Não é sobre o SUS
O conceito de saúde plena é insustentável no Brasil. O SUS é essencial em meio às carências básicas e deve ser valorizado como um direito de cidadania e conquista social.
Melka Pinto/Vermelho
O conceito de saúde como um completo bem-estar físico, mental e social é insustentável e inalcançável. As pessoas têm muitos problemas, a maioria das pessoas, pelo menos do nosso país, jamais alcançará a saúde tendo como pressuposto “um combo” de saúde física, mental e social, porque a maioria das pessoas do nosso país não tem a garantia de acesso ao suprimento de necessidades humanas básicas, como por exemplo, alimentação.
Alimentação de qualidade, moradia digna, saneamento básico, renda, acesso à educação, lazer e esportes é o mínimo que a maioria das pessoas do nosso país sonha em desfrutar plenamente. Ninguém quer morar em palafitas ou em barreiras. Todo mundo quer pelo menos três refeições ao dia, comer carnes, frutas, legumes e verduras. Não tem quem não queira viver em um ambiente com água encanada e potável, sistema de esgoto, um ambiente saudável. As pessoas de todas as idades, se tiverem oportunidade, querem aprender, ter acesso ao ensino formal e profissionalizante. Quem não quer jogar bola numa quadra ou aprender a nadar numa piscina? Ou ir para um show com amigos e com o namorado, marido?
A maioria das pessoas do nosso país não tem nada disso. A maioria das pessoas do nosso país vivem em condições subumanas, sem dignidade e falta o básico. E essas pessoas que não tem o básico, adoecem, o adoecimento físico e mental das pessoas é resultado dessas faltas. Quando essas pessoas estão doentes, elas procuram os serviços de saúde e a saúde acaba pagando a conta de tantas faltas, de tantas iniquidades. O perfil de saúde e doença das populações é fruto das determinações sociais em que esses sujeitos estão inseridos: prevalecem as doenças crônicas como diabetes e hipertensão, aumenta-se o uso e dependência de psicotrópicos pelas pessoas devido ao adoecimento mental, entre outros.
Os problemas de saúde das pessoas, na verdade, não são necessariamente problemas da saúde, e o Sistema Único de Saúde (SUS) nunca vai dar conta de resolver esses problemas. Mas apesar disso e em meio a tantas faltas, as pessoas podem sempre contar com o SUS, às vezes com dificuldades, às vezes não do jeito que gostariam. Mas elas têm o SUS e qualquer usuário, seja ele morador de palafita, analfabeto, sem trabalho formal, não importa a condição desse sujeito, ele tem direito de ser atendido, escutado, orientado e ter suas queixas minimamente resolvidas em qualquer serviço público de saúde do nosso país.
O SUS é definitivamente contra-hegemônico, ele chega a ser subversivo e particularmente, me emociona.
Eu queria que as pessoas descontruíssem a representação social que a maioria delas tem do SUS como algo negativo, insuficiente e ruim. E entendessem de uma vez por todas que, num país como o nosso em que usufruir de acessos básicos com qualidade ainda é um sonho, o SUS resiste, o SUS resolve, o SUS faz malabarismos para dar conta do que deveria ser resolvido através de outros setores, outros investimentos.
As pessoas precisam de uma vez por todas reconhecer o SUS como um lugar de direito, de cidadania, de conquista.
Ainda temos um longo caminho pela frente não apenas para fortalecer e melhorar o SUS, mas para garantir a saúde, a qualidade de vida e a felicidade das pessoas. E uma coisa é certa, se fomos capazes de construir um Sistema Único de Saúde para milhões de brasileiros e brasileiras, isso quer dizer que é possível também lutar para que os outros acessos um dia sejam universais, integrais, integrados e equitativos como o SUS, pois ele tem muito a nos ensinar!
Leia também: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2024/05/clima-sem-controle.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário