31 maio 2024

Trump condenado

Trump condenado: qual o impacto da sentença histórica na eleição?

Anthony Zurcher/BBC


 

A condenação criminal de Donald Trump traz um conjunto notável de novidades históricas, embora não torne o republicano inelegível.

Ele é o primeiro ex-presidente dos Estados Unidos a ser considerado culpado por um crime; ele também é o primeiro pré-candidato de um grande partido a se tornar um criminoso condenado.

A condenação inclui ainda uma nova aplicação de leis estaduais e federais sobre fraude e financiamento de campanha – no caso dele, envolvendo o pagamento secreto à ex-atriz pornô Stormy Daniels antes das eleições presidenciais de 2016.

Embora Trump provavelmente esteja planejando apresentar um recurso e aguarde uma sentença que poderá ir de uma multa pesada até mesmo a prisão – embora a detenção seja vista como improvável por especialistas –, não é cedo para considerar as possíveis consequências da condenação na vida política do republicano.

Fazer essa avaliação sobre o futuro pode não ser fácil, no entanto.

"Muitas vezes, olhamos para a história para encontrar alguma pista do que vai acontecer", diz Jeffrey Engel, diretor do Centro de História Presidencial da Universidade Metodista do Sul, nos EUA.

"Mas não há nada no passado que chegue sequer perto disso."

Trump garantiu a nomeação presidencial republicana durante as primárias no início deste ano e deverá liderar a chapa do partido quando a sigla realizar a sua convenção nacional, em julho.

As pesquisas indicam que ele está em um empate técnico com o presidente Joe Biden e mantém uma ligeira vantagem em muitos Estados que devem decidir a eleição.

Mas essas pesquisas também indicam que a condenação pode mudar tudo isso.

Nas pesquisas de boca de urna realizadas nas primárias republicanas, um percentual de eleitores na casa dos dois dígitos disse que não votaria no ex-presidente se ele fosse condenado por um crime.

Nas primárias de março na Carolina do Norte, 32% dos eleitores republicanos disseram que Trump não estaria apto à presidência se fosse condenado.

Uma pesquisa de abril realizada pela Ipsos e pela ABC News mostrou que 16% dos que apoiam Trump reconsiderariam o seu voto em tal situação.

Essas eram opiniões hipotéticas, no entanto.

O ex-presidente enfrenta outros três processos criminais – envolvendo as suas tentativas de anular as eleições presidenciais de 2020 e o tratamento de documentos confidenciais após deixar a Casa Branca.

Todos foram adiados indefinidamente, deixando o veredicto no caso Stormy Daniels como o único resultado certo este ano.

Doug Schoen, um pesquisador que trabalhou com o presidente democrata Bill Clinton e com o prefeito independente de Nova York, Michael Bloomberg, diz que os eleitores americanos podem ter sentimentos diferentes com base neste caso específico.

"O que os eleitores estarão pensando em novembro é na inflação, na fronteira ao sul, na concorrência com a China e a Rússia e no dinheiro que está sendo gasto em Israel e na Ucrânia."

Ele acrescenta que esta condenação, por tratar de acontecimentos ocorridos há oito anos, não terá o mesmo impacto político que o tipo de condenação que os eleitores podem ter imaginado quando foram entrevistados no início deste ano.

Mesmo uma ligeira queda no apoio a Trump, no entanto, pode ser suficiente para fazer diferença no tipo de corrida apertada que esta disputa presidencial está se desenhando para ser.

Se alguns milhares de eleitores que, sem uma condenação, poderiam apoiar o ex-presidente, ficarem em casa, num Estado-chave como o Wisconsin ou a Pensilvânia, isso poderia fazer toda a diferença.

"Acho que isso terá um impacto e o prejudicará como candidato", diz Ariel Hill-Davis, cofundadora do Mulheres Republicanas pelo Progresso, um grupo que tem procurado afastar o partido de Trump.

Ela diz que os eleitores mais jovens, aqueles com formação universitária e que vivem nos subúrbios estão preocupados com o comportamento de Trump e a sua postura ao governar.

"Esses eleitores estão realmente hesitantes em voltar a alinhar-se com o Partido Republicano liderado por Donald Trump", diz ela.

"O veredicto de culpado reforçará ainda mais essas preocupações."

O partido de Trump manteve-se em grande parte ao seu lado durante dois pedidos de impeachment e o fim caótico da sua presidência, quando o Capitólio foi atacado por uma multidão de seus apoiadores.

Nada disso impediu o ex-presidente de renascer politicamente e chegar a uma posição competitiva para reconquistar a Casa Branca em novembro.

"O apoio contínuo a Trump, apesar do tipo de escândalo que teria afundado literalmente qualquer outro candidato anterior na história americana, é verdadeiramente surpreendente", diz Engel.

A condenação histórica desta quinta-feira pode revelar-se diferente – especialmente se os recursos de Trump falharem e ele enfrentar a perspectiva de prisão.

Ou poderá ser apenas o mais recente de uma longa série de acontecimentos aparentemente conturbados que, em retrospectiva, foram apenas obstáculos no caminho de Trump para o poder.

Allan Lichtman, professor da American University, construiu um modelo político que previu com sucesso o vencedor de todas as corridas presidenciais desde 1984.

Ele admite, no entanto, que a condenação de Trump pode ser o tipo de reviravolta "cataclísmica e sem precedentes" que abala o modelo e muda o curso da história.

"Os livros de história registrarão isto como um acontecimento verdadeiramente extraordinário e sem precedentes, mas muito vai depender do que acontecer depois", diz ele.

O julgamento final sobre a importância da condenação de Trump chegará às mãos dos eleitores em novembro. Se o ex-presidente for derrotado, seu veredicto de culpa provavelmente será visto como uma das razões.

Se ele vencer, poderá tornar-se apenas uma nota de rodapé na tumultuada mas bem-sucedida carreira política de Trump.

"A história é escrita pelos vencedores, como todos sabemos", diz Engel.

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