12 janeiro 2023

O que está sendo investigado

Invasão, financiamento, omissão e estímulo: entenda as quatro frentes de investigação sobre os atos golpistas

Apurações avançam sobre responsáveis pelo vandalismo nas sedes dos Poderes e buscam quem bancou as ações e as conexões políticas dos vândalos; PGR mira participação de deputados bolsonaristas
Aguirre Talento, Bruno Abbud e Patrik Camporez, O Globo

 

Quatro dias após os atos terroristas em Brasília, as apurações sobre o caso foram divididas pelos órgãos de investigação em quatro frentes: identificar as pessoas que invadiram e depredaram as sedes do Congresso, do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Palácio do Planalto; descobrir quem financiou os manifestantes; apurar a omissão de agentes públicos que deveriam zelar pela segurança pública; além de encontrar eventuais conexões políticas entre líderes das manifestações com autoridades.

Nesta quarta-feira, a Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu a instauração de um novo inquérito específico para apurar essa última frente, das ligações políticas. Em manifestação encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF), o subprocurador-geral Carlos Frederico dos Santos, designado pelo procurador-geral Augusto Aras para conduzir as investigações sobre os atos antidemocráticos, solicita apuração sobre a responsabilidade dos deputados federais diplomados André Fernandes (PL-CE), Clarissa Tércio (PP-PE) e Silvia Waiãpi (PL-AP). Segundo a PGR, “o discurso em apoio e a conclamação dos atos que culminaram na invasão às sedes dos Poderes constitucionais são indicativos de que o incitamento difundido (...) estimulou a prática das ações criminosas”.

Fernandes e Clarissa negaram nas redes sociais terem incentivado os atos. O deputado disse que não convocou ninguém e disse que não sabia que haveria “quebra-quebra nem vandalismo”. Já Clarissa afirmou que é “totalmente contra qualquer tipo de violência, vandalismo, ou de destruição do patrimônio público, que venha ameaçar a nossa democracia”. Waiãpi foi procurada, mas não respondeu aos contatos.

Em outra frente, a Polícia Federal analisa material apreendido anteontem na casa do ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres, em busca de elementos que demonstrem eventual conexões políticas com os envolvidos nos atos de 8 de janeiro. Torres, que foi ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, é alvo de uma ordem de prisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que ainda não foi cumprida porque ele está em viagem aos Estados Unidos.

A busca pelos financiadores também avançou nesta quarta, após um vendedor de picolé de Salvador preso no domingo afirmar ter recebido R$ 400 para viajar a Brasília para participar do atos. Em depoimento à Polícia Civil, revelado pelo colunista Ancelmo Gois, do GLOBO, Gilvã Estrela da Silva informou que ficou sabendo da caravana “porque vendia picolés em frente ao acampamento de Salvador”.

OS VÂNDALOS

·         As principais provas são as imagens do dia, feitas pelos próprios golpistas, por câmeras de segurança ou pela imprensa, permitem identificar centenas de vândalos

·         Foram cerca de 200 presos em flagrante na Praça dos Três Poderes, mas as autoridades estimam a presença de mais de 4 mil pessoas. Outras 1,2 mil pessoas foram presas no dia seguinte no acampamento no QG do Exército. Boa parte, como os idosos, já foi liberada

·         Os depoimentos têm ajudado a esclarecer a dinâmica e a motivação dos acontecimentos. Nos depoimentos, um dos presos afirma que a ideia era criar uma situação que justificasse a decretação da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) para que o Exército pudesse ser acionado

O que falta esclarecer ou demonstrar?

·         Até que ponto o acampamento no QG do Exército foi usado para planejar os atos

·         O papel das principais lideranças da invasão

·         A Justiça precisará distinguir a atuação de cada um nos mais de dez possíveis crimes cometidos no dia

A OMISSÃO DAS FORÇAS DE SEGURANÇA

·                   O governo federal acusa o Governo do Distrito Federal de ter mudado o planejamento para o dia 8. Segundo o ministro Flávio Dino, o GDF decidiu deixar a Esplanada dos Ministério aberta e com menos policiais. O interventor na Segurança, Ricardo Cappelli, afirma que o ex-secretário Anderson Torres exonerou parte da cúpula da Secretaria e deixou o comando acéfalo.

