Como as tarifas de Trump jogam a favor da China
Em vez de fazer uma batalha dos
EUA contra o mundo todo, Trump deveria ter unido todas as democracias
industriais, lideradas por Washington, contra Pequim
Thomas L.
Friedmann*/New York Times/Folha de S. Paulo
Após duas viagens à China nos últimos quatro meses, tenho tentado dizer isso de todas as formas que posso: pessoal, vocês simplesmente não entendem.
A Covid teve efeitos terríveis na saúde humana e na mortalidade, mas também teve um efeito devastador na nossa capacidade de entender os chineses. Executivos americanos e europeus saíram da China em massa no início da pandemia. Muito, muito poucos deles voltaram depois. Eles confiaram seus negócios na China a gerentes locais. Enquanto estavam ausentes, Pequim deu um grande salto à frente na manufatura avançada que o mundo não tinha. Criou um motor de manufatura como talvez nunca foi visto na história.
A China já controla um terço de toda a manufatura global (em 2000, eram 6%) e, quer se fale de carros, robôs ou telefones, o que está saindo da China hoje não é apenas mais barato e rápido. É mais barato, mais rápido, melhor e mais inteligente — e tudo isso está prestes a ser dramaticamente potencializado pela corrida desenfreada de Pequim para colocar inteligência artificial em tudo o que fabrica.
Isso é produto de décadas de investimentos maciços do governo em educação, infraestrutura e pesquisa, por trás de muros de proteção — em uma sociedade onde as pessoas estão prontas para trabalhar das 9h às 21h, seis dias por semana. Enquanto a China estava construindo isso, a maior nova indústria dos EUA era a polarização política e viciar seus filhos no TikTok e Instagram.
Leia
o artigo do meu colega de redação, Keith Bradsher, da China:
"Dados recentes do banco central da China mostram que bancos controlados pelo Estado emprestaram um adicional de US$ 1,9 trilhão a mutuários industriais nos últimos quatro anos. Nas periferias de cidades por toda a China, novas fábricas estão sendo construídas dia e noite, e fábricas existentes estão sendo atualizadas com robôs e automação. Os investimentos e avanços da China na manufatura estão produzindo uma onda de exportações que ameaça causar fechamentos de fábricas e demissões não apenas nos Estados Unidos, mas também ao redor do mundo. "O tsunami está vindo para todos", disse Katherine Tai, que foi representante de Comércio dos Estados Unidos para o ex-presidente Joseph R. Biden Jr."
É
por isso que a estratégia do
presidente Trump é tão insensata. Em vez de impor tarifas
ao mundo inteiro, deveríamos estar buscando alinhar todos os nossos
aliados industriais em uma frente unida para dizer à China: você não pode fazer
tudo para todos. Enquanto a China é um terço da produção manufatureira global,
ela representa apenas
13% do consumo global. Isso não é sustentável — e não está apenas
assustando os EUA e a Europa, mas também o Brasil, a Indonésia, a Índia e
outros; até mesmo a Rússia, de repente, reduziu as importações de automóveis da
China.
Em
vez de fazer nossa estratégia ser os EUA contra o mundo inteiro em tarifas,
Trump deveria ter feito com que todas as democracias industriais, lideradas por
Washington, se unissem contra Pequim. O objetivo seria negociar efetivamente um
caminho a seguir que obrigasse a China a redirecionar suas energias para dentro
— investindo em sua escassa rede de segurança social e sistema de saúde,
estimulando sua demanda doméstica — enquanto convida a China a construir novas
fábricas não em Hanói, mas em Hamtramck (Michigan), e a transferir suas
tecnologias e cadeias de suprimentos para nós em joint ventures 50/50.
Infelizmente,
nosso presidente e vice-presidente estavam tão ocupados exibindo seus
músculos na Groenlândia, demitindo nossos principais generais por
não serem suficientemente submissos ao nosso Querido Líder e insultando nossos
aliados europeus por serem muito progressistas, que desperdiçaram a alavancagem
de que precisávamos para lidar efetivamente com esse formidável mecanismo
chinês.
Mas
aqui está o que os líderes empresariais americanos realmente não entendem:
Trump e J. D. Vance assustaram a China e a UE com seu comportamento errático.
Quando veem um presidente dos EUA simplesmente ignorar um acordo
comercial com o México e o Canadá que ele mesmo negociou, eles
se perguntam: como podemos confiar em qualquer acordo que fizermos com ele? Isso
pode aproximar a China e a UE.
Ouço
meus compatriotas americanos dizerem: só precisamos chegar às eleições de meio
de mandato e fazer os democratas recuperarem a Câmara, e estaremos bem.
Desculpem, pessoal, não podemos esperar tanto tempo. Mais 20 meses ou mais dessa
liderança errática e nosso país estará irremediavelmente quebrado. Precisamos
de um punhado de republicanos na Câmara e no Senado — agora mesmo — para cruzar
o corredor e pôr fim a esse devastador desastre econômico feito pelo homem.
*editorialista internacional do New York Times
[Foto: Funcionários em uma fábrica chinesa de fibra de vidro -[Se comentar, assine]
Leia também: Efeito
bumerangue faz Trump recuar com “tarifaço”
https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/04/tarifas-de-trump-idas-e-vindas.html
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