Blog de Luciano Siqueira
A construção coletiva das idéias é uma das mais fascinantes experiências humanas. Pressupõe um diálogo sincero, permanente, em cima dos fatos. Neste espaço, diariamente, compartilhamos com você nossa compreensão sobre as coisas da luta e da vida. Participe. Opine. [Artigos assinados expressam a opinião dos seus autores].
25 dezembro 2025
Fotografia
Canto dos pássaros faz bem, oxente! https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/10/minha-opiniao_88.html
Minha opinião
A desumana partilha do tempo*
Luciano Siqueira
instagram.com/lucianosiqueira65
A essa altura da vida, empenhado em render o
máximo que posso porque miro o horizonte e vejo que já vivi muito e que não me
resta tanto assim, lidar com o tempo não é fácil. Distribuir bem o tempo útil,
nessa categoria incluindo o tempo para o amor, o lazer, a leitura e o simples
devaneio criativo. Uma peleja diária, que vou levando entretanto sem muito
estresse, pois assim perderia muito tempo...
Pois bem. Passada a noite festiva de Natal,
mergulho na habitual algazarra dos últimos dias do ano numa casa de praia, com
Luci, as meninas, genros, netos e agregados. Todos se divertem o tempo todo – e
eu mais ou menos, ao olhar dos demais, pois durmo um tanto e leio bastante:
para reparar o corpo da canseira acumulada e me deliciar sobretudo com contos,
romances, poesia. Há até quem, em desaviso, me critique por “aproveitar pouco”,
eu que acho que aproveito bem demais!
Imagine quem leva a vida comprimido entre a
rígida carga da jornada de trabalho e o tempo gasto para se locomover numa
cidade de trânsito complexo. Muitos ainda têm, de quebra, algumas horas de
curso noturno.
O fato é que as horas efetivamente destinadas ao
descanso ou ao lazer, aos assalariados de nossas médias e grandes cidades têm
sido encurtadas na razão direta da explosão urbana. Na Região Metropolitana do
Recife, por exemplo, há quem resida em Paulista, trabalhe no Cabo de Santo
Agostinho e estude, à noite, no Recife. E ainda faz bico no final de semana
para complementar a renda.
Assim saem pelo ralo conquistas históricas do
tempo da Revolução Industrial, quando após ingentes lutas operárias foi
possível superar as jornadas de trabalho superiores a 14 horas diárias e mais
de 80 horas semanais. Como observa Marcio Pochmann, estudioso do mundo do
trabalho, desde então, a conquista de férias regulares, do descanso semanal e
do teto máximo de oito horas diárias (48 horas semanais) proporcionou a redução
da relação do trabalho com o tempo real de vida de mais de dois terços a menos
da metade.
Na verdade, com o altíssimo nível de
desenvolvimento das forças produtivas atual, em que os progressos da ciência
permitem um extraordinário aporte de tecnologia aos sistemas produtivos, seria
possível – se a lógica do sistema capitalista não fosse, como é, o lucro máximo
via extorsão da mais-valia – reduzir drasticamente a jornada de trabalho de
modo a que milhões de excluídos pudessem ingressar na produção e os que
trabalham pudessem dedicar mais tempo de suas vidas ao espírito.
Pior com o advento da “uberização”, modo
de dizer da absurda precarização do trabalho, informal em toda linha, reforçada
pela pressão ideológica do “empreendedorismo individual”.
Mas aí caímos na natureza injusta do sistema e
na razão de ser da luta de muita gente (como o autor dessas linhas) por uma
sociedade justa e mais humana. Que justifica, pelo menos a meu juízo, o esforço
militante de bem aproveitar o tempo para melhor contribuir para o movimento
transformador.
*Texto da minha coluna desta
quinta-feira no Vermelho www.vermelho.org.br
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Leia também: A lógica mercantil em detrimento do bem-estar humano https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/09/abraham-sicsu-opina_29.html
Postei nas redes
Quando a idade avança e presente e futuro se fundem, do passado cabe colher rastros que orientem a caminhada de agora.
O
mundo gira. Saiba mais https://lucianosiqueira.blogspot.com/
Dica de leitura: Mia Couto
"O mapeador de ausências"
Notas
sobre o aspecto formal da obra e estilístico do autor
Lis Fonseca em seu blog
Para mim, é impossível ler um Mia
Couto e não ser tocada profundamente em algum momento pela simples construção
de uma passagem. Temos vários exemplos na literatura das prosas poéticas, mas o
que me impressiona no estilo desse autor é a originalidade dessas formações e
como elas impactam quem lê. “O peito abraçado pelos ombros” é mais que uma
frase, mais que palavras, é uma imagem grandiosa, tão poderosa, que diz tantas
coisas!
