Engels, um curto registro
Dilermando Toni
Neste 2025 completam-se 130 anos que o coração de Friedrich Engels parou de bater. Aquele que “a seguir seu amigo Karl Marx, foi o mais notável sábio e mestre do proletariado contemporâneo em todo o mundo civilizado” pelas palavras de Lênin.
Fui relembrado para a efeméride, ainda em
tempo para uma singela homenagem, pois a data exata do fato foi 5 de Agosto,
manuseando o Resumo de O Capital, agora publicado pela primeira vez em português
pela Boitempo. A esse trabalho, dedicado à introdução ao estudo e à difusão do
livro I da obra prima de Marx, só se tinha acesso em espanhol, em uma
publicação da Grijalbo mexicana, de 1962, como parte da coletânea Escritos
Econômicos Varios de Carlos Marx e Federico Engels.
As contribuições de Engels são imensas. Ele
foi decisivo para explicar, por exemplo, o caráter socialismo científico, como
resultado necessário do desenvolvimento das forças produtivas do capitalismo.
Sua conhecida obra Do Socialismo Utópico ao Socialismo Científico, parte do
Anti-Düring, publicada há quase 150 anos, navega exatamente neste terreno.
Deveria ser motivo de estudo obrigatório para
todas as pessoas empenhadas na superação do capitalismo que, não poucas vezes,
desistem frente as primeiras dificuldades impostas pela luta à qual aderiram pelo impulso da
emoção, pelo inconformismo diante do sofrimento dos explorados e não chegaram a
entender em profundidade, historicamente, dialeticamente – vale dizer
cientificamente – o desenvolvimento da sociedade humana.
Os conhecimentos históricos de Engels
esbarrotam chocantemente quando ele manejando com maestria a dialética, com uma
didática excepcional, desvenda os
fundamentos histórico-estruturais de categorias sociais, econômicas e políticas
tão importantes como em A Origem da Família, da Propriedade Privada e do
Estado. Trabalho fundamental para a elevação do nível de consciência daqueles
que se dedicam à luta pelo socialismo. A leitura deste livro, décadas atrás,
transportou-me até o Conto de Canário de Machado de Assis, que fala da
satisfação do pássaro quando provou o gosto da liberdade fora da gaiola. Ou
seja, da visão crítica que pude adquirir da esmagadora ideologia da burguesia.
Na abalizada opinião de Clara Araújo, “A análise
de Engels retirou o gênero da camisa de força da biologia e situou as razões
das desigualdades entre homens e mulheres fora dos destinos inscritos nos
corpos. Revelou, também, os elos entre a estrutura de classes, a opressão de
gênero e o papel do casamento e da autoridade masculina na tessitura dessa teia
de subordinação, controle da reprodução biológica, dos bens econômicos e da
propriedade privada.” Assim, pode-se concluir que a obra de Engels é uma arma
afiada na luta contra o identitarismo que campeia nos meios de esquerda.
Penso que, A Situação da Classe Trabalhadora
na Inglaterra de 1844, um dos primeiros escritos de Engels, ganha uma
importância particular na presente situação em que a vanguarda revolucionária
vem se afastando gradativamente das bases de trabalhadores, exagerando a
importância da atividade institucional, eleitoral-parlamentar, com a ilusão de
que ocupar tantos espaços institucionais quantos seja possível vai por si só
impulsionar as mudanças revolucionárias.
Aí foi onde Engels disse que “o conhecimento
das condições de vida do proletariado é uma necessidade absoluta se quisermos
assegurar uma base sólida às teorias socialistas bem como aos juízos sobre a
sua legitimidade, acabar com todas as divagações e fábulas pro e contra.”
Engels se debruçou com todo o vigor sobre os efeitos que o advento da grande
indústria mecanizada trouxe para seu inexorável produto: a classe operária.
Escreveu Engels que “a grande indústria só adquiriu importância no dia em que
transformou os utensílios em máquinas, as oficinas em fábricas e, desse modo, a
classe trabalhadora média em proletariado operário, e os negociantes de outrora
em industriais ...”
Para escrever esse livro Engels não se
limitou a ficar no escritório da empresa em que era empregado e seu pai um dos
donos. Foi a campo, “percorreu os bairros sórdidos em que viviam os operários e
viu com os próprios olhos a miséria e os males que os afligiam”. Mas não se
limitou a isso, leu tudo o que se havia escrito sobre o tema. Isso permitiu nas
palavras de Lênin que “Engels fosse o primeiro a declarar que o proletariado
não é só uma classe que sofre, mas que a miserável situação econômica em que se
encontra empurra-o irresistivelmente para a frente e obriga-o a lutar pela sua
emancipação definitiva ... o movimento político da classe operária levará,
inevitavelmente, os operários à consciência de que não há para eles outra saída
senão o socialismo. Por seu lado, o socialismo só será uma força quando se
tornar o objetivo da luta política da classe operária”.
Muitos poucos sabem que Engels, além de
intelectual brilhante foi também um homem de ação. Dedicou-se à organização dos
trabalhadores naquela experiência que passou a história como II Internacional.
Participou pessoalmente de conflitos armados na Europa. Ele lutou nas fileiras do
exército revolucionário durante o Levante de Baden, sua terra natal, e do
Palatinado em 1849, parte das Revoluções de 1848. Além dessa experiência
prática, Engels foi um proeminente teórico militar, tendo publicado vasto
material sobre as táticas, estratégias e história militar, assim como sobre a
influência do desenvolvimento da ciência e da tecnologia sobre os armamentos e
as guerras. Ele tratou desse tema no Anti-Düring, também. Assunto por demais
atual, registro.
Por último, gostaria de destacar que sempre
me impressionou muito a profunda amizade, a intensa cooperação, a
desinteressada camaradagem existente entre Engels e Marx. Ela teve início em
1844 e durou ininterruptamente até1883, quando Marx faleceu. Quase 40 anos! Ela
se expressou inúmeras vezes quando, por exemplo, elaboraram o Manifesto do
Partido Comunista ou quando Engels desenvolveu um enorme trabalho para redigir
e publicar os tomos II e III de O Capital, após a morte de Marx.
Recorro mais uma vez a Lênin que escreveu
sobre esse aspecto tão exemplar: “As lendas da Antiguidade contam exemplos
comoventes de amizade. O proletariado da Europa pode dizer que a sua ciência
foi criada por dois sábios, dois lutadores, cuja amizade ultrapassa tudo o que
de mais comovente oferecem as lendas dos antigos. Engels, em geral com toda a
razão, sempre se apagou diante de Marx. ‘Ao lado de Marx, escreveu ele a um
velho amigo, fui sempre o segundo violino’. O seu carinho por Marx enquanto ele
viveu e sua veneração à memória do amigo morto foram ilimitados. Este militante
austero e pensador rigoroso tinha uma alma profundamente afetuosa”.
Lênin escreveu essas palavras no mesmo ano em
que Engels faleceu. Mas não seria impróprio se terminássemos essa breve
homenagem, 130 anos depois repetíndo com ele: “A memória de Friedrich Engels,
grande combatente e mestre do proletariado, viverá eternamente!”
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