Governo
Bolsonaro corta R$ 2,4 bi do MEC, e universidades veem situação insustentável
Valor
representa 11,4% das despesas livres; rede de ensino federal critica corte e
teme pela continuidade das atividades
Paulo Saldaña, Folha de S. Paulo
O governo Jair Bolsonaro bloqueou R$ 2,4 bilhões do orçamento do MEC
(Ministério da Educação) deste ano. Os impactos recaem sobre as
atividades da pasta e também sobre universidades e institutos federais de
educação, que têm passado por enxugamentos.
O bloqueio foi anunciado nesta quarta-feira (5) em ofício
enviado para as federais, que criticam a decisão e temem pela continuidade dos
serviços.
Os R$ 2,4 bilhões representam 11,4% da dotação atual de despesas discricionárias do ministério. São as despesas de livre movimentação, sem levar em conta salários e transferências obrigatórias, por exemplo.
Segundo o documento encaminhado para as universidades e
institutos, os bloqueios recaem no orçamento discricionário e
emendas parlamentares, inclusive as de relator —também
conhecidas como orçamento secreto.
O governo tem escondido informações sobre bloqueios nas emendas
de relator, desagradando o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que
comanda as cifras bilionárias direcionadas por critérios políticos. A Folha mostrou que a área econômica elevou bloqueio em
emendas de relator a R$ 6,8 bilhões.
O corte no MEC representou, para as unidades vinculadas e
instituições federais de ensino, uma redução de 5,8% nos limites de
movimentação e empenho. O governo já fez um estorno referente a esse percentual
na terça-feira (4).
Questionado, o Ministério da Educação não respondeu se foi
consultado sobre a decisão. "O MEC realizou os estornos necessários nos
limites de modo a atender ao Decreto, que corresponde a 5,8% das despesas
discricionárias de cada unidade", diz a nota, referindo a decreto do fim
de setembro que estabeleceu um cronograma de limitação de movimentação e
empenho.
Leia também: Como o Orçamento
Secreto prejudicou diretamente 18 programas do MEC https://bit.ly/3zvl3CF
O Ministério da Economia também foi procurado mas não respondeu
até a publicação deste texto.
Com esse bloqueio, os institutos da Rede Federal de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica acumulam uma perda de R$ 300 milhões.
Foram congelados R$ 147 milhões agora e o restante havia sido cortado em junho.
Nas universidades federais, os cortes do meio do ano e o de
agora perfazem uma perda de R$ 763 milhões com relação ao que havia sido
aprovado no orçamento deste ano.
"Diante desse contexto financeiro e orçamentário caótico,
quem perde é o estudante, que será impactado na continuidade de seus estudos,
pois os recursos da assistência estudantil são fundamentais para a sua
permanência na instituição", diz nota da Conif, conselho que agrega os
institutos técnicos e profissionais do país.
Segundo a entidade, "transporte, alimentação, internet,
chip de celular, bolsas de estudo, dentre outros tantos elementos essenciais
para o aluno não poderão mais ser custeados pelos Institutos Federais, pelos
Cefets e Colégio Pedro II".
A Andifes, que reúne os reitores das universidades federais,
publicou nota em que afirma que o corte pode inviabilizar o funcionamento das
instituições até o fim do ano.
"Essa limitação estabelecida pelo Decreto, que praticamente
esgota as possibilidades de pagamentos a partir de agora, é
insustentável", diz a nota.
Um decreto publicado pelo governo no dia 30 de setembro definiu
os limites de movimentação de empenho do MEC e de outros ministérios. No texto,
há perspectiva de liberação dos limites cortados no mês de dezembro, mas não há
certeza de que os recursos serão revistos.
"Segundo informações do Ministério da Economia", diz
nota do MEC, "os limites serão restabelecidos em dezembro".
Além disso, há queixas de que os congelamentos ocorridos deste
ano inviabilizam o planejamento, como ainda ressalta a nota da Andifes.
"Lamentamos, por fim, a edição deste Decreto que estabelece
limitação de empenhos quase ao final do exercício financeiro, mais uma vez
inviabilizando qualquer forma de planejamento institucional, quando se apregoa
que a economia nacional estaria em plena recuperação. E lamentamos também que
seja a área da educação, mais uma vez, a mais afetada pelos cortes
ocorridos."
A área da educação sofre cortes sistemáticos sob o governo
Bolsonaro. A Folha mostrou
em setembro que os gastos com
construção de creches caem fortemente, ano a ano, desde 2019.
O MEC terminou 2021 com R$ 101 milhões pagos para obras de
creches em prefeituras. Trata-se de uma redução de 80% com relação a 2018,
último ano do governo Michel Temer (MDB), quando a cifra foi de R$ 495 milhões,
em valores atualizados a preços de 2021.
No orçamento de 2023, a previsão é da retirada de R$ 1 bilhão da
educação básica. O cenário negativo para a educação infantil se intensifica: os
recursos previstos para a etapa caem 96% com relação ao projeto deste ano.
Passa de R$ 151 milhões para apenas R$ 5 milhões, como ressalta análise do
Movimento Todos Pela Educação.
Já as instituições federais de ensino superior passam por
reduções de orçamento ao menos desde 2015. Sob o governo Bolsonaro, enfrentam
cortes e congelamentos —a UFRJ, federal do Rio
de Janeiro, por exemplo, chegou a ameaçar fechar as portas no ano
passado.
Leia também: A educação diante dos
desafios da contemporeidade https://bit.ly/3DRbvEp
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