24 setembro 2025

Walter Sorrentino opina

Indignação nas ruas e o novo cenário de disputa
Mobilizações deste domingo (22) contra anistia e blindagem no Congresso mostram que a força do campo popular não se limita à pauta institucional. O mal-estar social amplia a disputa e exige respostas concretas às demandas da população
Walter Sorrentino/Portal Grabois www.grabois.org.br   

O fato novo deste fim de semana é a retomada de vigor nas ruas pelo campo popular e progressista. No dia 7 de setembro, em São Paulo, a manifestação registrava mais uma vez a presença da velha guarda militante, aguerrida e generosa. Eram alguns poucos milhares, mas estavam lá, aplicando as lições de décadas de luta contra a ditadura: coerência, persistência e combatividade.

Duas semanas depois, neste domingo (21), a manifestação extravasou. Desta vez, a maioria era de jovens na Avenida Paulista. Desde as estações de metrô já se entoava espontaneamente “Sem Anistia!”. Na avenida, sem alto-falantes — e sem conseguir acompanhar as falas do único carro de som —, dezenas de milhares de ativistas não arredaram pé, nem mesmo com as primeiras chuvas da primavera.

Houve, em primeiro lugar, o sentimento de vitória pela condenação dos golpistas pelo STF no já histórico 11 de setembro. Um fato que altera efetivamente o jogo da disputa no país sob a bandeira do fim da impunidade, que acabou se associando com a da soberania nacional aviltada pelo consórcio Trump-Bolsonaro.

Mas houve também o estopim da indignação política com o cambalacho da Câmara dos Deputados de pautar a urgência da “anistia” para os condenados pelo golpe. Deram como moeda de troca a PEC da blindagem dos parlamentares e o voto secreto para decidir se podem ser processados, abrindo um novo ciclo de impunidade para crimes praticados por representantes eleitos e convidando o crime organizado a se fortalecer no aparelho de Estado.

A indignação política é um combustível poderoso para as ruas e as redes. Desde os ensaios de 2013, ela esteve sob o impulso da farsa da “antipolítica”. Agora retorna ao seu endereço oficial: o campo das lutas dos trabalhadores e do povo. Isso indica que a sociedade não está anestesiada — e que a esperteza, quando é muita, acaba devorando o dono, como pode acontecer com Hugo Motta, presidente da Câmara dos Deputados.

Esse é o dado relevante: um novo cenário de disputa. Reitera-se o aprendizado histórico: não há como superar a atual situação do Brasil, sob o ataque neofascista de Trump, associado ao bolsonarismo, contra as instituições democráticas e a soberania nacional, sem a pressão social nas ruas e nas redes. Nem com a força apenas de governos progressistas e do STF.

Das ruas à disputa institucional: a força da indignação popular

Entende-se então que essa não é uma luta exclusiva no palco da política institucional. O que explica o comportamento da sociedade não é só a polarização política, mas também o profundo mal-estar social que atinge extensas camadas da população. São dois fenômenos associados, ainda que não perfeitamente alinhados nos mesmos blocos sociais, que criam um desarranjo profundo, afetam a sociabilidade e dificultam a mobilização.

Quando as pessoas “não sabem para onde estão indo”, imersas em uma situação social precária e sem mobilidade ascendente, ficam sem horizonte e impotentes. Nem mesmo os evidentes bons índices econômicos e sociais do governo conquistam apoio majoritário. É isso, e não apenas a polarização, que explica as pesquisas.

Bem vistas as coisas, vive-se uma crise política e institucional latente no país — um obstáculo poderoso ao desenvolvimento e à melhoria da vida das pessoas. Para superá-la progressivamente e impedir que se transforme na farsa neofascista da antipolítica, é preciso ter um olho no peixe e outro no gato. É preciso despertar a indignação política também quanto às exigências de melhores condições de vida, transformá-la em força de reivindicação junto ao Congresso e ao governo, impulsionando-o com autonomia.

Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Walter Sorrentino é presidente da Fundação Maurício Grabois e vice-presidente nacional do PCdoB.

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