Meio ambiente e sustentabilidade: os desafios do poder
público
INSID Magazine
A
INSID Magazine traz nesta edição a entrevista com José Antônio Bertotti Júnior,
Secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Pernambuco. Bertotti comenta
nesta entrevista um pouco sobre sua trajetória política e acadêmica e sobre os
desafios nos processos decisórios do setor público, em especial nas políticas
envolvendo questões ambientais para os próximos anos.
Faça um breve resumo da
sua formação e da sua carreira
Sou
José Bertotti, nascido em Caxias do Sul (RS), nas Serras Gaúchas. Sou graduado
em Química Industrial pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS) e
mestre em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE). Atualmente, estou fazendo o doutorado profissional em Engenharia de
Produção, também pela UFPE.
Em
1997 eu passei a morar no Recife e militar politicamente na região. Em 2008
assumi o comando da Secretaria Municipal da Assistência Social e na sequência a
Secretaria de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico da Prefeitura do
Recife. Em 2013 assumi a Secretaria Executiva de Ciência e Tecnologia de
Pernambuco. Nesse período à frente desta Secretaria, eu me titulei mestre em
Engenharia de Produção pela UFPE. Entre 2015 e 2016, eu saí da administração
estadual para coordenar a representação regional do Ministério da Ciência,
Tecnologia e Inovação no Nordeste.
Em
janeiro de 2019, aceitei um novo desafio proposto pelo governador de
Pernambuco, Paulo Câmara: comandar a Secretaria
de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas). Desde então, venho imprimindo
uma forte marca na estruturação das políticas climáticas do Estado, na criação
de novas Unidades de Conservação, na defesa do patrimônio natural dos
pernambucanos, na ampliação dos espaços de participação da sociedade civil e no
desenvolvimento econômico do Estado em bases sustentáveis.
Você pode nos falar um
pouco sobre as pesquisas que você desenvolveu na temática de Sistema de
Informação e Decisão?
A
primeira pesquisa que eu tive a oportunidade de trabalhar no tema de sistema de
informação e apoio a decisão, foi quando iniciei meu trabalho de mestrado onde
propus um modelo para a estruturação de um sistema estadual de parques
tecnológicos. Não foi estruturada formalmente como política pública do sistema
estadual, mas na prática o Governo do Estado de Pernambuco articulou a
academia, o setor produtivo e as nossas universidades, direcionando políticas
públicas apoiadas nesses ambientes, que são os chamados parques tecnológicos.
Uma
outra pesquisa que foi desenvolvida também dentro da academia, sob orientação
do professor Abraham Sicsú, foi o estudo do nível de inovação tecnológico dos
países, focando na necessidade da constituição de um ranking de inovação que
pudesse levar em consideração os países e a comparação entre o nível de
maturidade dessa inovação, e que não levasse em consideração somente o volume
de recursos investidos para o país. A partir daí ficou claro que há uma
complexidade nas cadeias produtivas, que leva a uma relação profícua com o
processo de inovação, mas também a um conjunto de fatores base, a formação de
nível superior e o estoque de profissionais formados que atuam nas cadeias
produtivas inovadoras. Isso me motivou a voltar para a academia para
desenvolver um doutorado profissional.
Como você começou a se envolver com a estruturação de problemas
com uso de ferramentas formais de apoio à decisão?
Na
realidade eu comecei a me envolver com ferramentas de apoio a decisão de uma
maneira inicialmente, posso até dizer empírica, quando eu comecei a trabalhar
na gestão pública. Na gestão pública você tem que trabalhar com prazos, com
orçamentos e com programas definidos e previamente autorizados em lei. Eu
aprendi que na gestão pública você só pode fazer aquilo que está autorizado; se
não está autorizado, você tem que criar uma política pública que seja
formalmente votada pelo legislativo e lhe autorize. Portanto, ao trabalhar com
planos plurianuais, com leis de diretrizes orçamentárias e com leis
orçamentárias, é necessário que haja uma melhor estruturação dos órgãos de
governo quanto a implementação das políticas públicas. Hoje percebo que os
métodos formais de estruturação de problemas são fundamentais para alcançar
bons resultados.
Uma
experiência que eu considero bastante exitosa está em andamento na secretaria
Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade, é o plano estadual de
descarbonização e a gestão de todo o patrimônio ambiental e o trabalho de
licenciamento e de fiscalização das cadeias produtivas de Pernambuco. O Fórum
Pernambucano de Mudança do Clima funciona de forma permanente há 12 anos, mas
foi reestruturado em 2019 quando iniciamos, em parceria com a União Europeia, a
construção de um plano de descarbonização da economia de Pernambuco que vai ser
entregue em março de 2022. Estamos adotando modelos já propostos pela academia
para constituir as metas de redução dos gases de efeito estufa como o criado
pela UFRJ, com adaptações e com o apoio das Universidades Federais de São Paulo
e de Minas; nos estudos do Plano de Descarbonização, estamos com o apoio das
importantes universidades daqui de Pernambuco como a UFPE, UPE, UNICAP e o
IFPE, além da iniciativa privada e das entidades da sociedade civil.
