03 agosto 2024

Roberto Trevas: História

ALMIRANTE ZHENG HE: O DESBRAVADOR  DOS OCEANOS NA DINASTIA MING (1368 a 1644)
Roberto y Plá Trevas*   

O presente trabalho tem  por finalidade narrar sobre um personagem épico da China do século XV, o Almirante Zheng He,  desbravador dos mares e dos oceanos,  que a serviço da Dinastia Ming liderou  diversas expedições marítimas que revolucionou o alcance nos mares e as técnicas marítimas de expedição dos chineses a locais e mares nunca antes navegados.

Dinastia Ming – a dinastia Ming foi a dinastia que governou a China de 1368 a 1644 após  a queda  da dinastia Mongol e dos Iuâ, ela foi a última  dinastia comandada pelos Hans. Pode-se salientar que o Estado dirigido pelos Ming,  constituiu e formou uma extensa marinha e um exército permanente de   cerca de um milhão de soldados. Nesse período existiu um comércio marítimo privado além de missões tributárias oficiais nas dinastias anteriores, a frota tributária do Almirante Zeng He,  no século XV superou todas as outras missões em tamanho absoluto.

É bom salientar que durante essa dinastia houve uma grande quantidade de projetos de construções, tais como a restauração do Grande Canal e da Muralha da China.  A população estimada da dinastia  MING variam de 100 a 150 milhões de pessoas,  e o Imperador Hongwu (1368-1398) tentou criar uma sociedade de comunidades rurais auto-suficientes,  resultando uma rede agrícola chinesa,  e também nesse período foi criado um sistema militarizado de rede de correio,  onde o resultado do efeito da superprodução agrícola permitia que o excedente dessa produção fosse comercializado nas rotas onde esse  correio percorresse.    

O terceiro Imperador da Dinastia MING, YONGLE cujo reinado foi de 1402 a 1424, é reconhecido como o maior imperador da Dinastia MING, é um dos mais admirados da história chinesa,  e sobre o seu reinado foi aonde ocorreram as principais expedições e viagens do Almirante Zheg He. O Imperador yongle mudou a capital de Nanquim  para Pequim,  onde foi construída a cidade proibida e foi complementada a monumental Enciclopédia Yongle, e é importante e fundamental frisar que o Imperador Yongle permitiu e autorizou as diversas viagens exploratórias do Almirante Zheng He  durante todo o seu reinado, e consequentemente toda a expansão marítima  chinesa baseou-se nessa “exploração marítima”, onde o Almirante Zheng He negociou em  diversos portos em  toda a Ásia,  com os diversos go vernantes favoráveis aos interesses comerciais da china.

Sem  dúvida alguma a importância do Imperador Yongle da dinastia Ming foi excepcional devido a sua visão geopolítica da época e seu instrumento de negociação foi sem  dúvida o Almirante Zheng He. O Imperador yongle morreu em Changling e foi construído “O grande Mausoléu” onde estão as suas cinzas,  e sem dúvida alguma este é o maior e mais importante mausoléu da Dinastia  MING.

O ALMIRANTE ZHENG HE

MA HE, era o nome original do futuro Almirante ZHENG HE,  nasceu em 1371 e faleceu em 1433,  foi um explorador chinês do século XV e que realizou inúmeras viagens no mar do sudoeste asiático e no Oceano Índico,  tendo inclusive chegado à Índia, ao Mar Vermelho e Moçambique.

MA HE pertencia a etnia HUI,  era o segundo filho de uma família de origem muçulmana, nasceu em  kunyang,  atual Jimming,  ao sul de Kunming, próximo do Lago Tiau em  Yunnan.  No ano de 1381,  ano em que seu pai morreu,  um exército Ming foi enviado para Yunnan para lutar contra  o Mongol Basalawarmi, Ma He então com onze anos de idade foi aprisionado e em  seguida “castrado”, tornando-se um “eunuco”. Após esse incidente ele foi enviado para a Corte Imperial  e acabou se tornando um conselheiro de extrema confiança do 3º Imperador da Dinastia Ming,  o famoso Imperador yongle, que reinou de 1403 a 1424,  que inclusive ele ajudou o Imperador Yongle a depor o Imperador Jianwen,  seu antecessor e como  premiação desse apoio o “eunuco” Ma He recebeu do Imperador Yongle o nome de Zheng He pelo qual  ele ficou conhecido como o grande desbravador dos mares e  oceanos,  o inesquecível Almirante Zheng He. Suas missões demonstraram a sua grande capacidade organizativa e poder tecnológico, que  sempre contou com o seu protetor o Imperador Yongle que o apoiou e o estimulou a fazer 6 das 7 viagens exploratórias que o famoso Almirante Zheng He  liderou de 1405 a 1433,  essas viagens,  e portanto nesses 28 anos levou a cultura ao sudeste asiático, parte da África e inclusive existe teorias que o Almirante Zheng He chegou nas Américas,  antecedendo cerca de 70 anos o feito do descobrimento de Cristovão Colombo e Pedro Álvares Cabral.

