30 novembro 2013

Contato direto

E-mail,Twitter e minha fan page https://t.co/uzX1DyNtkx são pessoais e intransferíveis. Ninguém me substitui nesse contato direto com vocês.

Internautas

Mais de 80 milhões de brasileiros acessam a internet.O número de brasileiros internautas subiu 6,8% em 2012, em relação a 2011.

Pacto

O sábado é de Carlos Drummond de Andrade: "Provisoriamente não cantaremos o amor,/que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos."

Lição de sensibilidade

"Com Bandeira aprendi o amor lírico pelas coisas simples. Com Vinicius, o primado absoluto da paixão, elemento sem o qual nada que realmente preste se faz. Com Cabral, o papel decisivo do corte. Disse-me ele, muito mais tarde, que cortar é ainda mais importante que escrever. Mais ainda: que cortar é a verdadeira maneira de escrever. Você não pode ter opiedade da palavra, nem se deixar enganar por sua falsa beleza, me aconselhou. Deve ser rígido, firme, intolerante, e cortar, cortar, cortar, até que o osso (a pedra) da palavra apareça à sua frente. (José Castello, no artigo  Um assombro Remoto, no blog A literatura na poltrona).

Pela igualdade de genero

Inaugurado pelo prefeito Geraldo Julio, ontem, o Centro da Mulher Metropolitana Júlia Santiago, em Brasília Teimosa, abrigará cursos de capacitação, promoção da cidadania e orientação para vítimas de violência sexista. Estima-se que 600 mulheres sejam atendidas por mês no centro. É mais uma parceria entre a prefeitura e o governo do estado. Instrumento da luta pela igualdade de gênero. A denominação do centro homenageia uma mulher de luta, a vereadora comunista Júlia Santiago, de marcante presença na luta popular em nossa cidade na década de quarenta.

29 novembro 2013

Em Porto Alegre

@lucianoPCdoB: Agora na assembleia geral da 18ª Cúpula da rede Mercocidades. Integração sul-americana em foco, através da articulação do poder local.

Cotidiano

A sexta-feira é de Cecília Meireles: "De que são feitos os dias?/- De pequenos desejos,/vagarosas saudades,/silenciosas lembranças."

Inflando a dívida pública

Taxa de juros, ordem pública e incertezas
Por Renato Rabelo*, em seu blog


O discurso da contenção de gastos públicos serve somente para abarcar uma parcela do orçamento da União. O frenesi antidesenvolvimentista não atinge os interesses do sistema financeiro sobre o nosso orçamento.

Esse é apenas um dos raciocínios passiveis de argumento para explicar a febre neoliberal posta adiante pelo braço midiático do capital rentista como forma de legitimar a ação do outro braço, institucional, desta classe: o Banco Central do Brasil.

Daí a taxa de juros subir de 9,5% para 10% não ser nenhuma surpresa. Para fins orçamentários é bom anotar que a cada 1% de aumento da taxa Selic aumenta-se em R$ 12 bilhões a fatia anual do erário público voltado ao pagamento das obrigações da dívida pública. No mês de abril esta taxa estava em 7,5%. Constitui-se assim um verdadeiro dumping capitaneado pelo próprio Estado ao seu próprio orçamento. Trata-se de uma questão de ordem pública que vai na contramão dos anseios de milhares de brasileiros que foram às ruas no mês de junho.

O estrago que a continuidade desta ação proporciona ao futuro do país não é menor. Incertezas sobre o nosso futuro se refletirão sob a forma de mais timidez por parte de empresários nacionais para tocar adiante novos investimentos. O país deixa de crescer e se incapacita para responder profundos desafios internos e externos.

A macroeconomia do antidesenvolvimento proscreve qualquer tentativa de planificação de médio e longo prazo. Na ponta do processo a manutenção de uma taxa de investimentos da ordem de 18% do PIB apenas serve para que o “fantasma” da inflação continue a “assombrar” o país no médio e longo prazo: sem expansão da oferta, é impossível criar condições para um desenvolvimento sem pressões inflacionárias. Sem expansão da oferta estão garantidos os interesses do capital financeiro em detrimento dos trabalhadores e do capital produtivo.

O problema é financeiro, orçamentário, estratégico e, sobretudo, político.

*Renato Rabelo é presidente nacional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB)

28 novembro 2013

Pilares da reforma

Saudei os participantes da 18ª Cúpula da Rede Mercocidades, transmitindo o abraço fraterno do prefeito Geraldo Julio. E defendi o financiamento público de campanhas e a adoção do sistema de de listas pré-ordenadas pelos partidos para os cargos parlamentares, essenciais a uma reforma política verdadeiramente democrática - questão levantada pelo prefeito Márcio Lacerda, de Belo Horizonte, um dos painelistas. 

Mercocidades

Agora, na 18ª Cúpula da Rede Mercocidades, em Porto Alegre: "As autoridades locais e a crise da democracia representativa". Bom debate.

Compaixão

A sexta-feira é de Mário Quintana: “Não te irrites, por mais que te fizerem.../Estuda, a frio, o coração alheio.”