Além disso, nesta obra em
específico, o autor convoca a variedade de discursos para compô-la: são
relatórios, cartas, transcrições, diários, lembranças, e tudo é executado de
forma tão confiante, tão certeira, que é fácil e confortável de acreditar que
são relatórios, cartas, transcrições, diários, lembranças reais. É um bônus
para quem escreve poder também estudar essa estrutura e aprender.
Outro aspecto interessante dessa
obra é a preservação do português em que foi escrita. Para mim, a experiência
foi bastante positiva. Nos últimos meses, li mais autoras e autores de língua
portuguesa do que em toda a minha vida, e principalmente os contemporâneos, e
tudo me parece tão mais bonito! Tão mais compreensível! Talvez também por estar
aprendendo outra língua (espanhol), tenho pensado muito sobre o que se perde da
obra em uma tradução, ainda que seja a melhor tradução – e acabo tentando fugir
ao pensamento porque me dá desespero. Tenho muito respeito por essa valorização
da linguagem pátria, é uma forma muito bonita de expressar o amor ao que se é.
Por fim, achei deliciosamente
delicado também que a maioria das epígrafes sejam de poesias ou frases de
Adriano Santiago. Estamos acostumadas a ler debaixo desses trechos o nome
de escritoras e escritores de grandeza indiscutível; descobrir Adriano Santiago
ali e apreciar suas palavras me causou a vontade de que ele fosse mais do que
ficção.
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Leia também: "Lembrança alada", poema
de Mia Couto https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/12/palavra-de-poeta_71.html
Ciência & desenvolvimento soberano
Olival Freire defende ciência soberana à frente do CNPq
Edição especial recebe o novo presidente do CNPq para discutir soberania científica, bolsas, universidades e estratégias de repatriação e retenção de pesquisadores.
Cezar Xavier/Vermelho
A edição especial do Entrelinhas Vermelhas, desta segunda-feira (22), recebe o físico e professor universitário Olival Freire Júnior, recém-empossado presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). A entrevista aprofunda o debate sobre o papel estratégico da ciência na reconstrução do país após anos de desmonte institucional.
Com trajetória consolidada na gestão acadêmica e científica, Olival Freire assume o comando do CNPq em um momento decisivo para a retomada das políticas públicas de ciência, tecnologia e inovação.
Assista a íntegra da entrevista:
Do desmonte à reconstrução do CNPq
Ao longo da conversa, Olival Freire destaca a gravidade dos ataques sofridos pela ciência brasileira nos últimos anos, especialmente durante o período de negacionismo e cortes orçamentários. Segundo ele, a reconstrução é um processo complexo, pois “é sempre mais fácil destruir do que reconstruir”.
A restauração do orçamento do setor, a recomposição do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) como fundo não contingenciável e a retomada do respeito institucional à ciência são apontadas como avanços decisivos do atual governo.
Segundo Freire, embora o atual governo tenha promovido avanços importantes, o impacto da destruição recente ainda é profundo. “É mais fácil destruir estruturas de um país do que reconstruí-las”, afirmou, ao destacar que o sistema científico sofreu “uma gravidade sem limites” no período anterior.
Ao avaliar o cenário herdado, Olival Freire ressaltou que o ataque à ciência atingiu inclusive setores historicamente ligados ao desenvolvimento tecnológico. “É difícil compreender como instituições com tradição científica embarcaram tão a fundo em um governo negacionista”, disse, citando o papel histórico das Forças Armadas na criação do próprio CNPq, que completará 75 anos.
Para ele, a virada ocorreu com a mudança política de 2022. “Essa característica mudou porque o povo brasileiro mudou a orientação política do país”, afirmou, ao associar a reconstrução científica à vitória de Lula nas eleições.
Bolsas, editais e valorização dos pesquisadores
Freire destacou como conquistas centrais a recomposição do orçamento da ciência, a liberação integral do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) e o reajuste das bolsas de pesquisa. “Nós tivemos aumento no número de bolsas, reajuste no valor das bolsas e lançamento de editais estratégicos”, explicou.
Outro eixo central do programa é a política de bolsas e fomento à pesquisa. Olival Freire detalha o aumento no número de bolsas, o reajuste após uma década de congelamento e o relançamento de editais estratégicos, como o Universal e os Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs).
Ele ressalta, contudo, que os desafios permanecem, especialmente diante da defasagem dos valores das bolsas e da necessidade de garantir direitos previdenciários aos pós-graduandos, tema em debate no Congresso Nacional.
Além dos números, o presidente do CNPq ressaltou a dimensão simbólica da retomada. “Houve uma valorização e um respeito em relação à ciência e aos cientistas”, disse, lembrando a recuperação de honrarias retiradas durante o governo anterior e a reabilitação institucional de pesquisadores perseguidos.
Soberania, desenvolvimento e política com ciência
A entrevista também aborda a ciência como indutora do desenvolvimento soberano. Olival Freire defende que áreas estratégicas — como transição energética, saúde, defesa, satélites e indústria farmacêutica — não podem depender de importações.
