Zumbi,
312 anos depois*
Luciano Siqueira
instagram.com/renatosq.escritor
A História da Humanidade se processa em espiral, interligando fatos do passado com a vida presente, num movimento dialético que faz ressurgirem – tenham ou não os homens plena consciência disso – ideias, sentimentos e desejos, agora reinventados na forma e na intenção sem perderem, entretanto, o liame com seu o conteúdo original.
Ontem, terça-feira 20, vivemos um exemplo disso ao
assinalarmos o 312º aniversário do suplício de Zumbi dos Palmares no Dia
Nacional da Consciência Negra.
A exaltação de Zumbi como herói nacional crava em
nossa História a saga do negro que nasceu livre em Palmares (1655), foi feito
escravo na infância, tornou-se foragido aos 15 anos, e aos 25 já era o líder do
maior dos quilombos brasileiros. Um ano depois da destruição de Palmares, foi
traído, capturado, ferido, morto e decapitado. Teria permanecido “bandido”
segundo a historia oficial (estigma que prevaleceu durante duzentos anos) se os
movimentos pela igualdade racial não tivesse colocado no seu verdadeiro papel
de inspirador das novas gerações, símbolo da luta atual.
Seus ideais reviveram ontem através de
manifestações pelo Brasil inteiro, erguendo três bandeiras de luta: pela
aprovação do Estatuto da Igualdade Racial, pela política de cotas e pela
transformação do 20 de novembro em feriado nacional.
Avalia a Unegro (União dos Negros pela Igualdade)
que tem avançado a luta contra a discriminação e pela igualdade em nosso país.
Foram criados organismos de promoção da igualdade racial nas três esferas de
governo. Foi revogada a Lei da Terra de 1854 na Constituição com o artigo 68 da
ADCT e o Decreto 4887/03, determinando, pelo Estado, o reconhecimento da posse
das terras dos quilombolas. A prática do racismo tornou-se crime previsto na
Constituição. Surgiu o sistema de cotas nas universidades. Há, hoje, previsão
orçamentária no plano plurianual da União e de vários estados e municípios para
sustentar políticas de igualdade racial.
Mas há ainda muito a conquistar. Basta que se
considere – além de indicadores da desigualdade racial entre nós, como
empregabilidade, renda e escolaridade – o estudo divulgado ontem acerca das
principais causas de mortalidade de homens negros e brancos. Os negros morem
principalmente de causas externas, enquanto os brancos morrem mais de doenças.
Os pesquisadores Marcelo Paixão e Luiz Carvano, da
UFRJ e do Laboratório de Análises Estatísticas Econômicas e Sociais das
Relações Raciais, demonstra que, de 1999 para cá, vem crescendo a desigualdade
entre negros e brancos quando se comparam as taxas de mortalidade por
homicídios, tuberculose, enfermidades relacionadas com o parto e HIV.
A desigualdade chega até a se acentuar com a
melhora dos índices entre os brancos e piora entre os negros, a exemplo da
variável homicídios. No período compreendido entre 1999 e 2005, a taxa de
assassinatos por 100 mil homens brancos caiu de 36 para 34 mortes, enquanto
entre os homens negros aumentou de 52 para 61 por 100 mil.
Cabe, portanto, implementar as políticas públicas
promotoras da igualdade, a lado do desenvolvimento econômico com distribuição
de renda e oferta igualitária, do ponto de vista racial, das oportunidades de
trabalho e de acesso aos serviços essenciais. Para honrar o ideal simbolizado
por Zumbi dos Palmares.
Publicado aqui no blog em novembro de 2007
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Veja: A dimensão regional da insegurança urbana https://www.youtube.com/watch?v=KuopXvcP6Hk&t=589s
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