, além das públicas, as
bibliotecas comunitárias (que merecem um programa de fomento específico) e os
demais tipos de bibliotecas abertas à população nos territórios, e por fim, a
criação de um programa nacional de mediadores de leitura e informação que
sirvam todos os tipos de biblioteca e espaços de formação de leitores.
Acrescente-se
a essas medidas outras de igual importância para as bibliotecas brasileiras: o
mapeamento e a avaliação das bibliotecas escolares; o cumprimento da Lei nº
12.244/201 (Lei da Universalização das Bibliotecas Escolares); a criação do
Sistema Nacional de Bibliotecas Escolares (como reivindicado no Projeto de Lei
5656, de 2019); a formulação com participação social do programa nacional de
formação para os profissionais das bibliotecas escolares que envolva os
Estados, os Municípios e as Universidades.
Além
das públicas e escolares, é fundamental obter um programa de fomento às
bibliotecas comunitárias e a integração delas às compras públicas de livros e
afins. Incentivo aos clubes de leitura em todos os territórios, a instituição
de prêmios para a publicação de livros de ficção e não ficção, promoção de
prêmios literários que adotem o conceito de bibliodiversidade como parâmetro.
Para
o setor editorial há vários movimentos importantes que podem ampliar a relação
do Estado com setor produtivo do livro. Alguns exemplos: adoção de políticas de
desenvolvimento da cadeia produtiva do livro de um programa nacional de
incentivo às pequenas e médias livrarias e editoras – com ênfase para as
livrarias de rua e, principalmente as periféricas, sendo ou não segmentadas, a
desburocratização e a incorporação dos critérios de bibliodiversidade e outras
diversidades (regional, racial, de gênero, linguísticas) nas compras públicas
de livro por parte do MINC e do MEC, programas de estimulo às feiras literárias
e fortalecimento da divulgação da/o escritor/a nacional no mercado interno e em
âmbito internacional.
O
estímulo à escrita e à produção literária também deve ocupar um espaço de
destaque na formulação das novas políticas. Desde os programas de incentivo a
novos escritores e escritoras, com ênfase na produção periférica (nas bordas
das cidades em geral, sobretudo fora do eixo Rio-São Paulo), assegurando a
diversidade racial, étnica, de gênero e sexualidade e às pessoas com
deficiência até o estímulo da escrita criativa nos ambientes culturais e
educacionais, considerando a formação de repertório e o contato com as diversas
vertentes da produção literária contemporânea.
Para
finalizar, é necessário atentar para efetivação das políticas públicas do livro
e leitura no território. O primeiro desafio é promover a integração entre as
políticas de fomento, formação e difusão, na elaboração e implementação em
consonância com a participação social nos estados e municípios. Participação
social pressupõe organismos de consulta e deliberação que se constituam nas
cidades como instrumento de interlocução entre o poder público e a sociedade.
Nas cidades que aprovaram os planos do livro e leitura e constituíram seus
conselhos, um passo foi dado, mas é preciso que as formas de participação se
ampliem e existam para além dos conselhos dos planos que têm poderes e margem
de manobra muito limitados. A possibilidade de diálogo entre os diversos segmentos
do livro e leitura é fundamental para que as políticas públicas não se congelem
diante do autoritarismo e/ou da inconstância dos governos de plantão.
Receituário básico: o livreiro que atua politicamente, com bibliotecário que
atua, com o professor que atua, com o mediador de leitura que atua, com editor…
e quem mais chegar.
Não
esqueçamos: a sociedade é o motor das políticas de Estado e a mobilização
social, o combustível.
1 Brito Antônio Carlos de, 1944-1987.
Poesia completa / Cacaso. — 1a ed. — São Paulo: Companhia das Letras, 2020
2 Ver CANDIDO, Antonio. O direito à
literatura. In: Vários Escritos. São Paulo: Ouro Sobre Azul, 2004.
3 Fonte (acessado em 31/01/2023):
https://g1.globo.com/educacao/noticia/2022/07/16/brasil-perdeu-quase-800-bibliotecas-publicas-em-5-anos.ghtml
4Fonte (acessado em 31/02/2023):
https://revistas.pucsp.br/index.php/galaxia/article/view/1469
Ideias se cruzam no debate democrático https://bit.ly/3Ye45TD
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