A CONTA CHEGOU PARA BOLSONARO
Avaliação positiva do governo cai oito pontos em uma semana e presidente bate recorde de desaprovação, segundo pesquisa inédita do Ideia Big Data
JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO, REVISTA PIAUI
Demorou. Foi preciso ele demitir os dois ministros mais populares do governo, admitir usar a Polícia Federal em causa própria e desprezar milhares de mortes por Covid-19. Após muito tentar, Jair Bolsonaro conseguiu perder oito pontos de popularidade em uma semana, voltar à menor taxa de ótimo e bom de seu governo e bater o recorde de avaliações negativas desde a posse: 41%. Mesmo assim, o governo ainda mantém 28% de avaliações positivas e 35% de confiança. O presidente, porém, está pior do que isso.
O tombo foi grande. Bolsonaro não apenas fez romper pela primeira vez o patamar dos 40 pontos de ruim e péssimo de sua gestão como conseguiu outro feito inédito. A avaliação negativa do governo superou a positiva por 13 pontos, muito além dos 4 pontos de margem de erro da pesquisa. Se, num extremo, o governo mantém uma linha de resistência em torno de 28% dos que o apoiam, na outra ponta, ganhou uma oposição maior e mais intensa – como nunca teve. Dos 41% de avaliação negativa, 25 pontos agora são de “péssimo” e 16% de “ruim”. Apenas uma semana antes essas taxas eram respectivamente 19% e 15%. Ou seja, a turma do “péssimo” cresceu tanto que quase se equivale à soma dos que avaliam o governo como ótimo ou bom.
Os números são da pesquisa Ideia Big Data realizada entre 28 e 29 de abril. Por intermédio de um aplicativo de celular, o instituto fez 1.609 entrevistas ponderadas para representarem as mesmas proporções de idade, gênero, escolaridade, classe social e divisão regional da população brasileira de 18 anos ou mais. A margem de erro máxima é de quatro pontos percentuais, para mais ou para menos. O método usado para coleta não é tão testado quanto o das pesquisas face a face, nas quais entrevistadores abordam aleatoriamente entrevistados em casa ou em pontos de fluxo, mas a pesquisa do Ideia é a única que acompanha semanalmente a avaliação do governo desde 2019 e é divulgada com regularidade. A longa série histórica e a alta frequência com que é feita permitem acompanhar os vaivéns da popularidade de Bolsonaro como nenhuma outra pesquisa publicada até agora.
O salto de impopularidade ocorreu de uma vez mas não foi surpresa. Bolsonaro construiu o aumento de sua rejeição live a live, tuíte a tuíte, entrevista a entrevista. Brigou com governadores, fritou Mandetta, humilhou Moro. Desrespeitou a Constituição, provocou o Congresso, atacou o Supremo. Acumulou tensão na opinião pública diariamente. Os grãos de animosidade se acumularam ao ponto de uma parte significativa de seus simpatizantes não conseguir mais aprovar suas atitudes. Ao forçar a demissão de Sergio Moro do Ministério da Justiça, o presidente desencadeou a avalanche vista esta semana, mas as causas para sua aprovação rolar ladeira abaixo se somam há tempos.
A ladeira é igualmente íngreme mesmo quando a pergunta se refere ao presidente: “Aprova ou desaprova a maneira como Jair Bolsonaro está lidando com seu trabalho como presidente?” O time dos que aprovam a figura presidencial em si encolheu os mesmos oito pontos, foi de 30% para 22%. Ou seja, há menos brasileiros de acordo com as atitudes do presidente (22%) do que os que consideram seu governo ótimo ou bom (28%). Esse descolamento entre as duas taxas vai para a conta pessoal de Bolsonaro. Ele é pior do que seu governo para ao menos um quinto dos que acham que o ministério faz algo de bom ou ótimo.
