Cidades fragmentadas, medo generalizado
Medo, fragmentação urbana e insegurança moldam a vida nas cidades, mas a esperança coletiva ainda pode resgatar o direito à cidade e à convivência solidária.
George Câmara/Vermelho
Nas cidades e regiões metropolitanas um fenômeno vem se tornando muito comum, atualmente: estão cada vez mais perto das pessoas o medo e a noção de convivência com o risco, em relação à segurança pública. Isso se expressa nos mais variados espaços: das conversas do dia-a-dia aos noticiários veiculados pela grande imprensa.
Em geral as cidades se deparam com um sentimento de insegurança, levando à tomada de medidas defensivas e repressivas, tanto pelas pessoas, no seu espaço individual ou familiar, quanto pela gestão pública. Alguns falam sobre “áreas de risco”, termo frequentemente usado em nosso país para tratar de locais vistos como violentos nas grandes cidades.
Ao usar esse termo muitas vezes se comete uma generalização, quando situam tais áreas nos bairros habitados por moradores mais pobres, o que revela um certo preconceito. Hoje em dia nas maiores cidades (não só no Brasil), são poucos os locais onde as pessoas se sentem seguras. Vale lembrar que qualquer um pode ser atingido por uma bala perdida, seja no beco de uma favela ou dentro de um apartamento de classe média.
Os shopping centers, como também os condomínios fechados, já não conseguem ser completamente seguros, apesar de seus aparatos de segurança (câmeras de vídeo, vigias, etc.). Até os apartamentos da classe média passam a ser invadidos com frequência. É nas cidades fragmentadas que o medo generalizado passa a prosperar.
O Professor Marcelo Lopes de Souza*, ao examinar as metrópoles brasileiras, trata da “fragmentação do tecido sociopolítico-espacial”, em que “além dos fechamentos de loteamentos e de condomínios, há também o fechamento das favelas pelos traficantes de droga, assim como o abandono dos espaços públicos” (Souza, 2008).
No livro Fobópole – o medo generalizado e a militarização da questão urbana (2008), ele aborda a temática do medo nas cidades, destacando que da combinação da palavra phobos (medo, em grego), com a palavra polis (cidade), surge o conceito de fobópole (fobia da cidade), que exprime
“Um sentimento atual presente na sociedade brasileira: a imagem de uma cidade onde o medo e a percepção do risco, no que se refere à segurança pública, assumem uma posição cada vez mais proeminente na organização espacial das cidades e na vida das pessoas” (Souza, 2008).
Uma questão urbana relacionada ao conceito de fobópole é que em cidades sociopolítico-espacialmente fragmentadas, o medo influencia, entre outras coisas, na mobilidade urbana e no direito à cidade. Tratando do fenômeno da fragmentação no tecido urbano, Vasconcelos** (2013), destaca:
“A cidade fragmentada corresponde a uma mistura de usos desconectados, mal articulados pelas infraestruturas de transportes. Ela é produzida em parte pela ação (ou inação) do Estado, do mercado imobiliário e pela ação da própria população” (Vasconcelos, 2013).
Mas as cidades, sob uma outra ótica, podem ser espaços de esperança, ao invés do medo. Espaços de solidariedade, ao invés da desconfiança mútua, do “todos contra todos”. Sem dúvida, esse é um desafio a ser encarado coletivamente, e não nos marcos do “cada um por si”.
Cabe à própria sociedade encontrar e construir o caminho da cidade como um lugar de realização das necessidades humanas, de prosperidade e justiça. Afinal, ninguém consegue ser feliz sozinho!__
* SOUZA, Marcelo Lopes. Fobópole – O medo generalizado e a militarização da questão urbana. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2008.
** VASCONCELOS, Pedro de Almeida. Contribuição para o debate sobre processos e formas socioespaciais nas cidades. In: VASCONCELOS, Pedro de Almeida; CORRÊA, Roberto Lobato; PINTAUDI, Silvana Maria (Organizadores). A cidade contemporânea: segregação espacial. São Paulo: Contexto, 2013, p. 17 a 37.
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