01 março 2023

Violência de gênero

Os desafios de ser mulher
Em pleno ano de 2023, as mulheres continuam morrendo vítimas das mais diferentes barbaridades, dentre elas, o feminicídio, crime de ódio baseado no gênero.
Luciana Bessa/Vermelho www.vermelho.org.br

 

Exaltei, em textos anteriores, minha dileção pelo mês de janeiro, porque ele nos permite guardar o passado, viver o presente e aspirar o futuro.

Fevereiro traz consigo a festa da carne – carnaval – me presenteando com um feriadão em que posso ficar livre de certas obrigações e atada em mim mesma.

O poetinha, Vinícius de Moraes, chega trazendo “as águas de março fechando o verão (…)” e abrindo os microfones das rádios, ampliando a produção de podcast, de noticiários e programas de TV sobre a mulher.

É que no dia 08 de março comemora-se o Dia Internacional da Mulher. Acelebração é uma só, já as versões para a existência dessa data, oficializada pela Organização das Nações Unidas, na década de 1970, são distintas.

Na primeira versão, no ano de 1857, em Nova York, 129 mulheres, na luta por melhores condições trabalhistas, morreram em um incêndio provocado pelos patrões da fábrica em que elas trabalhavam. Na segunda, em 1911, também em Nova York, na Triangle Shirtwaist Company, outro incêndio vitimou 146 pessoas, das quais 125 eram mulheres e 21 homens.

Mudam-se os tempos, às vezes, apodrecem os sujeitos. O fato é que em pleno ano de 2023, as mulheres continuam morrendo vítimas das mais diferentes barbaridades, dentre elas, o feminicídio, crime de ódio baseado no gênero. Ou seja, ser do sexo feminino significou (e ainda significa) sinônimo de violência, opressão, silenciamento e exclusão nas mais distintas áreas: política, social, econômica e literária.

A maranhense Maria Firmina dos Reis e sua obra Úrsula (1859), por exemplo, foi excluída do cânone literário por ser mulher e negra. A carioca Júlia Lopes de Almeida, autora de A Falência (1901) e uma das idealizadoras da Academia Brasileira de Letras (ABL), foi excluída da instituição também pelo simples fato de ser do sexo feminino. Seu marido, o poeta português, Filinto de Almeida, que também compunha o grupo de idealizadores, tornou-se um de seus fundadores.

Essa mácula não é a única da casa fundada por Machado de Assis, um escritor negro, mas embranquecido pela sociedade. No ano de 1930, Amélia Freitas Beviláqua, esposa de Clóvis Beviláqua, também teve sua inscrição negada na ABL, quando resolveu concorrer a vaga que pertencia a Alfredo Pujol. A negativa de Amélia e Júlia foram a mesma: o estatuto da agremiação só permitia que “brasileiros” pertencessem ao seu quadro. Some-se a tais nomes o de Dinah Silveira de Queiroz. Mas, diferentemente das outras duas, Dinah, conseguiu ser a segunda mulher a ingressar na instituição, no ano de 1981, em sucessão a Pontes Miranda. A primeira foi sua prima, a cearense, Rachel de Queiroz, em
1977.

Em 2018, outra mulher – Conceição Evaristo – foi excluída da ABL pela ousadia de acreditar que o fato de não integrar “o clube de amigos” e dispensar a bajulação habitual aos já imortais descrita por Jorge Amado na obra Farda, Fardão e Camisola de Dormir (1987), a faria ser escolhida pelos seus dotes literários.

É preciso lembrar aos que se esqueceram, ensinar aos que não sabem, que o dia 8 de março, não é um momento para se “ganhar parabéns por ser mulher”, mas uma data de visibilidade no calendário dos movimentos feministas e progressistas. É uma data de resistência contra a exclusão, opressão e a violência. É um “não” ao machismo, aos salários desiguais, ao assédio. É um grito por direitos ainda não conquistados. É um basta aos estereótipos construídos em torno de cada uma de nós.

Para dar mais visibilidade às mulheres, mais meses de março. Mais políticas públicas. Mais espaços nas instituições públicas e privadas. Mais empatia. Mais sororidade.

[Ilustração: Pecado Original (2012) de Tereza Costa Rêgo]

Arte é vida: uma obra de Egon Schiel bit.ly/3SCsEaw

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