Não existe arte sem técnica; e
não é só no futebol
Seleção campeã do mundo em
1970 era organizada e inventiva, prosa e poesia
Tostão/Folha
de S. Paulo
No passado, predominava sobre a técnica, especialmente no Brasil, a
habilidade, a improvisação, a fantasia e os lances com efeitos especiais. Os
jogadores brasileiros, em todo o mundo, eram conhecidos como qqqqa da bola.
O cineasta e poeta italiano Pasolini disse, após os 4 x 1 sobre
a Itália na final da Copa de 70, que a poesia tinha vencido a prosa. Na
verdade, o Brasil era um time organizado e inventivo. Prosa e poesia.
Hoje, cada vez mais, a técnica individual e a coletiva são tão
ou mais importantes que a habilidade e a inventividade. Os grandes craques, de
todas as épocas, unem as duas características em proporções variáveis e de
acordo com as posições em campo.
Atualmente, ocorrem muito mais gols de bolas cruzadas para área
do que no passado. Além de aprimorarem a técnica, há mais cruzamentos.
O Palmeiras é mestre em fazer gols dessa maneira, principalmente
com a dupla Raphael Veiga e Rony. Por outro lado, ocorrem menos gols de faltas
batidas próximas à área. Os goleiros melhoraram a técnica, são mais altos e
mais ágeis. Os goleiros evoluíram também no trato da bola com o pé e na
cobertura das bolas lançadas nas costas dos defensores.
Hoje existe mais pressão para recuperar a bola, em todo o campo. Os
jogadores, quando a perdem, em vez de correrem para trás para fechar os
espaços, como era antes, correm para a frente para pressionar quem está com a
bola, muitas vezes perto da área adversária. Os atletas, principalmente os
meio-campistas, desarmam, tocam a bola e avançam para recebê-la mais à frente.
O jogo ficou mais intenso e emocionante.
No meio de semana, o Bayern de Munique eliminou o PSG pela Liga dos Campeões por ser um time com mais força
física e mental e por ter mais conjunto. Messi e Mbappé foram anulados.
Os treinadores e meio-campistas brasileiros deveriam prestar
atenção no volante Kimmich, pela técnica exuberante. Ele desarma, avança com
passes precisos, rápidos, com um ou dois toques, e uma enorme lucidez nas
escolhas.
As mudanças táticas que ocorrem entre uma partida e outra ou
mesmo durante o jogo são importantes na técnica coletiva.
O Atlético-MG, no empate com o Milionários, da Colômbia, pela
Libertadores, mudou o esquema tático ao jogar com dois volantes (Allan e
Otávio), bons no desarme e no passe, um meia de cada lado e dois atacantes, no
tradicional e interminável 4-4-2, em vez de atuar com um volante, três meias e
dois atacantes. Foi a melhor partida do Atlético com o técnico Coudet. O meia
Edenilson, pela direita, usa melhor sua velocidade para defender e atacar. Não
tem habilidade para ser um meia centralizado e adiantado.
O Fluminense, na vitória sobre o Flamengo por 2 x 1, mostrou sua
excelente técnica coletiva, de muita troca de passes. Assim saiu o belíssimo
gol de Cano. No segundo tempo, Felipe Diniz reforçou ainda mais o meio campo,
para ter mais a bola, ao trocar o atacante pelo lado, Keno, por mais um
meio-campista, Pirani, autor do segundo gol. Enquanto muitos técnicos
fragilizam o meio campo escalando muitos atacantes, Diniz agrupa mais jogadores
no meio para envolver o adversário.
Não existe arte, futebol bem jogado e eficiência, em qualquer atividade,
sem ótima técnica, bem executada. Tenho a impressão de que, na maior parte da
sociedade brasileira, há pouco hábito, pouco entusiasmo para aprender a técnica
e fazer o melhor em pequenos e grandes trabalhos. [Ilustração: Nato Gomes]
A
indiferença nas relações interplanetárias bit.ly/3mfkAAo
Nenhum comentário:
Postar um comentário