Seis perguntas sem resposta sobre a negociação de Cid para vender Rolex recebido em viagem oficial por R$ 300 mil
Polícia Federal vai investigar o conteúdo de e-mails nos quais o ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro tenta comercializar o item
O Globo
Preso desde maio sob acusação de participar de um esquema de fraudes em cartões de vacinação contra a Covid-19 e acusado de participar de diálogos de cunho golpista, o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), tornou-se alvo de mais uma suspeita. Como o GLOBO revelou nesta sexta-feira, a CPMI do 8 de janeiro analisa e-mails em que o militar aparece negociando um relógio da marca Rolex recebido durante uma viagem oficial.
A Polícia Federal já anunciou que vai investigar o conteúdo das mensagens no âmbito de um inquérito que apura o recebimento de joias por uma comitiva do governo Bolsonaro na Arábia Saudita. Além disso, o deputado Rogério Correia (PT-MG) fez um requerimento para convocar Maria Farani Rodrigues — ex-assessora da Presidência na gestão de Bolsonaro que aparece conversando com Cid nos e-mails — a depor na CPMI. As movimentações das autoridades podem ajudar a esclarecer uma série de dúvidas que pairam sobre o caso.
Para quem Cid pretendia vender o relógio?
De acordo com o material em posse da comissão, em 6 de junho de 2022, Cid recebeu um e-mail em inglês de uma interlocutora. “Obrigado pelo interesse em vender seu Rolex. Tentei falar por telefone, mas não consegui", disse ela. “Quanto você espera receber por ele? O mercado de Rolex usados está em baixa, especialmente para os relógios cravejados de platina e diamante, já que o valor é tão alto. Eu só quero ter certeza de que estamos na mesma linha antes de fazermos tanta pesquisa", escreveu.
Já se sabe, no entanto, que a conversa era com Maria Farani Rodrigues, que contou ter apenas intermediado os contatos do militar com outros interlocutores, a quem diz desconhecer. Ela é ex-assessora da Presidência durante a gestão de Jair Bolsonaro e, até junho deste ano, trabalhava no gabinete da senadora Damares Alves (Republicanos-DF), integrante titular da CPMI do 8 de Janeiro. Fica, portanto, a dúvida: se Farani não era o contato final, para quem Mauro Cid pretendia vender o relógio?
Por que Cid pediu ajuda da assessora?
Farani conta que às vezes ajudava Mauro Cid a escrever correspondências em inglês. Em uma outra troca de e-mails, por exemplo, ela chegou a auxiliá-lo a redigir uma carta para uma escola norte-americana. Contudo, ainda de acordo com a servidora, o pedido sobre o Rolex foi o único feito pelo então ajudante de ordens de Bolsonaro envolvendo a venda de um objeto. Por que o militar tratou com a assessora sobre essa transação específica? Ele estava agindo por conta própria ou por ordem de outros personagens? São questionamentos que ainda precisarão ser esclarecidos.
Por que a troca de e-mails aconteceu em inglês?
Por nota, Farani explicou que "a pedido de Mauro Cid, por falar inglês, realizei uma pesquisa na internet para identificar possíveis compradores de relógio". O texto continua: "Apenas enviei os e-mails e, ao receber respostas, retransmiti ao endereço eletrônico de Mauro Cid". As razões que levaram o militar a buscar compradores que falassem especificamente inglês não estão claras.
O Rolex é o mesmo recebido por Bolsonaro na viagem à Arábia Saudita?
Em outubro de 2019, durante uma visita à Arábia Saudita, o então presidente Jair Bolsonaro recebeu um conjunto de joias, composto por um Rolex, um anel, uma caneta e um rosário islâmico, do rei Salman bin Abdulaziz Al Saud. Em 6 de junho de 2022, mesma data do e-mail em que Mauro Cid negocia um relógio, o Rolex recebido por Bolsonaro foi encaminhado para o gabinete da Presidência da República, segundo documentos que estão em posse da CPMI. O Gabinete Adjunto de Documentação Histórica da Presidência, que cuida do acervo, recebeu o relógio em 27 de março de 2020.
O item de luxo foi devolvido pela defesa de Bolsonaro em abril deste ano, após a Polícia Federal instaurar uma investigação para apurar outro conjunto de joias da Arábia Saudita, avaliado em R$ 5 milhões, retido pela Receita Federal no Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP), conforme revelou o jornal O Estado de S. Paulo. O ex-presidente nega qualquer irregularidade.
O Rolex foi vendido de fato?
A assessora da Presidência também declara que não teve conhecimento "do desfecho de uma eventual negociação". Nas mensagens encaminhadas por ela, o interlocutor desconhecido chega a afirmar que "o mercado de Rolex usados está em baixa", em virtude do "valor tão alto". Não se sabe, até o momento, se Cid, apesar das dificuldades, conseguiu concluir a transação.
O que Cid tem a dizer sobre as novas suspeitas?
Procurada pela imprensa, a defesa de Mauro Cid vem afirmando que não teve acesso aos e-mails em posse da CPMI do 8 de janeiro e que, em virtude disso, não irá se manifestar. Assim, não é possível saber, por ora, a versão do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro sobre as tratativas para venda do Rolex.
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