Quando
o assunto é o fim da isenção de impostos sobre lucros e dividendos ou tributos
progressivos e sobre heranças, o silêncio reina
Daqui
a alguns anos, quando o tempo tiver assentado as análises sobre o tsunami que
varre o Brasil desde as jornadas de junho de 2013, a importância dos
acontecimentos desta época turbulenta não residirá na suposta cruzada contra a
corrupção ou na anedótica batalha entre coxinhas e petralhas.
Na
verdade, o que está em curso é um realinhamento de forças no eterno e insolúvel
conflito entre “capital e trabalho”. O papo é cabeça e complexo, mas tem tudo a
ver com assuntos atualíssimos, como a reforma da Previdência
e a flexibilização das relações de trabalho.
É
inegável que durante os governos petistas, sobretudo na era Lula, os
trabalhadores tiveram um importante incremento de renda. Para além dos
programas sociais, como o Bolsa Família,
o principal vetor desse processo foi o aumento contínuo do salário mínimo. Com
dinheiro no bolso, a classe trabalhadora dinamizou a economia com a explosão da
demanda por geladeiras, televisores de plasma e automóveis zero quilômetro.
No
ganha-ganha, venceram os trabalhadores que engrossaram a população
“consumistamente” ativa e o empresariado nacional – que inflou vendas e
turbinou margens de lucro. Entre 2003 e 2013, período em que o País também foi
abençoado pelas vacas gordas no mercado internacional de commodities, o PIB
cresceu em média 3,7%. Mas isso é passado.
De
fato, não restam dúvidas de que a política econômica baseada na expansão
desenfreada do consumo se esgotou. Os gargalos da infraestrutura somados ao
baixo nível de investimento – do governo e da iniciativa privada, asfixiados
pelas altas taxas de juro – impuseram duros limites à economia brasileira.
O
curioso é que, durante os oito anos do mandato de Lula, o governo teve em média
uma arrecadação 2,6% superior aos gastos – ou seja, fez o bendito superávit
primário, mas as taxas de juro continuaram estratosféricas. Para agravar o
quadro, o aumento contínuo da demanda, sem a contrapartida da oferta, provocou
pressões inflacionárias.
Há
algum tempo, como reação à crise econômica,
renasceu com força uma agenda tipicamente liberal, defendida por economistas
ligados sobretudo ao mercado financeiro que colonizam o noticiário econômico da
imprensa. Como esperado, a receita do bolo prevê uma série de reformas
estruturais que afetam tão somente o trabalho – e nunca o capital.
Voltamos,
então, ao primeiro parágrafo. A deposição do governo
Dilma Rousseff pega carona no discurso do combate à corrupção com o
objetivo de limpar de vez o terreno para uma repactuação das forças entre
capital e trabalho. A reforma da Previdência e a flexibilização das relações
trabalhistas – da qual o "libera geral" das terceirizações é apenas o
prólogo – são, ao mesmo tempo, fins e meios.
Os
economistas liberais não se cansam de repetir o mantra: os salários no Brasil
crescem a uma velocidade superior ao da produtividade da economia. Ao
dificultar a aposentadoria dos trabalhadores e ao aumentar a competição por
empregos, rasgando a legislação trabalhista e inibindo aumentos salariais, a
varinha mágica liberal pretende recolocar a economia nos trilhos, tolhendo as
parcas conquistas que os trabalhadores obtiveram nos anos 2000.
Curiosamente,
esse movimento já teve início no indefensável governo de Dilma Rousseff. Não à
toa, uma das primeiras medidas do ajuste fiscal
do seu ex-ministro da Fazenda, Joaquim Levy,
foi limitar o acesso ao seguro-desemprego. E o atual titular da pasta, Nelson Barbosa,
tem como meta de vida ou morte a reforma da Previdência.
Infelizmente,
não se escuta uma palavra sequer sobre o fim da isenção de impostos sobre
lucros e dividendos. Ou a respeito de tributos mais agressivos sobre grandes
heranças e fortunas. Ou acerca de uma maior progressividade nas alíquotas do
Imposto de Renda. Ou sobre a perversidade das altas taxas de juro. Quando se
trata de tirar dos mais ricos para aliviar para os mais pobres, o silêncio é
sepulcral.
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