Futebol é a união entre disciplina e improvisação, prosa e poesia
Parafraseando o grande Ferreira Gullar, o
futebol-arte e o jogo bonito e bem jogado são essenciais porque o placar não
basta
Tostão/Folha
de S. Paulo
Antes de começar o Brasileirão, sempre dizem que é o mais equilibrado do
mundo. Como é frequente a igualdade técnica das equipes, as vitórias estão
muito próximas das derrotas. Por isso, alguns times podem ganhar e depois
perder vários jogos seguidos sem mudar o desempenho.
Quando isso acontece, surgem inúmeras explicações técnicas,
táticas, físicas, emocionais, mesmo se elas têm pouca ou nenhuma importância.
Comentaristas adoram achar pelos em ovo. Quem paga o pato é o treinador, com a
esperança de que o substituto traga a chave da vitória.
Após as seis primeiras rodadas do Brasileirão, que é muito
pouco para fazer análises definitivas, as surpresas positivas são Botafogo e
Cruzeiro, dirigidos pelos técnicos portugueses Luís Castro e Pepa. Os dois
times se parecem, pela intensidade, pela pressão para recuperar a bola e pela
velocidade das jogadas em direção ao gol.
Os treinadores portugueses são geralmente muito científicos e
pragmáticos. Além disso, dão boas explicações nas entrevistas. Contribuem para
melhorar a qualidade do futebol brasileiro.
Pepa, no Cruzeiro, e Dorival Júnior, no São Paulo,
contrariam o lugar-comum de que treinadores precisam de muito tempo para formar
um bom conjunto. Tempo é importante, mas também é a união de jogadores de
estilos diferentes que se completam e que têm características ideais para
realizar as estratégias dos treinadores.
América e Corinthians são as surpresas negativas no Brasileirão. O
América, último colocado, só tem um ponto. O time manteve o técnico, a maioria
dos jogadores e o estilo de jogo do ano passado, quando fez ótima campanha.
Será que o América tem feito partidas equilibradas e perdido nos detalhes, o
que aumentaria as chances de passar a ter várias vitórias seguidas?
Já no Corinthians há uma nítida razão, a troca frequente de
treinadores, para o time estar na zona de rebaixamento, mesmo com vários
jogadores de ótima qualidade. As redes sociais, apoiadas pela diretoria e por
outras opiniões, implicaram mais com os trejeitos e as roupas do técnico
Sylvinho e com a cara tensa de Fernando Lázaro nas entrevistas do que com as
atitudes e táticas dos dois jovens treinadores, que são muito bem preparados e
poderiam evoluir com a equipe.
Roger Machado, um treinador com ótimas ideias e posicionamentos
firmes, foi também preterido com a justificativa de que ainda não teve sucesso
na carreira, como se fosse fácil ser campeão em campeonatos tão equilibrados.
Luxemburgo é a esperança pelo seu passado vitorioso, como se tivesse a chave
das vitórias. Até agora, nada mudou. Nas entrevistas, Luxemburgo, como sempre, quer ser mais
esperto que a esperteza.
O São Paulo foi muito melhor que o Corinthians e só não venceu
por causa dos erros do árbitro. Diferentemente do que ocorria com o time
dirigido por Rogerio Ceni, que era apressado e confuso para chegar ao gol,
Dorival Júnior aproximou os jogadores no meio-campo, que trocaram mais passes e
envolveram o adversário.
Na média, os jogos no Brasil são intensos e com muita pressão
para recuperar a bola, o que é muito bom. Mas falta mais lucidez nas decisões e
acerto nos passes. O futebol é a união da disciplina tática e da improvisação,
do talento coletivo e do individual, do domínio da bola e do campo, da prosa e
da poesia. Parafraseando o grande poeta Ferreira Gullar, o futebol-arte e o jogo
bonito e bem jogado são essenciais porque o resultado não basta.
Também no
futebol o excesso cansa. E enjoa https://bit.ly/3yPARyY
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