27 novembro 2013

Projetos nacionais conflitantes

Paul Klee
A pauta que interessa
Luciano Siqueira


Quais serão os grandes temas da disputa eleitoral em 2014? A pergunta é anotada em análises prospectivas assinadas por articulistas de variadas tendências, sem uma resposta precisa. As forças que disputarão a eleição presidencial ainda estão em busca do discurso; e o próprio cenário em formação ainda não autoriza definições completas. 
Mas vale especular.

Grosso modo, podemos considerar duas vertentes na construção do discurso das candidaturas presidenciais. Uma é determinada pela realidade do País em sua dimensão mais abrangente, digamos estrutural. A outra é produto da junção de variáveis de ordem tática com demandas do que se tem convencionado chamar marketing político. Ou seja: se todos os litigantes e as correntes que lhes darão sustentação obrigatoriamente consideram os grandes impasses da sociedade brasileira, cujos obstáculos não cabe escamotear; igualmente levam em conta o modo de abordá-los a fim de agregarem aliados e sensibilizarem as grandes massas do eleitorado. 

As duas vertentes, entretanto, não caminham em separado. Mesmo que se tente. Porque os problemas estruturais estão de tal ordem emergentes que se refletem nas bandeiras escolhidas por esta ou aquela facção, a título de ideias-força capazes de se converterem em atrativos da consciência e da vontade de amplas parcelas dos brasileiros e brasileiras.

Isto se mostra mais evidente quando se expressam a defesa do legado construído na última década e a crítica e o combate ao conteúdo desse legado. O PT e seus aliados procuram, com razão, acentuar as conquistas acumuladas no período, desde o primeiro governo Lula aos dias que correm; o PSDB e apoiadores, no polo oposto, tudo fazem para desconstruir teórica e politicamente o que vem sendo realizado. O que leva a uma inevitável polarização entre dois projetos de País, diametralmente conflitantes. Já aí se demarcam campos: em favor da continuidade da transição da ordem herdada dos anos FHC ao projeto inovador de desenvolvimento em construção versus a retomada das políticas anteriores, de cunho neoliberal. Por exemplo, a questão do chamado "tripé macroeconômico", tão a gosto da ex-senadora Marina Silva. Ou se rompe com o câmbio flexível, as metas inflacionárias ultra-restritivas e os juros altos, ou não se alcançará o patamar de crescimento do Produto Interno Bruto desejável, lastreado pela elevação da capacidade de investimento. Hoje, os investimentos em infraestrutura e incremento da produção oscilam entre 17 e 19% do PIB, quando a exigência mínima imediata seria de 25%. E tal não ocorrerá sem que, com apoio das urnas de 2014, se concerte um novo pacto político e social em favor do desenvolvimento com inclusão social, soberania e mais democracia e integração sul-americana.

O que a oposição prega é o inverso. Mais juros altos, sob pretexto de conter a inflação, manutenção do câmbio flexível, superávit primário elevado, arrocho fiscal, corte de gastos com programas sociais e quejandos. Uma pauta muito distante das aspirações e das necessidades da maioria.

Desse conflito decorrerão, inevitavelmente, as plataformas eleitorais, ainda que matizadas por bandeiras de fácil assimilação, aparentemente desligadas dessas questões de fundo. Por isso, enquanto os que governam se vêem instados a reafirmarem o rumo e a renová-lo atualizando o programa de mudanças, os que se postam na oposição têm o desafio de tornar palatável perante o eleitorado sua agenda restritiva de direitos, concentradora da produção, da renda e da riqueza, socialmente excludente.

Tentando escapar a esse dilema, alguns sugerem que as grandes questões do debate sucessório serão a mobilidade urbana, a qualidade e a cobertura do serviços de saúde e de educação, a segurança pública e a questão ambiental. Mais uma vez são conduzidos, objetivamente, para o conflito de projetos nacionais e da natureza das mudanças estruturais. Porque questões como estas, que efetivamente comporão a pauta eleitoral, reclamam transformações de fundo, via reformas urbana, tributária, agrária, do sistema educacional, assim como o fortalecimento do Sistema Único de Saúde. 

Haverá, portanto, um duelo de gigantes - na dimensão em que a evolução recente da sociedade brasileira impõe.

Frente Nacional de Prefeitos

Em Porto Alegre, participo a partir da noite de hoje de encontro da Frente Nacional de Prefeitos, substituindo o prefeito Geraldo Julio.

Instituto Confúcio

Em parceria com a Universidade Central de Finanças e Economia de Beijing, a Universidade de Pernambuco instalou ontem, no Recife, o Instituto Confúcio, destinado a promover a amizade e o intercâmbio cultural Brasil-China.  Ao lado do governador Eduardo Campos, do reitor Carlos Calado e do embaixador Li Jizhang,  entre outras autoridades, participei da solenidade representando o prefeito Geraldo Julio. Está é a sétima unidade do Instituto no Brasil, a primeira. O Norte-Nordeste.

Luz do sol

A quarta-feira é de Pedro Américo: “Sozinha não abre a flor sem/a luz do sol/Que aquece a pedra, o solo/e a raiz”

Com o embaixador da China

Tive o prazer de receber ontem, em meu gabinete na Prefeitura do Recife, o embaixador chinês no Brasil, Li Jinzhang, acompanhado pelo chefe da Seção Consular e pelo Conselheiro Cultural da China, respectivamente, Huang Bin e Zheng Kejun. O embaixador comunicou a decisão de instalar no Recife um Consulado Geral, que deverá atender a oito estados da região. Discutimos oportunidades de estreitamento das relações comerciais e culturais entre Brasil e China, com foco na exploração das relações de irmanamento entre Recife e Guanzhou, capital da província de Guandong, estabelecidas desde 2007. Questões da geopolítico mundial e os papéis ora desempenhados pelo Brasil e pela República Popular da China permearam o encontro. 