·                   As imagens apontam para a conivência de policiais e militares responsáveis pela segurança. A revista na barreira na Esplanada era frágil. Policiais fotografavam a multidão que cometia crimes. Outros foram fotografados tomando água de coco

·                   Os depoimentos acrescentaram novos elementos. Um golpista afirmou que um militar do Exército ajudou vândalos a fugir do Planalto na chegada da polícia. Outros três disseram ter sido orientados a entrar no Planalto "para se abrigar"

·                   Em sua defesa do STF, o governador afastado, Ibaneis Rocha, afirmou que houve "ato de sabotagem" por parte de sua equipe de segurança e citou, especificamente, "a deserção dos postos por parte de alguns policiais"

·                   Anderson Torres e o ex-chefe da PM, Fábio Augusto, tiveram a prisão decretada

O que falta esclarecer ou demonstrar?

·         Qual a responsabilidade de cada membro da cúpula de Segurança do DF no policiamento ineficaz?

·         Qual o papel do GSI, responsável por proteger o Palácio do Planalto com um grupo de militares?

·         Quais responsabilidades do governo federal e das Forças Armadas na falta de prevenção aos episódios e na demora para resolvê-los?

QUEM FINANCIOU

·                   As investigações da Polícia Federal e da Polícia Civil do Distrito Federal apontam que os atos terroristas foram bancados, em sua maior parte, por empresários. Em depoimentos, ao menos três golpistas presos afirmaram ter viajado a Brasília em ônibus fretados, sem qualquer custo. Uma professora de SP afirmou que a convocação foi feita num grupo de apoiadores do ex-presidente Bolsonaro

·                   Em depoimento, Gilvã Estrela da Silva contou ter recebido R$ 400 para sair de Salvador e ir protestar em Brasília. Ele disse ter ficado sabendo da caravana "porque vendia picolés em frente ao acampamento de Salvador"

·                   Mais de 100 ônibus nos dias anteriores aos atos. A polícia já identificou os donos dos veículos

·                   Alguns donos dos veículos que transportaram golpistas têm ligação com lideranças bolsonaristas. Um deles, o empresário Maurício Nogueira, concorreu a deputado estadual em SP e fez campanha com a deputada Carla Zambelli

O que falta esclarecer ou demonstrar?

·         As autoridades têm a lista dos donos de veículos para chegar a quem pagou por eles

·         Ao chegar a quem financiou os manifestantes, a polícia investigará se há ligações com lideranças políticas ou outros grupos

OS INFLUENCIADORES POLÍTICOS

·         O discurso de enfrentamento das instituições e contestação do sistema e do resultado das eleições por parte do ex-presidente Jair Bolsonaro e de seus aliados ajudou, na visão de autoridades, a criação de grupos dispostos a atos como os de domingo

·         Na noite de anteontem, Bolsonaro compartilhou um post no Facebook que contestava a eleição de Lula, intensificando o discurso mesmo após os atos golpistas

·         A Procuradoria-Geral da República pediu para abrir inquérito contra três deputados federais diplomados suspeitos de incitar os atos de terrorismo em posts nas redes sociais: André Fernandes (PL-CE), Clarissa Tércio (PP-PE) e Silvia Waiãpi (PL-AP)

O que falta esclarecer ou demonstrar?

·         Um dos desafios das investigações é demonstrar ligação direta entre líderes das manifestações com autoridades políticas

·         Para juristas, publicações nas redes sociais feitas por políticos ajudam a construir provas de incitação, mas, se isoladas, podem ser insuficientes para ligá-los a atos violentos

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