Cessar-fogo em Gaza: conheça cronograma já estipulado e aspectos pendentes
Algumas medidas foram colocadas em prática já nesta sexta-feira; administração e reconstrução do território ainda estão em disputa
Victor Farinelli/Opera Mundi
O acordo de cessar-fogo na Faixa de Gaza entrou em vigor nesta sexta-feira (10/10), após sua aprovação pelo Parlamento israelense e um dia depois de ser assinado por representantes de Israel, do grupo de resistência palestino Hamas e dos três países pelos mediadores: Catar, Egito e Estados Unidos.
O documento contém 20 pontos cruciais e sendo que o primeiro deles é a preparação para a retirada das tropas israelenses do território palestino.
Segundo o acordo, Israel deve dar início à retirada das suas tropas em um prazo de 24 horas, que começou a ser contado ao meio dia desta sexta (pela hora local), mas não se tratará de uma retirada completa, e sim parcial.
Os soldados deverão liberar cerca de metade das áreas urbanas do enclave, mas vai manter sua presença na outra metade, apesar de se comprometer com deixar também esses outros locais em futuro ainda não estipulado.
Intercâmbio de prisioneiros
Outro ponto importante do acordo é o do intercâmbio de prisioneiros, entre os pouco mais de 48 israelenses que ainda estão sob custódia do Hamas desde outubro de 2023 [20 deles vivos, os demais mortos] e os mais de 2 mil palestinos encarcerados, que Israel prometeu libertar neste processo de paz [250 deles condenados a prisão perpétua no país].
Segundo o acordo, a troca de prisioneiros deve acontecer dentro de 72 horas após a conclusão da “etapa de redistribuição militar”, ou seja, da retirada parcial das tropas israelenses.
Em comunicado, o Hamas afirmou que precisará de mais tempo para a recuperação de todos os corpos dos reféns mortos, já que não haveria a informação exata de todos os locais onde eles foram sepultados.
Por sua parte, Israel se comprometeu a libertar 250 palestinos condenados a prisão perpétua, além de 1,7 mil pessoas detidas durante o genocídio iniciado em outubro de 2023 [dos quais 22 seriam menores de idade]. Também seriam devolvidos os corpos de 360 combatentes do Hamas.
No caso dos libertados com condenação a prisão perpétua, alguns deles serão levados de volta à Faixa de Gaza, outros serão deportados e proibidos de retornar aos territórios palestinos ou a Israel.
Contudo, há uma polêmica de última hora no caso desses prisioneiros palestinos, a partir da exclusão de Marwan Barghouti da lista de possíveis libertados.
Considerado o preso político mais importante da Palestina, Barghouti está encarcerado desde 2002, sentenciado a 40 anos e cinco penas perpétua. Ele é o maior representante do projeto de unificação dos partidos palestinos, razão pela qual é considerado um líder político que poderia fortalecer a luta pelo reconhecimento do Estado da Palestina.
Reabastecimento de Gaza
Outro ponto do acordo que entra em vigor já nesta sexta-feira é o do reingresso da ajuda humanitária em Gaza, com a entrada da primeira leva de entre 400 e 600 caminhões diários trazendo água potável, comida, combustíveis e outros produtos de primeira necessidade para o território.
Também será concedida a autorização para a entrada de voluntários de organizações que prestam ajuda aos refugiados palestinos, algumas das quais haviam sido barradas por Israel durante o genocídio – acusadas de suposta colaboração com o Hamas.
Outra medida adotada por Israel foi a abertura da passagem de Rafah, no sul de Gaza, para que os palestinos pudessem cruzar a fronteira com o Egito – embora mantendo um controle migratório sujeito à aprovação de oficiais de Israel e observadores enviados pela União Europeia.
A abertura também permitirá o retorno de palestinos do Egito a Gaza pela mesma passagem, mediante as mesmas autorizações de funcionários israelenses e observadores europeus.
Dúvidas reconstrução e administração do enclave
Apesar de haver aparente concordância entra as partes no conteúdo e no cronograma nos pontos já mencionados, alguns outros temas permanecem sem maiores esclarecimentos sobre como seriam implementados.
Um deles tem relação com a administração interina que será imposta em Gaza. O texto estabelece que ela será exercida por uma junta conformada por técnicos e diplomatas internacionais e também por figuras palestinas. Contudo, ainda não há certezas sobre qual será o critério de seleção dos estrangeiros, e no caso dos palestinos está proibida apenas a indicação de figuras ligadas ao Hamas.
O plano de paz também promete que a administração interina terá como missão entregar o poder na Faixa de Gaza à Autoridade Nacional Palestina (ANP), entidade que governa a Cisjordânia e que é liderada desde 2008 por Mahmoud Abbas. Porém, não há uma data ou uma estimativa de quando essa transição seria concretizada.
Também foi cogitado o nome do ex-premiê britânico Tony Blair (1997-2007) como possível líder da junta de administração interina, mas a informação não foi confirmada até o momento.
Outro tema sobre o qual há incertezas é sobre as empresas que serão responsáveis pela reconstrução das casas e edifícios do território. Isso porque, no primeiro semestre deste ano, o presidente Donald Trump fez alusões a um projeto de transformar o enclave em um resort para atrair o turismo de alto luxo para a região.
A promessa tem gerado críticas até hoje, e a partir do plano de paz que se transformou no acordo assinado nesta quinta-feira (09/10), essas críticas se converteram em dúvidas sobre se a administração interina que será imposta ao território trabalhará de acordo aos interesses da população palestina que espera recuperar suas casas destruídas ou dos empresários que fazem lobby para tornar real o projeto do resort de luxo no enclave.
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