Nem sempre foi assim. Em fevereiro do ano passado, logo depois da posse, 45% aprovavam o presidente e 44% achavam o governo bom ou ótimo. Em junho do mesmo ano, ambas as taxas eram de 36%. A partir dali, porém, as curvas se emanciparam e seguiram caminhos distintos. A aprovação pessoal do presidente caiu a 30% em agosto de 2019 e nunca mais ficou acima disso. Em novembro passado, a taxa de ótimo e bom do governo teve um pico de 40%, mas a aprovação de Bolsonaro manteve-se em 30%. Os 10 pontos de diferença eram pessoas que aprovavam o que o governo fazia mas não o presidente. Aturavam-no.
Pode-se especular que esse grupo acreditava que Bolsonaro poderia ser tutelado por Paulo Guedes na economia, por Moro na segurança e pelos militares em tudo o mais. Agora, parte do grupo caiu na real. A diferença entre as avaliações positiva do governo e do presidente diminuiu de 10 para 6 pontos: 28% contra 22%. Significa que menos gente crê que Bolsonaro seja passível de tutela. Significa também que as atitudes presidenciais são cada vez menos aceitáveis mesmo entre seus apoiadores. O presidente contamina a popularidade do governo como um vírus contra o qual não há ministro que consiga desenvolver anticorpos. Tampouco há remédio ou vacina à vista.
A resultante da deterioração da popularidade do presidente e de sua equipe é que 58% dos brasileiros passaram a declarar que não mais confiam no governo Bolsonaro – um crescimento de 7 pontos em comparação com a semana anterior. É outro recorde negativo deflagrado pela ejeção de Moro do ministério.
Na manhã de sábado, manifestantes antipetistas voltaram a promover atos em frente à sede da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, onde Moro prestaria depoimento a respeito das acusações que fez contra Bolsonaro quando deixou o governo. Dois grupos que até poucos dias atrás se confraternizavam agora racharam: de um lado, defensores de Bolsonaro gritavam “Mito! Mito!“; de outro, apoiadores da Lava Jato respondiam em coro com “Moro! Moro!“.
Trata-se do fim de Bolsonaro? A acusação de Moro de que o presidente serviu-se do cargo para interferir em investigações da Polícia Federal é sua pá de cal? Ainda não.
Nas classes D e E, o desapontamento com o governo Bolsonaro aumentou bem menos do que nas classes A e B. Entre os brasileiros com menor poder de consumo, a taxa de ruim e péssimo cresceu apenas de 31% para 35%. No topo da pirâmide socioeconômica, a desaprovação disparou de 36% para 47%. É um movimento mais parecido com o que aconteceu com as pessoas da classe C – a maior de todas –, entre as quais o ruim e péssimo pulou de 34% para 42%. Ou seja, o anúncio dos R$ 600 de auxílio para quem mais precisa pode comprar alguma popularidade para o governo pelos três meses enquanto o dinheiro for distribuído. Mas e depois?
À medida que a crise econômica se aprofundar, o bolso esvaziado dos pobres será o maior obstáculo para Bolsonaro sustentar o que lhe resta de apoio na opinião pública. O presidente se segura no público evangélico, mas várias igrejas neopentecostais começam a enfrentar problemas financeiros por causa dos cultos esvaziados durante a quarentena. Sem dízimo, falta dinheiro para bispos e pastores pagarem pelos horários que alugam nas emissoras de tevê. Se eles perderem influência entre os fiéis, Bolsonaro tende a perder apoio também nesse público religioso e pobre.
Tudo isso ocorre em meio ao crescimento geométrico de casos de Covid-19 e ao aumento contínuo do número de mortes diárias provocadas pela doença que o presidente desdenhou. Se o presente é ruim para Bolsonaro, o futuro próximo tende a ser pior. Mas não só para ele. Colaborou Felippe Aníbal
Fique sabendo https://bit.ly/2Yt4W6l
Leia mais https://bit.ly/2Jl5xwF
Nenhum comentário:
Postar um comentário