Segue no Quadro abaixo,  as principais viagens do Almirante Zheng He.

Viagens

ViagemAnosRegiões e países visitantes
1ª viagem1405-1407Champa, Java,  Palembang, Malaca, Aru, Samudera, Lambri, Ceilão, Kollam, Cochin, Calecute
2ª viagem1407-1409Champa, Java, Siam, kochi, Ceilão
3ª viagem1409-1411Champa, Java, Malaca, Sumatra, Ceilão, Quilon, Kochi, Calecute, Sião, Lambri, Kayal, Coimbatore, Puttanpur
4ª viagem1413-1415Champa,  Java, Palembang, Malacca, Sumatra, Ceilão, Cochin, Calicut, Kayal, Pahang,  Kelantan, Aru, Lambri, Ormuz, Maldivas, Mogadíscio, Barawa, Melinde, Aden, Mascate, Dhofar
5ª viagem1416-1419Champa, Pahang, Java, Malaca,  Samudera, Lambri, Ceilão, Sharwayn, Kochi, Calecute, Ormuz, Maldivas, Mogadíscio, Barawa, Malindi, Aden
6ª  viagem1421-1422Ormuz, Este de África, outros países da Arábia
7ª viagem1430-1433Champa,  Java,  Palembang, Malaca, Sumatra, Ceilão, Calecute, Fungte... (18 países no total).


É importante salientar que antes de a Europa entrar em sua era exploratória, a China através das viagens do Almirante Zheng He, lançou uma série (7) de impressionantes viagens marítimas que buscaram  estabelecer a influência chinesa, expandir o comércio além de coletar tributos. Os navios do Almirante Zheng He,  eram chamados de “navio do tesouro”, estavam  entre os maiores da época, tendo em  torno de 137 metros de comprimento,  bem  superiores aos navios europeus da época.

Nessas sete viagens, o Almirante Zheng He e sua frota navegaram  pelo sudeste asiático, oceano índico, chegando  próximo ao Quênia, visitando nesses périplos portos importantes como Calicut, Malaca, Galle,  dentre outros.

É importante salientar que além de expandir o comércio as expedições tinham objetivos diplomáticos e simbólicos, além de buscar coletar tributos de reinos distantes e reafirmar a posição do Império do Meio como a principal potência da Ásia.

No livro “1421: O ano em que a China descobriu o mundo”, o autor inglês Gavin Menzies sugere e defende que uma frota de 1000 navios explorou todo a terra,  descobrindo a África Ocidental, a América (incluindo o Brasil),  a Groelândia, a Islandia, a Antardida e a Austrália, tese essa que tem sido descartada por alguns historiadores, pois a cartografia e os textos chineses referem unicamente as expedições pelo Índico,  inclusive no tocante a dimensão dos navios citada em textos mais recentes, é considerada exagerada em  função das limitações da tecnologia naval da época com a utilização de “juncos”  como o principal insumo para a fabricação dos “navios do tesouro”.
Vale ressaltar que apesar do sucesso, as expedições foram interrompidas após 1433,  pois o seu grande incentivador o Imperador Yongle faleceu em 1424,  e o seu sucessor alegando as enorme despesas das viagens,  conflitos na fronteira no norte da China aliado a uma crescente  influência das fações conservadoras na corte do novo Imperador viam as expedições como desvios de valores confucianos tradicionais. Concluindo, podemos afirmar que as viagens do Almirante Zheng He deixaram para o continente asiático  uma marca duradoura,  demonstraram  a habilidade e sofisticação marítima da China no século XV,  além de uma interação comercial e cultural  que influenciou diversos países da África Oriental e do Sudeste asiático.

Apesar da importância desses acontecimentos infelizmente a história não proporciona a real importância desse personagem ímpar o famoso e lendário Almirante Zheng He,  pois em  uma época em que a Europa estava apenas começando a olhar além dos seus horizontes,  o Império do Meio já estava realizando viagens marítimas de longa distância que conectavam  regiões,  continentes e culturas.
  
REFERÊNCIAS

COUTO, Sergio. A extraordinária história da China. Universo dos Livros, 2008.
DREYER, Edward. Zheng He: China and the ocean in the Early Ming, 1405-1433. Longuan, 2006.
MANZIES,  Gavin. O ano em que a China descobriu o mundo. Bertrand Brasil, 2017.
MING, Yang. Seven Epic Voyages of Zheng He in Ming China (1405-1433).
REVISTA TIME ESPECIAL. Sobre características de Zheng He (agosto 2001). Disponível em: http://www.time.com/time/asia/features/journey2001/).
WOOD,  Michael. História da China, crítica. 2015.


*Ex-Coordenador de Relações Internacionais da Prefeitura do Recife

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