29 maio 2024

Petrobras: para onde?

Momento difícil: novamente o ideológico predomina

A interferência ideológica e a busca por lucro imediato estão minando o papel estratégico da Petrobras e a eficácia das políticas econômicas nacionais
Abraham B. Sicsú/Vermelho


 

Preocupações aumentam. As mídias se posicionam, evidentemente com um tom derrotista e pessimista. O ente etéreo Mercado se posiciona. Catástrofe próxima, tudo está indo pelo caminho errado. Dois dos assuntos mais relevantes da economia permitem que profissionais de orientação ortodoxa ponham as manguinhas de fora. Petrobras e Selic.

No caso da Petrobras, considerações a fazer. Não tenho informações detalhadas sobre o processo de substituição da presidência e sua lógica, mas tenho sim posicionamento quanto ao viés que está sendo dado.

Leio na imprensa que é um absurdo a interferência governamental no direcionamento da empresa. Que é indébito, que a empresa deve ser gerida para dar o máximo de lucro possível e satisfazer a seus acionistas. E, com isso, o Estado teria seu quinhão de retorno para equilibrar as contas públicas, provavelmente para pagar juros da dívida seja o desejo implícito.

Discordo, para mim, é uma visão equivocada.

A Petrobras é uma empresa de capital aberto, verdade, mas com maioria de capital votante estatal. Nesse sentido, deve procurar o lucro, sem dúvida, para se capitalizar e atender os interesses dos acionistas. Mas, com o caráter estatal que possui, tem obrigação de verificar sua função social, os interesses da nação. Seja no que tange a investimentos em setores estratégicos de nossa economia, seja na geração de empregos, seja no suporte a segmentos fundamentais para cidadania, como cultura e esportes.

Poucos anos atrás, um dirigente do Porto Digital de Recife, procurou o Diretor responsável pela área de inovação na companhia, na tentativa de uma maior inserção das empresas locais do complexo nas compras da empresa.

Muito bem recebido teve a seguinte resposta. A Petrobras faz suas compras de produtos e serviços em concorrências internacionais, as escalas das ofertas das empresas nacionais pouco interessam aos nossos objetivos, os custos são altos, por isso, difícil que consigam ser fornecedoras da nossa empresa.

Uma resposta dessas, visando apenas os resultados financeiros, não me parece compatível com o caráter do acionista principal, o Estado. Fundamental que se exija compromisso com a estratégia de desenvolvimento nacional, com a consolidação de segmentos chave para o pensar futuro da nação. Além, de dar uma contribuição efetiva para o emprego qualificado e a empregabilidade no país. As compras governamentais, ou de empresas sob seu controle, são básicas para uma política industrial alicerçada em interesses da nação.

Muitos outros exemplos poderiam ser dados em outras áreas como, por exemplo, a de cultura em que a quase interrupção do apoio da empresa ao setor trouxe impactos comparados aos que a pandemia gerou.

A respeito da Selic, vejo nas manchetes, hoje, que “os economistas alertam para a impossibilidade de manter o ciclo de reduções”. Tecnicamente, difícil de justificar. A inflação controlada, a balança comercial no seu melhor mês, os investimentos ainda em patamar baixo, o crédito não explodiu.

Duas observações preliminares. A primeira é de generalizações. Ao se falar em Os economistas pretende-se dar a impressão de uma quase unanimidade. Melhor seria colocar os economistas ortodoxos.

Segundo, há um caráter ideológico na assertiva. Lembrar que a decisão da redução do patamar para 0,25%, tomada pelo Banco Central se baseou em uma votação em que cinco diretores, nomeados no Governo anterior, apoiaram e quatro, nomeados neste Governo divergiram, fazendo que , nitidamente, a posição vencedora representasse interesses políticos contrários à política que vem sendo assumida pelo Executivo.

Faz parte da luta político eleitoral, mas não tem nenhum fundamento técnico que a sustente de fato. Aliás, sempre se acharão argumentos, a posteriori, para justificar qualquer decisão política.

Neste cenário, o que se verifica é o predomínio da conjuntura política sobre a dinâmica econômica que procura ser consolidada a largo prazo. Pouco interesse se nota em estabelecer estratégias de desenvolvimento, muito se orienta pela busca de poder momentâneo, pela polarização que dificulta, em muito, avanços necessários.

Chegou a hora de não ser mais orientados pelo dito Mercado e pela ortodoxia que destrói a possibilidade de efetivos passos para um dinamismo que efetivamente beneficie a nação. Não é fácil.

Leia também: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2024/04/petrobras-para-quem.html

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