Freire defendeu que a ciência deve ocupar papel central na formulação das políticas de Estado. “A ciência não é apenas um valor cultural; ela deve ser a base para a elaboração de políticas públicas”, afirmou, citando a diretriz do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação de orientar decisões governamentais a partir de dados científicos.
Segundo ele, essa abordagem é essencial para enfrentar desafios estratégicos do país, como transição energética, saúde pública, indústria farmacêutica e soberania tecnológica.
Nesse contexto, destaca a diretriz de “política com ciência”, que orienta o uso do conhecimento científico como base para a formulação de políticas públicas, reforçando a capacidade do Estado de planejar e decidir com autonomia.
Repatriação e retenção de cérebros
Um dos pontos centrais da edição é o debate sobre a fuga de cérebros e as políticas de reversão desse processo. O presidente do CNPq apresenta os resultados do programa Conhecimento Brasil, que combina redes internacionais de pesquisa com um robusto programa de repatriação de cientistas.
Olival Freire destacou o sucesso do programa Conhecimento Brasil, que trouxe quase 600 pesquisadores de volta ao país. “Você só traz de volta alguém que está instalado no exterior se tiver uma proposta realmente atrativa”, afirmou.
Com bolsas atrativas, recursos para montagem de laboratórios e contratos de longa duração, o programa já viabilizou o retorno de quase 600 pesquisadores altamente qualificados, além de criar mecanismos para reter jovens doutores no país.
Reencantar a juventude com a ciência
Ao final da conversa, Olival Freire compartilha o que define como sua principal meta à frente do CNPq: reencantar a juventude brasileira com a ciência. Mais do que números, ele aposta na construção de um ambiente em que fazer ciência volte a ser visto como projeto de vida e instrumento de transformação nacional.
Para o presidente do CNPq, o maior legado esperado vai além de dados e estatísticas. “A minha grande expectativa é reencantar a juventude brasileira com a ciência”, disse. Segundo ele, é fundamental recuperar a ideia de que “vale a pena fazer ciência” e que a carreira científica é estratégica para o desenvolvimento soberano do Brasil.
Ao final, Freire reconheceu que ainda há desafios relevantes, como a ampliação do orçamento para fomento à pesquisa e a luta por novos reajustes nas bolsas. “É uma questão de honra não atrasar bolsa”, afirmou, ao relatar os esforços da gestão para garantir regularidade nos pagamentos a quase 100 mil bolsistas em todo o país.
Para Olival Freire, fortalecer a ciência é condição indispensável para o futuro do Brasil. “Ciência e tecnologia não são bens que se compram no mercado. São caminhos que o país precisa aprender a trilhar”, concluiu.
A edição especial do Entrelinhas Vermelhas reforça, assim, a centralidade da ciência para um projeto de país soberano, inclusivo e comprometido com o futuro.
Leia: Colonialismo digital: a nova fronteira da dependência latino-americana https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/11/o-desafio-da-autonomia-tecnologica.html
Minha opinião
Ravi e Miguel bem na frente de
Luciano
Luciano
Siqueira
instagram.com/lucianosiqueira65
Despertei para o significado do meu nome quando inscrito por minha mãe num cursinho de catecismo, preparatório para a primeira comunhão na igreja de São João Batista, na Lagoa Seca, bairro em que residia em Natal.
Uma freira de origem italiana, se bem me lembro chamada Angélica, ao
anotar meu nome o saudou com entusiasmo: "Luciano é da parte de São Lucas,
protetor dos médicos. Quem sabe você será médico quando crescer!?"
De pronto me senti diferenciado em casa, os meus irmãos Humberto e
Airton nada tinham de sagrado. Minha irmã Socorro, sim: batizado em alusão a
Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, santa da devoção da minha mãe Oneide.
Da premonição da irmã Angélica vim me lembrar apenas quando ingressei na
Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Pernambuco, muitos anos
passados.
Mas hoje constato que Luciano não está entre os mais escolhidos pelas
famílias brasileiras. Ravi e Miguel, sim.
Por quê?
Segundo a Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais,
pelo visto fonte importante da grande mídia no trato do assunto, tanto os prenomes
masculinos como Helena, a preferida com larga margem de vantagem entre as
mulheres, pode ter a influência de diversos fatores: além de preferências
individuais, tendências culturais, sociais e midiáticas.
Donde você vê que a coisa não é simples. Além de Helena no primeiríssimo
lugar, ocupam o pódio Maitê, Cecília, Maria Cecília, Aurora e — viva! — Alice,
nome da minha neta de 12 anos.
Qual a importância disso? Para mim, nenhuma; mas me intriga ter sido
batizado Luciano, hoje tão pouco escolhido por mães e pais brasileiros.
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Leia também: "O
auto-retrato", poema de Mario Quintana https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/12/palavra-de-poeta_11.html




