08 março 2023

Uma mulher revolucionária

Louise Michel, uma mulher revolucionária

Pouco conhecida no Brasil, a militante francesa foi pioneira da educação de mulheres e uma liderança da Comuna de Paris. Sobinfluencia publicou seus incendiários escritos, antes inéditos em português. Sortearemos 1 exemplar
Guilherme Arruda/Blog da redação-OutrasPalavras

 

A Comuna de Paris não só inaugurou a etapa histórica do “assalto aos céus” dos trabalhadores em sua luta pelo poder político na sociedade, como também foi um momento de grande participação das mulheres na mobilização revolucionária. Uma das figuras de proa dessa agitação feminina foi Louise Michel, cuja história ainda não é muito conhecida no Brasil. Isso deve mudar com a edição em português pela Sobinfluencia de um dos principais panfletos que a militante francesa escreveu em vida.

Tomada de posse, publicado por Louise Michel no ano de 1890, é uma convocatória à superação da farsesca Terceira República francesa, erguida sobre os corpos de milhares de trabalhadores mortos pelo Exército na repressão à Comuna. O chamado da autora, feito pouco depois do centenário da grande revolução de 1789 na França, mistura uma denúncia das condições de vida da época com visões da liberdade no mundo que virá. Esta é a primeira vez que este texto é publicado na íntegra e em sua originalidade no Brasil.

Michel, filha de uma criada do Château de Vroncourt, dedicou mais de 40 anos de sua vida à revolução, e ainda mais tempo à emancipação dos oprimidos. Antes de se integrar aos círculos radicais de Paris, a autora já trabalhava como professora nas escolas dos vilarejos, ensinando princípios laicos e republicanos em oposição ao que ditava o Império de Napoleão III. Já na capital, na década de 1860, se aproximou do escritor Victor Hugo e ajudou a fundar a Société pour la Revendication des Droits Civils de la Femme, voltada à educação de mulheres, uma causa vista com maus olhos pela monarquia conservadora.

Nesse momento, primeiro associada ao grupo dos blanquistas – partidários de Louis Auguste Blanqui e sua defesa de uma insurreição contra o sistema – e depois aos anarquistas, Louise Michel mergulhou na correnteza revolucionária. Com a deflagração da Guerra Franco-Prussiana, se opôs ao militarismo e às prisões de ativistas. Em poucos meses, os trabalhadores parisienses se levantaram contra os patrões e generais, sejam franceses ou alemães, e teve início o período mais marcante da vida de Michel: sua destacada atuação na Comuna de Paris.

Na revolta, a professora de 40 anos assumiu a presidência do Comitê de Vigilância de Montmartre (que na Belle Époque se tornaria um bairro artístico de Paris) e se engajou em um Batalhão da Guarda Nacional, força armada dos operários insurretos. Com a derrota do levante, Louise Michel foi levada à prisão, mas nunca mais largou a militância e entregou mais 35 anos de existência na Terra à luta pela derrubada do capitalismo.

Mais detalhes (e instigantes reflexões) sobre a vida e as ideias da militante podem ser encontrados no prefácio do livro, “Louise Michel, uma vida oceânica”. O texto é assinado por Gabriela de Laurentiis, que também lançou pela Sobinfluencia a obra Louise Bourgeois e modos feministas de criar.

Em Tomada de Posse, a encontramos mais velha e experimentada, uma prestigiada liderança da população francesa. Originalmente escrita para um discurso e depois publicada no jornal Le Libertaire, a intervenção da ativista tem duas características muito marcantes. Primeiro, a veemência de sua rejeição da sina dos operários no regime burguês. E, depois, a beleza de sua descrição do mundo que está por vir e da alegria que é lutar por ele. 

O título remete a essa luta: tomada de posse era, nas leis criminais francesas da época, o tipo penal do roubo de algo que legalmente não lhe pertence – tornada analogia, aqui, do assalto ao poder pelas classes trabalhadoras, deixando para trás a legalidade burguesa.

É curioso também perceber que, em uma das últimas páginas, Louise Michel menciona nosso país para falar de sua esperança em uma insurreição internacional dos de baixo. Referindo-se ao potencial revolucionário dos países da América, a francesa deposita sua confiança na Proclamação da República no Brasil, sucedida em 15 de novembro de 1889, para o início de uma onda revolucionária: “[O] sinal soa como uma reverência e, cedo ou tarde, seguindo o ritmo que as move, cada nação responde ao apelo pela liberdade. Os Estados Unidos do Brasil nos transportam a 1848, a 1789 […]”.

Além da íntegra do texto de Tomada de posse publicado originalmente em 1890, o leitor encontrará neste volume diversas fotografias e ilustrações da época ligadas a Louise Michel e à Comuna de Paris. Encontrará também a tradução feita por Fabiana Gibim da transcrição do julgamento de Louise Michel pela Justiça francesa durante a repressão aos communards.

Nesse tribunal, a militante foi condenada à deportação para uma colônia penal na Oceania, assim como milhares de outros membros da Comuna. Em seus oito anos de exílio na Nova Caledônia, Michel se ligou profundamente aos Kanak, povo nativo do arquipélago. Se tornou assim uma pioneira da conexão da luta contra o capitalismo com a defesa da emancipação dos povos colonizados.

De larga trajetória em prol da construção de uma vida nova para os explorados e oprimidos, Louise Michel merece ter sua biografia mais conhecida pelos ativistas contemporâneos. Ela é nossa primeira homenageada de uma semana de ações especiais do Outros Quinhentos em observância ao 8 de março, Dia Internacional de Luta da Mulher Trabalhadora.

No cotidiano, um convite à essência da vida https://bit.ly/3Ye45TD

 

 

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