26 novembro 2013

Samico, presente!

Gilvan Samico deixa uma obra original, tecnicamente rigorosa e de rara beleza. Estará sempre presente na cultura pernambucana.

O sentido das mudanças

Nesta década se destacam quatro grandes realizações, ainda em movimento e em construção, mas delineadoras de um novo tipo de desenvolvimento que vai fortalecendo o país com o resgate do papel do Estado, afirmação da soberania nacional, ampliação da democracia e crescimento econômico com progresso social. Estas conquistas ocorrem no âmbito de uma transição, ainda em curso, marcada pela luta entre o neoliberalismo que persiste e o novo desenvolvimento nacional que emerge. (Da resolução política do 13º. Congresso do PCdoB acerca da situação nacional).

25 novembro 2013

Esperança

A segunda-feira é de Pablo Neruda: “Dá-me o silêncio, a água, a esperança./Dá-me a luta, o ferro, os vulcões.”

Exclusão

Há risco de alguns milhões de eleitores não fazerem a tempo o recadastramento biométrico. Ficariam de fora das eleições de 2014. 

24 novembro 2013

Uma crônica minha para descontrair

Enfim, descubro-me um cidadão desinformado
Luciano Siqueira

 
Realmente, uma descoberta e tanto. Dou-me conta de que, apesar dos esforços diários, sou um cidadão relativamente desinformado. Pois li, dias atrás, em matéria de destaque na Folha de S. Paulo que a modelo Luiz Brunet fez 51 anos e decidiu retirar o silicone dos seios. E eu nem sabia que a moça tinha posto silicone, nem nos seios nem noutras partes do corpo, muito menos os motivos que a levam agora a dispensar o disfarce.

A notícia, obviamente, é importantíssima. Se não fosse, um jornal de circulação nacional não lhe daria tanto espaço. Eu é que estou por fora.

Isto apesar de ler cotidianamente os principais jornais do país, visitar portais e sites de notícia e opinião - sempre com a atenção focada no que me parece verdadeiramente importante.

Mas tenho errado, sim, nessa coisa de foco no que vale a pena ler. Fico devendo à La Brunet por não acompanhar sua vida em detalhes, assim como a outras celebridades e outras tantas personalidades nem tanto. 

Assim, peço desculpas ao grande empresário do setor financeiro por somente ontem ter sabido que nas horas vagas cultiva pimentas de diversas espécies. Para relaxar, diz ele, ao repórter atento.

Devo sim, reconheço. Como não sabia que um ex-presidente da República, reconhecido nos salões mais sofisticados pela sua finura e bom gosto, coleciona cinzeiro de avião - daqueles que existiam antes da interdição aos fumantes em voo, encravados no braço do assento? Um leve movimento com a unha e se tinha o cinzeiro à mão. Não sei quantos estão catalogados na coleção particular do ilustre homem público, mas certamente ali jazem como relíquias da Varig, VASP, Transbrasil e até, quem sabe, de companhias mais antigas, como a Panair e o Loyd Aéreo. Que os guarde com o zelo próprio dos colecionadores.

Lembro vagamente de um telefonema bisbilhotado por repórter de jornal sensacionalista, em que o príncipe Charles dizia à amada Camiila (ex- Parker-Bowles) que gostaria de ser um Tampax, absorvente íntimo, para estar sempre ali naquele lugarzinho cobiçado. Mas nunca me passou pela cabeça que o prestigiado monarca tivesse se convertido em colecionador de milhares de marcas de absorventes comercializadas mundo afora, conforme pude ouvir numa mesa de restaurante ao lado, onde animado grupo debatia amenidades.

Aliás, não tenho o menor interesse nesse tipo de informação. Mas fico com uma ponta de dúvida: que e espécie de gente sou assim tão avesso a notícias tão destacadas sobre hábitos e desejos de figuras badaladas? Afinal, se a grande mídia dá tanta importância, o futuro da Humanidade pode depender dessas coisas e eu é que não alcanço tamanha verdade. Sei não. 

Sempre atual

Uma entrevista minha a Aldo Vilela, que permanece atual:  veja vídeo ttp://migre.me/gL9Iv

A vida do jeito que é

Oficina de manutenção
Marco Albertim, no Vermelho 

O torno girando, veloz, zuniu como das outras vezes. O óleo derramado na navalha de aço, e no aço cru preso ao cabeçote, baixou a temperatura dos dois, inda que a custo de um fumegante vapor. A fumaça inalada pelo torneiro, pelo ferramenteiro  e pelo ajudante, poupou o chefe da manutenção, por conta da distância de seu birô junto à porta de acesso. A porta sempre aberta dava conta de uma vintena de outras seções, onde funileiros, soldadores, duteiros, pintores e ajudantes, sem o perceber, orquestravam uma sinfonia de ferros, aços e folhas de flandres cortados ou emendados à força de soldas.  

