A
aliança do príncipe
Luciano Siqueira
instagram.com/lucianosiqueira65
Certa vez, condenado a repouso forçado por .haver fraturado o pé, um amigo a quem fui visitar em sua residência me recebeu com o controle remoto à mão e o olhar enfadado diante da TV: - Meu amigo, a Humanidade não tem mais jeito, nós é que somos teimosos e queremos mudar o mundo. Passo o dia aqui de canal em canal e só tem notícia ruim: calamidades naturais, corrupção, morte...
De fato. O mesmo a gente vê nesses monitores
que botam em elevador de edifício comercial. Eu mesmo me divirto (se é que se pode
chamar a isso diversão) contando as noticias negativas nos poucos minutos entre
a portaria e o andar aonde vou.
O danado é que se poderia pelo menos
equilibrar o noticiário, informando também das coisas boas da vida, exemplos
edificantes de dedicação ao bem comum, conquistas notáveis da ciência e da sociedade
humana. Mas parece que quem edita os noticiários é orientado para mostrar o
lado ruim de nossa existência, como que nos obrigando a experimentar ainda em
vida o purgatório como antessala do inferno. Virgem Maria!
Mas tem outro lado – este, infelizmente,
também nada acrescenta: o das frivolidades envolvendo famosos ou candidatos a
tal. Agora mesmo ao navegar em busca das últimas notícias deparo-me com a
manchete que dá conta de que o príncipe William decidiu não usar aliança após o
casamento com a plebeia Kate Middleton.
Perplexo, sinto-me o mais ignorante dos
internautas por desconhecer o impacto dessa decisão íntima do herdeiro da Coroa
Britânica para o presente e o futuro da Humanidade – que deve ser enorme, a
julgar pelo destaque dado à notícia.
Tem mais. A noiva irá usar um anel de ouro
dado pela Rainha Elizabeth 2ª. Portanto, além do coração do príncipe encantado,
a senhorita Kate, vê-se, conquistou as boas graças da Rainha.
Supõem os repórteres que “durante a cerimônia
de casamento, William irá colocar a aliança no dedo da noiva, mas ela não fará
o mesmo com ele”.Claro, se ele dispensa a aliança - conclusão genial, não é
mesmo?
Finda a
leitura, experimentei um quê de ciúmes do príncipe e de sua amada. É que colei
grau em Medicina pela Universidade Federal de Pernambuco com um anel emprestado
pelo colega e amigo Beilton, simplesmente porque não tinha grana para adquirir
um – e ninguém ficou sabendo, sequer na rádio comunitária de Água Fria, meu
bairro à época, saiu a notícia! A cerimônia se deu no Ginásio de Esportes da
Imbiribeira, minha mãe colocou o anel no meu dedo, o fotógrafo registrou o
flagrante e, vapt vupt, guardei o dito cujo no bolso do paletó (também
emprestado), com receio de perder a preciosa joia.
Inspirado no
sábio Epaminondas, que sempre aconselhou não se guardar ciúmes de nada, muito
menos de príncipe britânico, recompus-me incontinenti: afinal entre a recusa do
príncipe à aliança matrimonial e a minha impossibilidade de obter o anel de
formatura há uma distância transatlântica, que separa a família real britânica
de um simples plebeu brasileiro.
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Graciliano Ramos e o texto no tempo das redes https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/06/expoente-da-literatura-brasileira.html
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