02 agosto 2023

Mercosul+União Europeia

Protecionismo europeu trava acordo União Europeia–Mercosul

Apesar das dificuldades para a concretização do acordo, Brasil não deve jogar a toalha
Luis Antônio Paulino/Vermelho


 

Tudo indica que não será desta vez que o Acordo de Livre-Comércio Mercosul-União Europeia vai sair do papel. Negociado por 20 anos, entre os governos de Itamar Franco e Jair Bolsonaro, o acordo que criaria um grande mercado de 700 milhões de pessoas está esbarrando em novos obstáculos que podem inviabilizar sua assinatura. Pelo Brasil há a resistência por parte do governo Lula de abrir o mercado brasileiro de compras governamentais para as empresas europeias. Aparentemente a resistência maior está no setor de saúde.

Nunca é demais lembrar que com a aprovação da nova lei de patentes, em 1994, muitos laboratórios farmacêuticos europeus que tinham fábricas no Brasil descontinuaram a produção local dos chamados princípios ativos que é onde está o maior valor do medicamento e mantiveram localmente apenas atividades menos nobres de mistura, encapsulamento e embalagem dos remédios. Com a abertura total do mercado, nem isso precisaria ser mantido aqui, com o agravante de que a margem de preferência dos laboratórios nacionais para as compras do governo também deixaria de existir. É uma preocupação relevante. Precisar depender totalmente de importações para abastecer o mercado local de medicamentos é um risco enorme, como vimos agora na pandemia da Covid-19. O atraso de alguns meses para obter as vacinas certamente custou milhares de vidas.

Por parte dos europeus é o velho protecionismo agrícola travestido de preocupações ambientais que está jogando areia na engrenagem. Aproveitando-se da gestão ambiental complicada do governo Bolsonaro, os europeus enviaram uma “side letter” fazendo novas exigências e estipulando sanções por seu descumprimento. A expectativa era de que com a eleição de Lula, com uma política ambiental mais alinhada com as exigências da União Europeia, isso fosse deixado de lado. Mas não foi. Pior ainda, a Comissão Europeia aprovou, neste mês, uma legislação que impõe restrições unilaterais às importações de sete commodities se produzidas em áreas derrubadas de florestas tropicais, cujo foco evidentemente é o Brasil. Para complicar ainda mais as coisas, no mesmo dia em que o presidente Lula se reunia com a presidente da Comissão Europeia, em Paris, para discutir o assunto, a Assembleia Nacional da França aprovou uma resolução contrária ao acordo entre a União Europeia e Mercosul. Embora a resolução aprovada não tenha força de lei é preciso lembrar que para o acordo entrar em funcionamento precisa ser ratificado pelos respectivos parlamentos de todos os países membros da União Europeia.

Apesar das dificuldades para a concretização do acordo, sobretudo em um momento em que o protecionismo volta com força nas relações internacionais de comércio pelas mãos dos próprios Estados Unidos, o Brasil não deve jogar a toalha.  É preciso levar em conta que, apesar de todas as imposições feitas aos países em desenvolvimento por ocasião da criação da OMC, a maré crescente do comércio global facilitada pela sua criação elevou as exportações dos países em desenvolvimento, permitindo a alguns escapar do subdesenvolvimento econômico. Embora a história de sucesso da China seja bem conhecida, a notável transformação da Índia, do Brasil e de outros grandes países em desenvolvimento oferece um exemplo igualmente relevante do poder transformador da globalização desde que utilizada com sabedoria.

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