Trump
mira drones da China e escancara fragilidade dos EUA
Decretos
contra a chinesa DJI expõem dilema entre soberania tecnológica e desmonte da
capacidade produtiva nacional
Igor Patrick/Folha de S. Paulo
Três decretos assinados por Donald Trump nesta sexta-feira (6) deixam claro que os drones, antes vistos como ferramentas de lazer ou inovação civil, assumiram um papel estratégico na política externa dos Estados Unidos.
Com medidas
que restringem o uso de equipamentos fabricados por empresas chinesas,
endurecem os critérios de segurança e investem na criação de uma cadeia
doméstica de suprimentos, a Casa Branca sinaliza que a
supremacia em setores de uso dual passou a ser tratada como prioridade.
O ataque
perpetrado pela Ucrânia com drones comerciais
modificados para
atingir bases russas, um divisor de águas, serviu de constatação para os
perigos do uso dessas aeronaves não tripuladas em zonas de
conflito. A natureza acessível, versátil e escalável da tecnologia coloca
em xeque a distinção entre aplicações civis e militares. Equipamentos
baratos adquiridos pela internet tornaram-se armas capazes de atingir alvos
estratégicos a centenas de quilômetros de distância.
É nesse
contexto que se insere a ofensiva contra a DJI, maior fabricante mundial de
drones. Sediada em Shenzhen, na China, a empresa é onipresente em setores
que vão da agricultura à segurança pública. Essa penetração, aliada à
legislação chinesa que obriga empresas privadas a cooperarem com o aparato
estatal, alimenta a percepção em Washington de que os drones chineses
representam um risco à integridade de infraestruturas críticas, operações
sensíveis e dados estratégicos.
Os
decretos assinados por Trump reforçam esse diagnóstico. Um deles proíbe
sobrevoos de drones estrangeiros em áreas consideradas sensíveis; outro cria
incentivos para o desenvolvimento de uma indústria nacional de drones em moldes
semelhantes ao que foi feito com semicondutores; e um terceiro estabelece um
marco regulatório para exportação de tecnologia americana a aliados.
Alvo do
republicano desde pelo menos 2017, a DJI vinha até aqui adotando uma postura de
confronto moderado. A empresa alega que suas operações são tecnicamente
seguras, oferece auditorias independentes como prova de confiabilidade e
interrompeu a sincronização de dados nos EUA. Além disso, tenta judicializar
sua exclusão de licitações, apontando
motivações políticas e protecionismo.
Essa
disputa, no entanto, transcende o caso específico da empresa chinesa. O que
está em jogo é a estrutura futura das cadeias de suprimento globalizadas. À
medida que drones,
chips, sensores e baterias passam a ser vistos como ativos estratégicos, a
tendência é que blocos econômicos rivais busquem autonomia em vez de
interdependência. O resultado provável será um ecossistema tecnológico mais
fragmentado, menos eficiente e mais suscetível a tensões políticas.
Tal
constatação também escancara o quão mal posicionados os americanos estão para a
disputa. Mesmo com sanções, a DJI responde sozinha por quase 70% do mercado
mundial e não há alternativa ocidental à altura.
Uma indústria assim não surge do vento, e será necessário investir significativamente em tecnologia doméstica. A pergunta é: a Casa Branca está disposta a pagar o preço, no momento em que prefere esticar o déficit nas contas para cortar impostos de bilionários em vez de turbinar a indústria local? Quem souber a resposta, por favor, me conte.
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