Vizinha  ao almoxarifado, a oficina de manutenção, por ser o laboratório onde o aço bruto ou o ferro, mesmo sob  o efeito da oxidação, convertiam-se em ferramentas próprias ao molde ou ao corte de outras, depois de usinadas, era o cérebro da produção; daí o prestígio de que gozava entre os operários; mesmo o ajudante, único com ofício ainda em formação, era visto com inconfessa inveja por ajudantes de outras seções. 

César, operando o torno feito o piloto de um veículo de raro manuseio, pouco se importou com a densidade tóxica da fumaça. Com um olho na usinagem do aço e outro no ferramenteiro, no ajudante e no chefe da manutenção, tinha na boca e no nariz uma máscara de proteção. Inda que o corpo coberto com o grosso macacão sujo de óleo da cintura para baixo, os braços estavam sem proteção; nas mãos, nenhuma luva. Súbito, sua voz roufenha, de curto alcance, soltou um grito que rompeu a rotina já monótona aos sentidos de cada um dos operários. 

É forçoso dizer que o torneiro era dos raros operários a fazer uso dos  vales quinzenais concedidos pela fábrica. O dinheiro vinha num envelope azul, junto a um recibo onde punha sua assinatura com letras tão arrevesadas, em nada parecidas com o contorno sem diferenças gerado nos cortes do aço cru na navalha no carro superior do torno. De todos os operários, era o único a conter o suor nos poros negros de sua pele. O macacão, da cintura para cima, inda que desbotado pelo uso contínuo, não exibia traços ou manchas de óleo. César movia-se conforme a mobilidade do barramento do torno, na altura e abaixo de sua cintura; o barramento liso tinha só três metros de comprimento horizontal. Ali mesmo, sem se d espregar do barramento, acostumara-se a receber do funcionário do escritório, o envelope com o dinheiro urdido dois, três dias antes.  

Oitenta operários foram surpreendidos com o grito do torneiro mecânico, correram para a sala de chão de cimento estropiado da manutenção. Viram, atônitos, o rosto de César amarelar-se feito as paredes de folhas de ferro pintadas, nos quatro lados da sala. A sua mão direita, raramente em contato físico com um dos três barramentos, prendera-se ali, à força da corrente de eletricidade vazada para o torno. A chave de força do torno ficava vizinha aos três barramentos. César demorou a recuperar a cor natural de seu rosto. O impacto do choque, no entanto, foi interrompido pelo ajudante da sala, que correra em sua direção e desligara a chave de funcionamento do torno. 

O grito, a correria dos outros operários no galpão da produção também com o piso estropiado, deram um susto nos funcionários do escritório, no pavimento de cima. O dono da fábrica, cuja sala tinha uma parede de vidro transparente, dando visão para os operários no trabalho, ergueu-se de sua poltrona. Ordenou que o chefe de setor de pessoal descesse para apurar o que ocorrera. Cumprida a ordem, o chefe de setor de pessoal deu conta ao dono da fábrica, do acidente. 

- Foi com o rapaz que pede um vale toda quinzena? 

- Sim - respondeu o auxiliar. 

- O vale já está pronto? Providenciem logo. 

- Já está no envelope. 

O auxiliar olhou para o boy do escritório, ordenando que levasse uma garrafa de água gelada para o torneiro mecânico. Em seguida, lembrando que o envelope com o dinheiro já estava em seu bolso, emendou: 

- Não! Eu mesmo levo. 

César bebeu a água e recebeu o envelope com o dinheiro, sob os olhares de espreita dos operários.  

Quando o chefe de pessoal voltou para o escritório, informou ao dono da fábrica que o chefe da manutenção pedira autorização para liberar o torneiro do trabalho, pelo menos naquele dia.

 - Libere-o. Mas diga que o ferramenteiro deve assumir o manejo do torno.

Melodia

Juros altos e redução dos gastos públicos com programas sociais soam como bela melodia aos ouvidos do grande capital disposto a financiar a oposição. 

Bom senso

Movimento Bom Senso F.C., organizado por Alex e outros craques, que reclama calendário menos desumano, dá novo colorido ao início dos jogos. Merece apoio amplo na sociedade.

Fogos de raios

O domingo é de Vicente Huidobro: “Há palavras que têm sombra de árvores/Outras que têm atmosfera de astros/Há vocábulos que têm fogos de raios”

Poder de fogo

Segundo Marcelo Neri, autor de “A nova classe média”, os 94,9 milhões de brasileiros que compõem esse estrato social correspondem a 50,5% da população – ela é dominante do ponto de vista eleitoral e do ponto de vista econômico. Detêm 46,24% do poder de compra (dados 2009) e supera as chamadas classes A e B (44,12%) e D e E (9,65%). Uma mudança significativa verificada no Brasil dos últimos dez anos.

Solidão

Desfiou gestos de plena solidariedade, sem que seu relato traísse qualquer traço de presunção. (“Amigo é pra essas coisas”, ouvi em silêncio a voz de Paulinho da Viola).  Falava naturalmente. Eu apenas escutava, uma pergunta aqui outra acolá para lhe facilitar o relato. Até que, voz embargada, confessou-se um homem só. Paradoxalmente só – ele que a todos socorria, o ombro amigo e ponderado, via-se entretanto ilhado num instante adverso. - “Tenho tomado decisões muito sérias a esta altura de minha vida sem ter a quem recorrer. Acerto sozinho, erro sozinho”. (Da minha crônica “O homem só”).