Esse
plano tem que, a partir da análise de quais são as emissões que a gente tem, e
quais são as alternativas tecnológicas, propor uma política pública de
descarbonização e incentivo ao desenvolvimento econômico, com a geração de
empregos sustentáveis e mais valorizados. O próximo desafio será constituir
também um plano de implementação dessas metas de descarbonização, que rume para
o carbono neutro em 2050.
De forma geral, cite
exemplos de algumas complexidades de processos decisórios típicos do setor
público.
De
maneira geral, na área pública a primeira questão é que você não pode fazer
nada que não esteja autorizado em lei. É diferente da iniciativa privada. Na
área pública você não pode fazer nada que não esteja previsto. Assim, há
necessidade de planejamento de estruturação de políticas públicas que sejam
previamente debatidas na sociedade e tenham um mínimo de consenso para terem
maioria e serem aprovadas. São ações complexas, pois determinadas questões
precisam ser resolvidas de maneira urgente e se o planejamento não acontece, o
problema efetivamente surge. Se um problema não for devidamente analisado do
ponto de vista do risco e da ameaça, danos à sociedade podem ser gerados e
teremos muita mais dificuldade para enfrentar o problema.
Acho
que um desafio para o Brasil hoje é a questão da Indústria 4.0 e a mudança de
paradigma que essa nova indústria impõe a todos os eixos da sociedade. Também
não posso deixar de comentar a questão do enfrentamento à pandemia da
SARS-CoV-2. No que tange os processos decisórios, vi várias falhas no
enfrentamento à pandemia por falta de uma coordenação política e central mais
adequada. Porém, vi também excelentes iniciativas como o SIDTriagem,
um sistema de informação desenvolvido com participação de docentes do
PPGEP/UFPE e médicos para alocação de leitos.
Sistemas de informação e apoio à decisão, com base em políticas
públicas e prevenção, demonstram que o conhecimento científico é absolutamente
necessário como ferramenta para a melhoria da qualidade e proteção da vida das
pessoas.
Na
área pública, você tem que ter a noção da quantificação de custos e da sua
limitação de recursos. Eles não são ilimitados. Nem os recursos públicos, nem
os recursos naturais. A tomada de decisão no setor público envolve diferentes
fatores e deve ser alicerçada por informações adequadas. Os modelos de apoio à
decisão são extremamente úteis para auxiliar a investigação e proposição de
boas políticas. As experiências acadêmicas têm me enriquecido, tanto na área de
pesquisa, quanto na área de ensino. Sou professor na área de engenharia de
produção, e tenho procurado falar da importância de se ter sistemas de
informação e apoio à decisão.
Que potenciais desafios
de pesquisa você indicaria como relevantes para a área de meio ambiente e
sustentabilidade para os próximos anos?
Nossa
expectativa é que possamos chegar aos grandes acordos para o enfrentamento das
mudanças climáticas, pois 80% das emissões de gases poluentes estão
concentradas em 20 países, exatamente aqueles países do G20, que se reuniram um
pouco antes da COP-26. Não vimos, efetivamente, como esses países se
comprometeram com a redução, por exemplo, do uso de carvão, com a redução do
uso de combustíveis fósseis. Na realidade, muitos desses países, inclusive o
Brasil, ainda fazem subsídios para este tipo de energia que contribui para o
aquecimento global. É neste sentido que precisamos firmar compromissos. Não é
tão somente o mercado de carbono que vai resolver, não é a troca de emissões de
países desenvolvidos por países que ainda estão em desenvolvimento que
solucionará a questão climática no planeta, e sim um novo modelo de
desenvolvimento que utilize energias limpas, trate os resíduos sólidos, que
possa recuperar a imensa camada de proteção do nosso planeta, que são as nossas
florestas.
Trata-se
de uma série de questões complexas que certamente os estudos desenvolvidos pelo
INCT-INSID e aplicações de ferramentas de apoio à negociação e decisão poderão
ser extremamente úteis. O Governo de Pernambuco, através das ações que nós que
fazemos a Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Pernambuco, assumiu
compromissos concretos, mas é necessário que todos os países se envolvam.
.
Veja: A poética ousada e cativante de Joana Côrtes https://bit.ly/3xdnKW8
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