Dia da Consciência Negra é só um dia?
Enio Lins*
Há dois dias, foi solenizado o Dia Nacional da Consciência Negra, cuja referência é a data de morte de Zumbi dos Palmares. Como em todos os anos, desde 1980, as caravanas sobem a Serra da Barriga em tributo ao maior dos quilombos guerreiros.
Tem ano com mais gente, tem ano com menos, mas sempre milhares de pessoas de todas as cores comparecem ao Memorial do Quilombo, construído pelo IPHAN no cocuruto do Outeiro do Barriga, município alagoano de União dos Palmares.
Em 6 de fevereiro de 1694, quando as paliçadas de defesa foram rompidas pelas tropas de Domingos Jorge Velho, foram arrasados todos os vestígios da capital do grande Quilombo dos Palmares. O objetivo era claro: apagar aquela história.
No começo do Século XX, historiadores preocupados com as raízes da brasilidade, como Jayme de Altavilla e Romeu de Avelar, assinalaram resquícios (hoje desaparecidos) do que fora uma muralha de pedra no alto da Serra da Barriga.
Gente obstinada como Maria Mariá, luminar da cultura palmarina, coletou pedras talhadas e cachimbos de cerâmica e outras pequenas peças esquecidas pelos séculos entre os matos onde se ergueu a Cerca Real do Macaco.
Pesquisadores como Scott Allen, pela Universidade Federal de Alagoas, reviraram cuidadosamente trechos de solo na Serra da Barriga, e encontraram heranças indígenas, igaçabas pertences dos povos originários.
São muitas histórias, muita coisa a aprender entre as serras da Barriga e Dois Irmãos – esta mais esquecida que aquela, mas lá – em terras hoje viçosenses – foi que Zumbi resistiu até a morte em 20 de novembro de 1695.
Tantas histórias, e tão poucas memórias sobreviventes dos extraordinários quase 100 anos de existência do Quilombo dos Palmares, precisam de mais valorização e da quebra do vício de só “subir a serra” em 20 de novembro.
Para a Educação, Cultura, Turismo, História, Antropologia, Economia (tudo com maiúscula) é fundamental se planejar e executar – metodicamente – um calendário de promoção e visitas permanentes às serras da Barriga e Dois Irmãos.
Todo dia precisa ser dia de “subir a serra”, ou “subir as serras”. Isto é uma atitude cidadã, cultural, educativa, turística, historiadora, antropológica, econômica. É geração de emprego e renda, e um movimento perene de autoconhecimento.
E, o principal do ponto de vista da formação da consciência cidadã - em Alagoas e no Brasil - é que as questões relativas à história da escravidão e à discriminação racial e de cor precisam ser lembradas diariamente. E essa "subida permanente" à Serra da Barriga é, antes de tudo, uma exigência do esforço de autoconhecimento da população alagoana e brasileira.
*Arquiteto, jornalista, cartunista e ilustrador
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