A
morte e a infelicidade do ministro japonês
Luciano Siqueira
instagram.com/lucianosiqueira65
Verdade que a relação do homem com a morte ganha traços diferenciados conforme as múltiplas culturas e crenças espalhadas mundo afora. Os orientais têm fama de enfrentarem o inevitável fim da existência individual com muito mais serenidade do que nós outros habitantes do hemisfério ocidental. Aqui o indefectível evento é encarado dramaticamente.
Falta dizer que lá como cá sobre a morte se diz o que é razoável e também disparates, sobretudo quando o ser falante ocupa função pública e se deixa levar por rompantes inadequados.
Célebre é a afirmativa atribuída a Agamenon Magalhães “Quem não puder viver, morra”, negada pelos seus biógrafos.
Na última segunda-feira, 21, em Tóquio, o ministro das Finanças japonês, Taro Aso, foi até mais enfático – e, segundo as agências de notícias, não pode negar o dito. Afirmou que deve ser permitido o idoso "apressar-se e morrer", ao invés de continuar, com sua indesejada (sic) existência, onerando o governo para cuidados médicos dispendiosos.
Ironicamente, Aso, que acumula o cargo de vice-primeiro ministro, ostenta bem vividos 72 anos de idade, o que obviamente o inclui entre os idosos. E não teve pejo em asseverar, em reunião do Conselho Nacional de Reformas da Segurança Social: "Deus nos livre se você é forçado a viver quando você quer morrer. Você não pode dormir bem quando você pensa que está tudo pago pelo governo", completou. "Isso não vai ser resolvido, a menos que você deixá-los se apressar e morrer", disse ele – segundo nota da Agência France Press. E, talvez para tranquilizar os presentes, anunciou: "Eu não preciso desse tipo de atendimento. Vou morrer rapidamente".
Faltou o indigitado e infeliz ministro esclarecer se pretende encurtar sua infeliz existência mediante o suicídio, nem qual método usará.
O danado é que seu país, o Japão, ostenta um quarto de sua população, estimada em 128 milhões de viventes, justamente na faixa dos 60 anos e mais.
No Brasil, os idosos somam aproximadamente 20 milhões. Imagine se altas autoridades da República seguirem o exemplo do senhor Aso e passarem a defender tese semelhante? Em matéria de atitude desastrosa, tudo é possível, embora não creia que isso venha a acontecer entre nós. Mas, como gato escaldado tem medo de água fria, apresso-me em concitar meus compatriotas de 60 anos e mais a nos unirmos em defesa prévia contra a tentativa de nos imporem o abreviamento dessa coisa fantástica que é a vida.
Crônica publicada no Blog da revista Algomais em janeiro de 2013
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