23 novembro 2013

Ternura

O sábado é de Jaci Bezerra: “A ternura retida/entre grades e muros/é paixão e cantiga/no alicerce maduro.”

Ciência em debate

Integração, educação e inovação são alguns dos desafios para o desenvolvimento sustentável que podem ser vencidos com o auxílio da ciência. Por isso mesmo as três frentes são tema de uma declaração e um documento lançados hoje (21/11) por cientistas brasileiros e de demais países da América Latina A iniciativa vem no embalo das discussões do Fórum Mundial de Ciência, um dos maiores eventos da área e que ocorrerá pela primeira vez no Brasil na semana que vem, no Rio de Janeiro. e do Caribe, informa a revista Ciência Hoje. Leia mais http://migre.me/gJSwH

Sempre um pesadelo

Uma competição negativa entre as operadoras de telefonia móvel. Segundo a Anatel, a Claro assumiu o pódio do maior número de reclamações em julho, com 31 queixas por grupo de mil usuários. As concorrentes atingiram índices de reclamação dentro do limite de dez reclamações: Vivo (dez), Oi (nove) e Tim (seis). Mas podia ser o inverso. Nessa gangorra, sofre o usuário. Os principais motivos das reclamações contra as operadoras são cobrança, 25%; promoções, 14%; serviços adicionais, 11%; cartão pré-pago, 11%; rede, 11%; atendimento, 7%; área de cobertura, 4%; planos de serviço, 4%; habilitação, 4%. Enquanto isso, os prometidos investimentos para melhoria da qualidade do atendimento caminham lentamente. A coisa só anda com muita pressão popular – que nesse caso dá-se basicamente via Procon, ainda insuficiente.

Mundo em transição

Movimentos
Eduardo Bomfim, no Vermelho

 
O esfacelamento da antiga União Soviética criou as condições objetivas de nova expansão capitalista a nível mundial, que avançou sobre novos territórios, ao tempo em que os Estados Unidos consagravam-se como a grande potência imperial global incontestável, além da entronização do neoliberalismo como doutrina e dogma no centro das decisões econômicas internacionais.

E sob tal espectro dessa hegemonia financeira, militar, midiática instaurou-se formalmente tanto quanto institucionalmente a chamada Governança Mundial cujo motivo foi a caducidade do conceito até então prevalente da soberania nacional, a autodeterminação dos povos, produzindo uma nova era de intensos, variados conflitos regionais de alta, média intensidades, resultantes da ação imperial e as consequentes resistências dos povos.

Em função dessa monopolização financeira e dos interesses estadunidenses formatou-se uma agenda social global cuja pauta em sua gênese é auto justificável como aspiração básica das sociedades, dos indivíduos, mas que tem sido revertida ideologicamente ao utilitarismo, à padronização do Mercado, às estratégias da política externa dos Estados Unidos.

De tal forma que em nome dessa agenda, por exemplo, agridem-se os Direitos Humanos, destrói-se a democracia, apequena-se o exercício essencial da política, avilta-se a soberania das nações, mata-se, tortura-se barbaramente, violenta-se o meio ambiente, a identidade cultural dos Países, impõem-se a moda, os costumes globais, a fragmentação do sentimento em comum de nação, lucra-se com a fome endêmica que grassa em muitas regiões como em África, numa espécie de avesso da realidade tal como um jogo de espelhos distorcidos.

Mas a China, associada à ascensão dos Brics, que resistiu em 1989 à tentativa de destruição do que eles denominam “socialismo combinado com economia de mercado”, da sua soberania, alavancou paradoxalmente, via crescimento econômico contínuo por décadas com variações relativamente pequenas, o surgimento de uma nova era geopolítica multilateral, em um momento histórico pleno de embates contra a hegemonia imperial, a Nova Ordem mundial, na luta pela autodeterminação das nações.

Enfim nesses tempos de ocaso do neoliberalismo a História, assim como a Terra, também se move, E pur si muove, como disse Galileu Galilei.

22 novembro 2013

Palavras poéticas

A sexta-feira é de Nilson Vellazquez: “Quero bailar minhas palavras, rotas e imprudentes/mas ávidas de sentidos para o belo ouvir.”

Contra os maus agouros de quem torce contra

Emprego em outubro, marca positiva na economia
Luciano Siqueira

Apesar dos maus agouros de quem torce contra, o Brasil criou 94,9 mil vagas de emprego em outubro. Pois há os que analisam o evolver da economia com olhares preocupados em superar obstáculos e seguir adiante no ciclo de crescimento com inclusão social. E há os que buscam a todo instante sinais de débâcle porque torcem contra, na expectativa de que se crie um ambiente favorável às oposições em 2014. Estes devem estar frustrados diante da expansão dos postos de trabalho nos mês passado.

De acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), outubro se encerrou com um saldo líquido de criação de 94.893 empregos formais. Uma marca superior à do mesmo período do ano passado, quando foi apurada criação líquida de 66.988 postos de trabalho. No mês, o total de admissões atingiu 1.841.106 e o de dispensas alcançou 1.746.213.

