O reencontro com o Brasil
O mundo mudou e a visão dos
militares ficou fora, completamente fora da realidade
Janio de Feitas, Folha de S.
Paulo
A recepção do mundo ao retorno de Lula tem a
anormalidade dos fenômenos. As publicações importantes, muitos chefes de
governo, e manifestações dos conscientes das urgências naturais, sociais e
políticas do planeta celebram a volta do Brasil pelas mãos de Lula. Nas
palavras do escritor Jon Lee Anderson: "As pessoas ao redor mundo estão
esperando de você, Lula, não que salve a Amazônia, mas que salve o mundo".
Há pouco a se comparar com essa expressão universalizada de
inquietude e vontade, feita com espontaneidade que subjuga a era do invasivo marketing.
O nome Lula ecoa no mundo como o de Mandela soou em nossos dias, por admiração
ao homem e à obra de sua vida comovente. Lula —ideia, histórico, palavra,
pessoa— é a causa e a confiança.
Vê-se, por contraste, quanto o Brasil fugiu do mundo real. Quanto
o mundo o queria. Quanto pode dar à humanidade. Quanto estão atrasados,
caquéticos, os que criaram e sustentaram os quatro anos do domínio de
mentalidades fardadas, estreladas, condecoradas e desprovidas de pensamento.
Está bem claro: o mundo mudou e a visão dos militares ficou fora, completamente
fora da realidade. Caserna e caverna.
Não é só o golpismo enraizado, nem a presunção de direito à
impunidade, ou a prepotência dada pela arma. É a visão. A estratégia de uma Amazônia toda
ocupada por atividades econômicas, e para isso devastada, como forma de
esvaziar ambições invasoras, é o extremo oposto ao que a racionalidade, a
ciência e a nova consciência mundial anseiam. O desatino da ocupação virou
exploração ilegal lá e negócio sujo no governo Bolsonaro, mas a estratégia é anterior. É
militar. E amparou, por óbvia concordância, a política anti-amazônica,
anti-indígena e negocista adotada pelo governo.
Salvo pela exploração política e comercial de religiões, o
bolsonarismo é a prática revivida da mentalidade atrasada, aquela que já na
ditadura do general Médici consumiu fortunas e vidas na Transamazônica que
seria a espinha dorsal da ocupação econômica da floresta. Tal permanência, já
de meio século no exemplo dado, denuncia a falta absoluta de reflexão e o
domínio absoluto do atraso. Com o acréscimo do golpismo pago por empresários
não menos atrasados, vislumbra-se o que espera por Lula do outro lado do Ano
Bom.
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