10 agosto 2023

Aderbal, a ousadia criativa

A eterna juventude de Aderbal Freire-Filho

Daniel Schenker/O Globo

 

Enumerar os bem-sucedidos espetáculos realizados ao longo de décadas seria pouco para dimensionar a importância de Aderbal Freire-Filho como artista. Mais do que os elogios colhidos pelos diversos trabalhos, Aderbal, que morreu na última quarta-feira, esteve à frente de grupos e liderou iniciativas que marcaram a história do teatro brasileiro.

Nascido em Fortaleza, em 1941, Aderbal migrou para o Rio de Janeiro e fundou, em 1973, o Grêmio Dramático Brasileiro, coletivo que rendeu uma montagem de destaque: “Réveillon”, de Flávio Márcio. Mais adiante, em 1990, passou a conduzir o Centro de Demolição e Construção do Espetáculo, inicialmente sediado no Teatro Glaucio Gill, grupo responsável por encenações desafiadoras — como “A mulher carioca aos 22 anos”, a partir do romance de João de Minas, e “Turandot ou o congresso dos intelectuais”, de Bertolt Brecht.

Duas montagens do Centro de Demolição, com textos a cargo de Aderbal e Carlos Eduardo Novaes, não aconteceram dentro do tradicional edifício teatral. “O tiro que mudou a história”, voltado para os fatos que culminaram no suicídio de Getúlio Vargas, foi apresentado, de forma itinerante, na locação real do Palácio do Catete. E as cenas de “Tiradentes, a inconfidência no Rio” se desenrolavam em diferentes espaços históricos do Centro, para onde o público era levado de ônibus.

Romance-em-cena

Experiências fora da sala teatral, inclusive, atravessaram a carreira de Aderbal, valendo mencionar espetáculos anteriores e posteriores aos do Centro de Demolição — no primeiro caso, “A morte de Danton”, de Georg Büchner, realizado, em 1977, no metrô, então em construção, e no segundo, “Tio Vânia”, de Anton Tchékhov, encenação que, em 2003, tomou conta das dependências do Parque Lage.

Sem se acomodar à rotina de diretor, Aderbal sinalizou inquietação constante, qualidade evidenciada na proposição do romance-em-cena. Essa linguagem, que floresceu em “A mulher carioca aos 22 anos”, consiste na montagem de textos literários integrais, sem qualquer corte na transposição para o palco. A imaginação do espectador é estimulada, seja ao ver cada ator se desdobrando entre vários personagens, seja ao se deparar com a atribuição de múltiplos significados aos elementos de cena. Aderbal deu vazão a mais trabalhos nessa linha: os aclamados “O que diz Molero”, a partir do livro de Dinis Machado, e “O púcaro búlgaro”, originado do romance de Campos de Carvalho.

No Teatro Poeira, fundado por Marieta Severo, com quem era casado, e por Andréa Beltrão, Aderbal dirigiu muitas encenações — entre elas, “Sonata de outono”, de Ingmar Bergman, montagem que inaugurou o espaço, “As centenárias”, de Newton Moreno, “Moby Dick”, a partir do clássico de Herman Melville, e “Incêndios”, de Wajdi Mouawad.

Apesar de ter se notabilizado como diretor, Aderbal (que, durante anos, assinou como Aderbal Júnior) exerceu outras funções artísticas no decorrer de sua trajetória. Trabalhou como ator em algumas montagens. E destinou grande atenção ao campo da dramaturgia por meio das peças que escreveu, da intensa dedicação à Sociedade Brasileira de Autores Teatrais (SBAT) e da preocupação com a valorização do texto nacional. Entre as tantas peças que encenou estão “O cordão umbilical”, “Besame mucho” (ambas de Mario Prata), “O voo dos pássaros selvagens”, de Aldomar Conrado, e “Lima Barreto ao terceiro dia”, de Luís Alberto de Abreu.

Também não se deve esquecer de “Apareceu a Margarida”, de Roberto Athayde, que ganhou interpretação definitiva de Marília Pêra, e “Mão na luva”, de Oduvaldo Vianna Filho, com as atuações, dignas de aplausos entusiasmados, de Marco Nanini e Juliana Carneiro da Cunha.

Brasileiro e estrangeiro

A conexão com a dramaturgia brasileira não impediu Aderbal de lançar olhar igualmente minucioso em relação aos textos estrangeiros. Debruçou-se, com inventividade, sobre peças clássicas, conforme se pode perceber nas suas montagens para “Casa de bonecas”, de Henrik Ibsen, e “Hamlet”, de William Shakespeare, essa última protagonizada por Wagner Moura. Concebeu estruturas cênicas refinadas em “A peça sobre o bebê”, de Edward Albee, e “A prova”, de David Auburn, espetáculo potencializado pelo desempenho de Andréa Beltrão. Na verdade, para Aderbal, brasileiro e estrangeiro não eram terminologias opostas. Não por acaso, buscou, com afinco, uma aproximação com o teatro dos países vizinhos, em especial com o Uruguai.

Apesar de ter se notabilizado como diretor, Aderbal (que, durante anos, assinou como Aderbal Júnior) exerceu outras funções artísticas no decorrer de sua trajetória. Trabalhou como ator em algumas montagens. E destinou grande atenção ao campo da dramaturgia por meio das peças que escreveu, da intensa dedicação à Sociedade Brasileira de Autores Teatrais (SBAT) e da preocupação com a valorização do texto nacional. Entre as tantas peças que encenou estão “O cordão umbilical”, “Besame mucho” (ambas de Mario Prata), “O voo dos pássaros selvagens”, de Aldomar Conrado, e “Lima Barreto ao terceiro dia”, de Luís Alberto de Abreu.

Também não se deve esquecer de “Apareceu a Margarida”, de Roberto Athayde, que ganhou interpretação definitiva de Marília Pêra, e “Mão na luva”, de Oduvaldo Vianna Filho, com as atuações, dignas de aplausos entusiasmados, de Marco Nanini e Juliana Carneiro da Cunha.

Brasileiro e estrangeiro

A conexão com a dramaturgia brasileira não impediu Aderbal de lançar olhar igualmente minucioso em relação aos textos estrangeiros. Debruçou-se, com inventividade, sobre peças clássicas, conforme se pode perceber nas suas montagens para “Casa de bonecas”, de Henrik Ibsen, e “Hamlet”, de William Shakespeare, essa última protagonizada por Wagner Moura. Concebeu estruturas cênicas refinadas em “A peça sobre o bebê”, de Edward Albee, e “A prova”, de David Auburn, espetáculo potencializado pelo desempenho de Andréa Beltrão. Na verdade, para Aderbal, brasileiro e estrangeiro não eram terminologias opostas. Não por acaso, buscou, com afinco, uma aproximação com o teatro dos países vizinhos, em especial com o Uruguai.

Aderbal Freire-Filho: a imaginação sem limites https://tinyurl.com/2nn5kxj5

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