30 dezembro 2021

Crônica da quinta-feira

Minha máquina do tempo

Luciano Siqueira

 

Todos nós, conscientemente ou não, conservamos na alma uma máquina do tempo.

Alguns a fazem tão eficiente que escrevem memórias. Outros se dedicam a um futurismo pretensamente científico.

Nós outros simples mortais pomos a própria máquina em funcionamento toda vez que, de caso pensado ou não, sentimos a necessidade de raciocinar e agir considerando referências do passado.

Em tempo longínquo ou recente.

Um artifício que nos possibilita um critério de referência para a tomada de novas decisões.

Quando o ano está prestes a se encerrar, infernal é o barulho de máquinas de tempo aos bilhões espalhadas pela face da Terra. É a compulsão coletiva por prever o que o futuro nos reserva – mesmo ao presidiário alojado no corredor da morte de algum presídio norte-americano ou asiático.

Uma situação dramática e tensa, como vemos nos filmes.

Minha máquina pessoal tem um departamento público – que me leva a compartilhar com minha audiência particular, que nem é tão grande assim, análises conjunturais e outras tantas, acerca dos destinos da sociedade em que nos achamos entrincheirados.

O outro departamento, estritamente privado, se faz num misto de experiência real, passada ou presente, e desejos e expectativas pessoais.

Esse segundo departamento, digamos assim, o mantenho como território livre para o sonho, o desejo ou a simples e inconsequente especulação.

Território do desconhecido, via de regra da surpresa.

Gosto de ser surpreendido. Produz uma agradável sensação de vida livre, pronta para o que der e vier.

Desde meados do século 19 e, sobretudo nos últimos trinta anos, tanto já se explorou em tendências e possibilidades acerca do mundo mineral e da sociedade humana, que há quem afirme (ilusoriamente, creio) que nos tempos que correm tudo é previsível.

(Nem tanto. O imprevisível acaso muitas vezes muda o curso da História.)

Questão de dados razoavelmente confiáveis e de projeções matemáticas. Ou dialéticas?

Tudo isso devidamente anotado e tido como próprio da condição humana, permito-me algumas horas de puro devaneio, bem acomodado numa rede na varanda da casa onde nos reunimos para o réveillon, antecipado por alguns dias de democrática irresponsabilidade.

Ou seja, longe dos problemas o quanto possível e livre para sonhar.

Afinal, o sonho nos impulsiona à luta e imprime à existência cotidiana uma aura de vida renovada.

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Veja: imagens expressam a visão de mundo de quem as retém https://bit.ly/3E95Juz

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