18 outubro 2025

Uma cronica de Ruy Castro

Hora de descancelar Carlitos
Mostra integral de Chaplin no CCBB de São Paulo não tem uma sessão perdível. Hollywood o enxotou como comunista; mas, se os críticos o esquecem, é mentira que cinema seja uma arte
Ruy Castro/Folha de S Paulo  

Imagine um homem que, por metade do século 20, foi um dos três ou quatro gênios de seu tempo –os outros, FreudEinstein, talvez Picasso— e, aos poucos, foi sendo esquecido até se tornar quase ignorado. O artista é Charles Chaplin, criador de Carlitos e de tantos momentos nos filmes que realizou, de 1914 até 1952, e que por si justificariam a invenção do cinema.

A enquete mundial da revista inglesa Sight & Sound sobre os maiores filmes da história, feita a cada dez anos, é significativa. Na primeira, em 1952, Chaplin teve dois filmes empatados em 2º lugar, "Luzes da Cidade" (1931) e "Em Busca do Ouro" (1925), e outros quatro nos 100 mais: "O Garoto" (1921), "Tempos Modernos" (1936), "O Grande Ditador" (1940) e "Monsieur Verdoux" (1947). Isso refletia sua importância para a arte e até para o entendimento do homem num mundo novo e hostil. Humanistas, marxistas, psicanalistas, poetas e teólogos o estudavam. Mas, nas enquetes seguintes, seus filmes foram perdendo terreno. Na última, de 2022, "Luzes da Cidade" estava em 36º lugar, Tempos Modernos", em 81º, e os outros se evaporaram.

Daí a importância da "Mostra Chaplin" que o CCBB está levando em São Paulo até 2 de novembro. Inclui todos os 83 filmes de Chaplin, com as obras-primas entre os curtas, como "À Uma da Madrugada" e "Casa de Penhores" (1916), "Rua da Paz" e "O Imigrante" (1917), "Os Clássicos Vadios" (1921), "Pastor de Almas" (1923) e muitos mais, como complemento dos imortais médias e longas. Não há sessão perdível na mostra.

Chaplin foi um pioneiro do cancelamento. Nos anos 1950, o macartismo o enxotou como comunista e porque, britânico de nascimento, nunca se tornara cidadão americano. Ele marchou para a Suíça e só voltou aos EUA 20 anos depois, para receber um Oscar honorário que não pedira. Mas os críticos já o haviam abandonado como criador. Por quê? Seus filmes tinham ficado superados?

Se não gostam de Chaplin, tudo bem. Mas, se Carlitos for cancelado, é mentira que o cinema seja uma arte.

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