Educação e desenvolvimento: o encontro entre esperança e progresso
Danilo Moreira*
“Sabemos, entretanto, que a
história, precisamente por ser história, isto é, desenvolvimento e mudança,
jamais se repete, não obstante o caráter obviamente cíclico de muitos dos seus
processos. Uma coisa, porém, é certa: a de que a nova geração, precisamente
como a minha, deve estar preparada para a luta, para rijos combates, que exigem
bravura e inteligência.”
Ignacio Rangel
“Não é possível refazer
este país, democratizá-lo, humanizá-lo, torná-lo sério, com adolescentes
brincando de matar gente, ofendendo a vida, destruindo o sonho, inviabilizando
o amor. Se a educação sozinha não transformar a sociedade, sem ela tampouco a sociedade
muda.”
Paulo Freire
O intelectual maranhense Ignácio Rangel, que atuou com
protagonismo no último Governo Vargas, captou a dinâmica da dependência do
Brasil diante das economias centrais, no curso da unificação do mercado
mundial. Constituem-se os centros e periferias, sucedendo à relação entre
colônias e metrópoles, mas mantendo nas economias centrais o poder de
influenciar as demais. No curso das suas crises, o capitalismo aprofunda ainda
mais a dependência das economias periféricas. Especialmente quando, em momentos
ascendentes, estas economias expandem seu comércio exterior e a aquisição de
commodities e máquinas, dinamizando também as economias periféricas para, em
seguida, diante de uma crise, reduzir esta demanda, gerando um impacto certeiro
nestas economias.
Rangel observou um dinamismo brasileiro de tal ordem que, mesmo
em meio às crises, o Brasil tivera momentos econômicos virtuosos, pois a
diminuição do comércio exterior e das importações favoreceu-nos crescer e
produzir localmente. Em outras palavras, momentos de crise econômica mundial
podem abrir brechas para saltos tecnológicos e oportunidades ao nosso
desenvolvimento social e econômico, tal como ocorreu após a Revolução de 30 que
iniciou a Era Vargas. Para tanto, considero importante que tenhamos aguçada uma
consciência nacional e nos preparemos para aproveitar estas oportunidades.
A partir de Paulo Freire e Rangel, citados na epígrafe,
percebe-se que nem só de educação se faz o país, mas também de economia,
mercado interno, indústria, tecnologia e relações comerciais. E é naquilo que a
educação propicia de fortalecimento da economia, que ela muda a realidade, ao
promover o grande encontro entre educação e desenvolvimento.
Uma sociedade democrática e voltada ao desenvolvimento carece de
indústria, serviços qualificados, mercado interno forte e prosperidade comum.
Por isso, valorizamos a relação estudo-trabalho, caminho de oportunidade e
futuro, na contramão da visão herdada do Escravismo, que desvaloriza o trabalho
e não aposta na qualificação. Foi a visão típica de economias
monocultoras, extrativistas e fundadas em desigualdades, que ficaram para trás
no curso da globalização. As qualificações que impulsionamos apontam qual
economia desejamos. Educamos para o progresso social, tecnológico e econômico,
ou a educação servirá a perpetuar a miséria, a baixa qualificação e salários, e
o trabalho precário.
Ao longo do tempo, observamos na Educação o confronto entre duas
visões problemáticas: de um lado a escola livresca, propedêutica e descolada da
realidade do estudante e, por outro lado, uma escola acrítica e meramente
profissionalizante para os mais pobres. O desafio é enfrentar este falso
antagonismo, qualificar a educação em todas as suas dimensões e criar condições
para o jovem escolher sua trajetória de vida.
Nesse tempo em que vivemos, tornou-se ainda mais importante
assegurarmos oportunidades de acesso e permanência ao ensino médio e superior,
mas tal objetivo não pode ser visto de maneira idealizada e descontextualizada.
Na vida real, a maioria dos estudantes não chegará à universidade e precisará
se incorporar ao mundo do trabalho. Em muitos casos, a própria continuidade dos
estudos depende dessa possibilidade de trabalho e renda, e permitirá a própria
fruição da condição juvenil – profundamente marcada pelas possibilidades do
consumo. É um momento decisivo para as oportunidades educacionais que terão ao
longo da vida.
Tais questões se tornam ainda mais relevantes quando observamos
as mudanças no mundo do trabalho apontarem para a precarização das relações
laborais e à crise profunda do emprego com direitos básicos e carteira
assinada. Especialmente após a pandemia, ganhou ainda mais força a chamada
economia de plataformas digitais, que pode gerar soluções fantásticas para
atividades sustentáveis, mas na prática, tem oferecido condições de trabalho
sub-humanas para microempreendedores, jovens entregadores e motoristas, por
exemplo.
Vivemos sob um ambiente político e econômico que desfavorece o
emprego, amplia a informalidade, a precarização, o extrativismo e a degradação
ambiental e coloca milhões de jovens na situação de nem estudar, nem trabalhar.
O trabalho precário, intermitente, que se destina à juventude, em grande medida
inviabiliza o estudo. Assim, cada matrícula é uma vitória no sentido da escolarização
e da qualificação profissional. Dito isto, é inevitável mais uma vez
provocarmos a reflexão sobre a importância da articulação entre educação,
desenvolvimento e estratégia de país.
É profundo o alerta de Paulo Freire, “Quando a educação não é
libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor”. Não basta sermos
consumidores, precisamos construir, sonhar, realizar. A Educação reproduz ou
nos ajuda a superar as chagas crônicas de nossa formação como sociedade. Se
conseguimos ou não, nos enxergar como parte de uma nação e de um projeto
nacional que promova desenvolvimento e justiça social. Para tanto, precisamos
investir em nossos talentos e apostar em nosso potencial tecnológico como parte
do caminho para alcançar tão nobres objetivos.
Estamos imersos em um período muito difícil. Presenciamos uma
degradação vivida pelo País em múltiplas dimensões. Tal situação não é obra do
acaso. Aliás, em um jantar com lideranças conservadoras dos EUA, ainda em 2019,
o Presidente Bolsonaro fez a seguinte afirmação:
“O Brasil não é um terreno aberto onde nós pretendemos construir
coisas para o nosso povo. Nós temos é que desconstruir muita coisa. Desfazer
muita coisa. Para depois nós começarmos a fazer. Que eu sirva para que, pelo
menos, eu possa ser um ponto de inflexão, já estou muito feliz”.
Ainda assim, tivemos durante o último período inúmeras
manifestações de resistência e vitórias, seja através da luta social, seja por
políticas públicas efetivas, implementadas por governos progressistas e
democráticos. O Governo do Maranhão é farto de bons exemplos em áreas como
economia, proteção social, saúde e educação.
Manter nosso povo conformado e com baixa autoestima só interessa
aos que lucram com a destruição do Brasil e de nossos sonhos. Não há motivo que
impeça ao povo brasileiro de ser livre, culto e desenvolvido. Mas
isso só será possível por um caminho próprio, de valorização da educação e do
trabalho, do desenvolvimento produtivo e sustentável, da democracia política e
econômica, da nação.
* Professor Licenciado em História, MBA em Gestão Pública pela Fundação Getúlio Vargas e atual Subsecretário de Educação do Maranhão
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