Num ambiente de ameaças externas, advindas da crise global, e ainda às voltas com grandes obstáculos macroeconômicos – mormente o câmbio flexível, metas inflacionários elevadas e retomada da elevação dos juros -, o panorama do emprego se mostra extremamente positivo.

Isto significa reforço de um traço marcante da evolução do País na última década, quando nada menos que quarenta milhões de brasileiros e brasileiras se inseriram no mercado de trabalho e no mercado de consumo. Diferentemente do passado neoliberal recente, quando de Collor a FHC o Brasil perdeu doze milhões de empregos formais. De Lula a Dilma, vinte milhões de empregos com carteira assinada foram gerados.

Assim, os dados do Caged merecem ser comemorados. No acumulado do ano, registra-se geração líquida 1.464.457 empregos celetistas. Nos últimos 12 meses, foram criadas 1.036.889 vagas com carteira assinada, na leitura com ajuste - que inclui as informações repassadas pelas empresas fora do prazo. Com um dado relevante: a indústria de transformação apresentou os melhores resultados de geração de emprego no período, comparecendo com 33.474 vagas, correspondente a 91% mais em relação ao mesmo mês do ano passado, quando foram abertos 17.520 postos.

E se no comércio a oferta de empregos se mostrou limitada, de 5,2% em comparação com outubro de 2012 (exatos 52.178 postos de trabalho), é de se esperar que em novembro e dezembro, com o aquecimento do movimento de fim de ano, essa expansão sofra importante impulso.

Bom sinal. E um desafio aos que levam em conta o desempenho da economia como variável importante na formação do cenário eleitoral de 2014.

Unidade dos contrários

Divergências na política são tão naturais quanto o ar que respiramos. Tanto quanto na ciência, nas artes, na vida. Em todas as esferas. Como ensina a sabedoria popular, “os dedos das mãos não são iguais”. A polêmica, então, é da essência da prática democrática; ante-sala da convergência e da unidade. Mas é preciso que se dê em torno de ideias, jamais em função de disputas menores.

Unidade dos contrários

Divergências na política são tão naturais quanto o ar que respiramos. Tanto quanto na ciência, nas artes, na vida. Em todas as esferas. Como ensina a sabedoria popular, “os dedos das mãos não são iguais”. A polêmica, então, é da essência da prática democrática; ante-sala da convergência e da unidade. Mas é preciso que se dê em torno de ideias, jamais em função de disputas menores.

21 novembro 2013

Por toda a vida

A quinta-feira é de Vinícius de Moraes: “E cada verso meu será/Pra te dizer/Que eu sei que vou te amar/Por toda a minha vida”


 

Interinidade

Com o prefeito Geraldo Julio na Polônia, onde participa ao lado da secretária do Meio Ambiente e Sustentabilidade Cida Pedrosa da Conferência das Partes (COP-19), assumi desde ontem interinamente o governo da cidade. A COP-19 é uma iniciativa da que reúne 190 países e negocia a implantação da segunda fase do Protocolo de Quioto.

Face cruel da discriminação racial

A Nota Técnica Vidas Perdidas e Racismo no Brasil, divulgada ontem pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) – estima, para cada estado do país, os impactos de mortes violentas (acidentes de trânsito, homicídio, suicídio, entre outros) na expectativa de vida de negro e não negros, com base no Sistema de informações sobre Mortalidade (SIM/MS) e no Censo Demográfico do IBGE de 2010. Revela uma realidade contundente: tendo em conta apenas o universo dos indivíduos que sofreram morte violenta no país entre 1996 e 2010, verifica-se que além das variáveis socioeconômicas – escolaridade, gênero, idade e estado civil –, a cor da pele da vítima, quando preta ou parda, faz aumentar a probabilidade do mesmo ter sofrido homicídio em cerca de oito pontos percentuais. Uma face cruel da luta – que é de todos – pela igualdade racial.

20 novembro 2013

Palavra de poeta

A quarta-feira é de Pedro Américo: “Uma só árvore não desenha/a primavera”

Mais médicos

O Brasil fecha o ano com pelo menos um médico em quase todas as regiões mais carentes do país, prestando atendimento em bairros e comunidades que não tinham acesso a médicos. Mais 3 mil médicos cubanos chegam para trabalhar em 1.745 municípios e 15 distritos indígenas. Mais de 10,3 milhões de pessoas passarão a ter assistência. Até o final de dezembro, 6,6 mil profissionais estarão atuando no programa. Áreas carentes do Brasil – o Semiárido nordestino, comunidades quilombolas e cidades com desenvolvimento humano crítico receberam 1.758 médicos.

19 novembro 2013

Sem espelhos

A terça-feira é de Mário Quintana: "Mas vocês não repararam, não?!/Nos salões do sonho nunca há espelhos…/Por quê?"

Odioso preconceito

O monumento em homenagem a Zumbi dos Palmares, na Avenida Presidente Vargas, no centro do Rio de Janeiro, foi alvo de vandalismo ontem, pela sexta vez este ano.  Às vésperas das comemorações do Dia Nacional da Consciência Negra.

