Um fantasma ronda o Brasil – o fantasma do analfabetismo político
Enio Lins www.eniolins.com.br
Causou certa estupefacção pesquisa indicando que 44% das
almas brasileiras se assombra com o comunismo e teme sua implantação no País.
Aquele mesmo, o citado na primeira linha do Manifesto: “Um fantasma ronda a
Europa – o fantasma do comunismo”.
Comunismo é vocábulo referente à condição
igualitária entre seres humanos, usado como sinônimo de partilha equilibrada
dos bens materiais. A confusão entre os entendimentos distintos desse conceito
é antiguíssima e se aprofundou a partir do século XIX.
Do passado mais remoto, por exemplo, muita gente
vê esse espírito rubro nas palavras bíblicas do profeta Amós, em ditos como
“Escutai esta palavra, vacas de Basã, do planalto de Samaria, vós que explorais
os fracos e esmagais os indigentes”.
Não poucas pessoas, ao longo de mais de dois
milênios, creem em um Jesus comuna, multiplicando pães e peixes para divisão
entre o povo, e liberando – do que era água – jarras de vinho para deleite da
gente sedenta.
Num pulo de séculos e séculos, evitando aqui
extenuantes relatos e excluindo avaliações sobre comunismo primitivo,
escravismo, feudalismo, vamos relembrar alguns desses ectoplasmas manifestados
a partir do surgimento do tal capitalismo.
Apenas como lembrança dos intrincados debates dos
tempos medievais, sugere-se observar o belo debate – criado por Umberto Eco em
“O Nome da Rosa”, a partir de discursos reais – entre Dominicanos e
Franciscanos, sobre a posse das riquezas.
Retomemos a partir do Século XIX: De forma
pacífica, foram tentadas experiências de comunidades igualitárias – por
exemplo, nos Estados Unidos, em Nova Harmonia, 1825, e na Fazenda Brook, 1840.
Ambas engolidas pelo capital americano.
Nova Harmonia foi iniciativa do socialista Robert
Owen, no Estado de Indiana; e a Fazenda Brooks, ideia do casal missionário
George e Sophia Ripley, localizada perto de Boston, Massachusetts. Ficaram como
exemplos ingênuos.
Em 1848, face às dúvidas sobre a “transformação do
mundo”, Marx e Engels escreveram o Manifesto Comunista, uma cartilha inovadora
explicando o bê-a-bá, na visão de ambos, o que seria essa sociedade – futura –
sem classes.
Em 1871, eclode a Comuna de Paris, insurreição da
população menos favorecida, colocando a capital francesa de pernas para o ar.
Considerada a primeira tentativa de transformação radical anticapitalista, foi
derrotada num banho de sangue.
Ao sul do Novo Mundo, essa fantasmagoria havia
baixado antes, dizem, nas Missões Guaranis, no século XVIII, em aldeamentos
coordenados pelos jesuítas em áreas disputadas por espanhóis e portugueses –
que se uniram para massacrar essa experiência em 1753.
Assombração que também paira sobre a memória do
Arraial de Canudos, na Bahia, onde a suposta partilha igualitária de bens entre
os seguidores de Antônio Conselheiro estimula ilações sobre um “comunismo entre
pobres”, nos idos de 1896.
Mas, com a revolução russa de outubro/novembro de
1917, esse tão temido espectro vermelho, enfim, desceu à terra com gosto gás, e
– como uma das respostas – a propaganda anticomunista vadiou desde então de
forma avassaladora.
As estórias fantasmagóricas sobre a União
Soviética, China e Cuba se espalharam mundo afora ocultando as respectivas
histórias de cada uma dessas experiências, sem falar de exemplos como o Vietnã.
Já a Coréia do Norte é vista como alma penada.
Historicamente, a implantação de modelo intitulado
Comunista é produto de enfrentamento contra regimes de tipo autoritário, mais
das vezes em meio à guerras entre nações. Não existe ocorrência desse tipo de
mudança sob sistemas democráticos.
Defender ou atacar o comunismo como tese e/ou
ideal são atitudes contemporâneas, desde sempre, mas acreditar (temendo ou
amando) em sua implantação, no Brasil, no período histórico em curso, é
analfabetismo político puro e simples.
Eita, por falar nisso, e sem querer assustar:
neste 25 de março o Partido Comunista do Brasil completou 101 anos de vida...
Viva!
Ora, direis: ouvir estrelas? https://bit.ly/3Ye45TD
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