Para o 2025 que começa
Trabalhar com literatura, para mim, é trabalho leve ou docemente pesado, mas fonte de prazer ou diversão, quando consigo ser menos medíocre.
Urariano Mota/Vermelho
Neste começo de ano, com blefatite nos olhos, leitura difícil de textos, porque perderam o brilho para mim na tela do computador ou no papel, e uma gripe que me faz ir ao banheiro constantemente para assoar o nariz, sei que não devo confundir o circunstancial com a essência. Esses males físicos são destes dias. Incomodam agora, mas não fazem um programa para o ano que começa.
Então, à maneira de Noel Rosa, digo também que “a filosofia hoje me auxilia a viver indiferente assim”. Isso quer dizer que não posso, por um lado, ver doenças como um estado permanente (“Podem até piorar”, diz-nos uma voz do diabo). Por outro lado, não posso alimentar grandes sonhos, esperar deste 2025 de realizações que não pude concluir até hoje. É neste passo que se cruzam Noel Rosa e Georg Wilhelm Friedrich Hegel:
“Devemos estar persuadidos que o verdadeiro tem a natureza de eclodir quando chega o seu tempo, e só quando esse tempo chega se manifesta; por isso nunca se revela cedo demais nem encontra um público despreparado. Também devemos convencer-nos de que o indivíduo precisa desse resultado para se confirmar no que para ele é ainda sua causa solitária, e para que não posso, por um lado, como algo universal a convicção que, de início, só pertence à particularidade”. (Hegel, no prefácio à “Fenomenologia do Espírito”)
Noto que Hegel se refere ao sucesso de uma nova ideia, obra literária, filosófica ou científica. Ele não se refere ao momento da sua formulação, da descoberta. Essa manifestação isolada, precoce, tantas vezes tem matado de amargura cientistas, filósofos e escritores. Às vezes mortos até debaixo de fogo, em fogueiras, como Giordano Bruno.
Então me conformo e consolo com um pensamento do gênio Confúcio: “Trabalhe com o que você ama e nunca mais precisará trabalhar na vida”. Trabalhar com literatura, para mim, é trabalho leve ou docemente pesado, mas fonte de prazer ou diversão, quando consigo ser menos medíocre.
Para este 2025, vou buscar os versos luminosos de João Cabral de Melo Neto, ao fim de Morte e Vida Severina:
— E belo porque com o novo
todo o velho contagia.
— Belo porque corrompe
com sangue novo a anemia.
— Infecciona a miséria
com vida nova e sadia.
— Com oásis, o deserto,
com ventos, a calmaria.
Para terminar o início deste ano, nos salva o que ditou o nosso amigo José Amaro Correia, quando estava cego, sem uma perna, em uma cadeira de rodas:
NOSSA TERRA TEM COMETA
No dia em que a sonda robô pousou no cometa, depois de 10 anos, 8 meses e 11 dias de viagem, abriu-se um nova mensagem da ciência. Foi uma das maiores realizações na pesquisa espacial. Eram quatro horas da manhã, e até as cinco, durante uma hora, ouvíamos o mesmo som que os cientistas ouviram vindo do cometa.
Depois de alguns dias estudando os sons, entendemos o cometa que passava pelo alto das praias de Paulista (a cidade do grande Recife, onde Mário Sapo escuta o rádio, sua única fonte de informação nos últimos tempos). A mensagem, que também ouvi de madrugada, era
O cometa estava desejando um bom natal e um novo ano de solidariedade e amizade.
A memória destes bravos nos fortalece.
Leia o poema 'Boas festas" https://lucianosiqueira.blogspot.com/2024/12/palavra-de-poeta-adalberto-monteiro_31.html
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