O joio e o trigo

Onipresente na cena política através das oposições partidária e midiática, a oligarquia financeira age no sentido de deter o ciclo de mudanças em curso no Brasil há dez anos. Deseja a todo custo preservar seus interesses mantendo imutável a linha macroeconômica que, como bem assinala Renato Rabelo, implica “juros altos, câmbio apreciado, salários contidos, austeridade fiscal e liberalização da economia, tendo o mercado a função de ser o centro da condução do desenvolvimento econômico e social”. Sob o pretexto do combate à inflação, mas em favor da especulação e da usura. O pleito presidencial de 2014 põe em causa os interesses dessa oligarquia versus a continuidade do desenvolvimento econômico com inclusão social e afirmação da soberania do País. Quem representa quem? Urge separar o joio e trigo.

18 novembro 2013

Bachelet na frente

No Chile, a ex-presidente Michelle Bachelet lidera a disputa pela Presidência, com 46,65% dos votos. A candidata da coalizão de direita que governa o país, Evelyn Matthei, alcançou apenas 25,23%. A se confirmar essa vantagem, os chilenos terão decidido retomar o fio da história. Ponto para a integração sul-americana.

Sonho

A segunda-feira é de Olavo Bilac: "Quantas vezes, em sonho, as asas da saudade/Solto para onde estás, e fico de ti perto!"

17 novembro 2013

Uma crônica minha para descontrair

Eva Trust
Saudade do glamour imaginário da infância
Luciano Siqueira


Não devia ter mais do que cento e cinquenta metros a distância entre a mercearia do meu pai, Renato, e a padaria Moderna, do seu Antenor, na Lagoa Seca, em Natal. Mas eu achava uma distância imensa! Questão de perspectiva, no olhar do menino de 9 anos apenas, numa época em que nessa idade se sabia muito menos do que meu neto Miguel, de 8 anos, sabe hoje. Ir comprar o pão para mim era uma aventura, me sentia Flash Gordon explorando o Universo. 

É que a dimensão das coisas se ampliava nas ondas da imaginação. Por isso o barra-a-barra com bola de meia, um contra um ou em duplas, equivalia ao clássico ABC X América em final do campeonato. Na boquinha da noite, de banho tomado, ali na esquina, sentados na calçada, a resenha dos lances espetaculares fazíamos com binóculos poderosos. 

E as aventuras a bordo dos caminhões de madeira e latas de óleo Salada, pelas estradas do Brasil? Sensacionais, plenas de riscos e manobras à margem de despenhadeiros construídos na areia, próximo ao coreto situado no cruzamento das ruas São João e Alberto Silva. 

Aliás, sob o coreto, me impressionava ouvir histórias contadas por colegas mais crescidos e experientes em incursões por outros lugares da cidade. Pouco importava a dúvida quanto à veracidade do que se dizia, valia a fantasia inspirada nas aventuras de Zezé Vida Torta, Luís Cambadinho, Carrunda e outros. Eles falavam de brigas terríveis na saída do cinema, copiadas de Roy Rogers, Hopalang Cassidy, Buck Jones. Ou ao término dos jogos no Estádio Juvenal Lamartine, no Tirol, quando levavam às últimas consequências os xingamentos entre torcedores rivais. Eu sentia inveja daquela turma que se locomovia livremente, sem os limites dos meninos "de família". Mas não me recordo de ferimentos ou hematomas no corpo dos nossos heróis. 

E o temporal ameaçador, que enfrentei protegido no banco traseiro de um Renaux Perfect, ao lado da vovó Neném. Era o veículo particular do tio José Ivo, médico conceituado, caridoso e amado pelo povo. O chofer foi nos buscar lá em casa e nos conduziu até a Avenida Rio Branco, onde residia e clinicava o tio Zezé. Na volta, frustrei-me porque parara de chover e a minha aventura aquática já não fazia sentido.

O tempo passa, a maturidade chega e a gente se obriga a enxergar as coisas como são, sem o glamour imaginário da infância. Agora importa a verdade dos fatos, a realidade cara a cara. Porque não se deve tomar decisões sem os pés no chão, de olho nas consequências. São outras às aventuras, ousadas algumas, mas todas contidas pelo paquímetro do bom senso. É a vida.

Saudade

O domingo é de Patativa do Assaré: "Saudade dentro do peito/É qual fogo de monturo/Por fora tudo perfeito,/Por dentro fazendo furo."

A vida do jeito que é


Lava tripas
Marco Albertim, no Vermelho

O fustão furta-cor do vestido da velha absorveu o cinzento cambiante das paredes da casa. Sentada ao lado de uma mesa, não quis se dar conta de que a cor escura da garrafa de cerveja, não tinha uma semelhança casual com sua pele; a secura de ambas, com riscos curvos de cima a baixo, mostrava a sorte inevitável do fim próximo.

- Eu vim morar aqui há quarenta anos - disse a velha, sem evitar a umidade espumosa na comissura dos beiços.

Às nove horas, o sol há muito se acumpliciara com a infertilidade do chão de areia granulada, cinza, na frente da casa; da casa e de todo quarteirão sem atalhos, inda que sinuoso, na margem do rio Lava Tripas. A velha sentara-se de modo a exibir, sem afetação, familiaridade com o canto de sua escolha. O rancor natural do sol, irrompera porta adentro, acentuando a cor indecisa das quatro paredes.

A velha, sem sinais de incômodo no couro calcinado, mantinha uma conversa chocha com outra de sua idade. Dona Cema sentara-se em frente, junto a uma mesa no lado contrário, vizinha à porta de acesso às prateleiras da bodega. Nos fundos, um quarto e a cozinha com as paredes chamuscadas de fumaça e de tisna nos lados e nos fundos das panelas.

Dona Cema conservava a palidez do couro; fora branca sem nervuras de doença no rosto, quando moça. Agora, mesmo com o rosto encardido de quem pena com o impaludismo, esconde-se do sol. Acomodara-se na desordem dos fios grossos de borracha na cadeira com braços, pés e espaldar de ferro; distinguia-se, assim, da pobreza  nos casebres tão juntos quanto ostras nos juncos.

- Também cheguei aqui há quarenta anos. - respondeu - Dilermando foi meu marido nos dez primeiros anos. Não aguentou a força da enchente de 83. Entrou no rio para salvar os móveis que a enchente tinha levado. Não sentiu febre. Mas na semana seguinte, foi picado pelo mosquito. Morreu de malária.

Na quarta-feira de uma semana arrastada, a velha do fustão sem cor movia-se com a memória nos anos em que se cria tão fértil quanto as águas então limpas do rio Lava Tripas. Quando montara casa, o rio não tinha nome, era um riacho afluente do rio Beberibe; não tinha nome nem o bodum dos detritos jogados pelo hospital a sua margem. O hospital mudou-se para outro endereço. O rio manteve o nome que lhe dá fama. Os moradores, tangidos pelas plantações de cana, e ali jungidos, fungaram o vapor da lama; devolvem-no ao rio nos trapos imundos, no que  fora o madeirame inteiriço de uma cama patente.

Dona Cema não se queixa do lixo que se amontoa na superfície e nas margens do canal das Tripas - o rio se encolhera; o nome, seguindo-lhe o rasto, deixara-se desfalcar na pronúncia. Mesmo porque, também ela se despoja do lixo doméstico na crosta dura da água sem correnteza.

As duas, tão sós quanto o oco da bodega, não se olhavam; tinham na fundura das órbitas o cansaço sem queixas de uma solidão velha. O bodum do canal, entranhado nas paredes da casa, não era de todo sorvido por causa do cheiro do charque gorduroso na panela sobre o lume chiante do fogo no fogão.

A negra, com um olho na memória e outro na segunda garrafa de cerveja, já sente a demência sobre o que ainda lhe  reserva a escassa fortuna. Vê o negro vistoso com quem dividira a estreiteza das molas da cama patente.

 - Senta, Silvino. Não bebe comigo não, pra não se queixar de dor no fígado.

- Dilermando bebe sem ter medo de doença. Só se queixa do cheiro podre que vem do rio. Mas não tem medo de se banhar da cintura pra baixo, quando vai arrancar ostra. Traz ostra e aratu pra comer ensopado.

O negro vistoso tem uma cor indistinta nos trajes de porteiro do hospital. O sol que  dá luz à sala da bodega, não alumia sua silhueta. O bodum do canal, entrando na porta da frente, restaura o cheiro de éter sorvido no hospital. Do lado do crioulo, Dilermando, sem traços no rosto da mesma cor de dona Cema, não diz uma palavra; só a queixa que resiste à febre da malária. 
 
As duas não têm  fome. A memória não lhes dá fome.

16 novembro 2013

Unidade e entusiasmo revolucionário

No Brasil, são trinta e dois partidos registrados. Cada um tem seu programa, seu modo de ser e de agir – e todos merecem respeito. Assim pensamos e agimos na cena política, nós do PCdoB. Mas nos orgulhamos em construir um partido fundado em princípios revolucionários, vinculado aos trabalhadores e ao povo, capaz de se renovar sempre e, sobretudo, coeso e unido. O 13º. Congresso do Partido Comunista do Brasil se coroa agora em ambiente de incontido entusiasmo e sólida unidade.

Palavra de poeta

O sábado é de Carlos Drummond de Andrade: “A porta cerrada/não abras./Pode ser que encontres/o que não buscavas/nem esperavas.”

Desígnios do império

A Segunda Guerra Fria
Eduardo Bomfim, no Vermelho


Em seu livro Formação do Império Americano publicado em 2009 o historiador, cientista político Moniz Bandeira narra as opiniões dos senadores Gary Hart, Democrata e Warren Rudman, Republicano, em 1999, ambos presidentes da Comissão Nacional para a Segurança/século 21 norte-americana, que os Estados Unidos continuariam como a principal força econômica, política, cultural do mundo, manteriam o domínio militar, pelo menos durante os próximos 25 anos.

Afirmaram que a “influência americana seria, ao mesmo tempo, aceita e crescentemente detestada”. De lá para cá muita água correu por debaixo da ponte, os EUA meteram-se em várias guerras, houve os atentados às torres gêmeas em Nova York etc., mas o fato é que as opiniões dos senadores mostraram-se corretas.

Agora Moniz Bandeira acaba de lançar outro livro sobre os atuais objetivos estratégicos dos Estados Unidos abordando, entre outras coisas, as recentes convulsões sociais na Eurásia, na África e no Oriente Médio.

Mas o que chama a atenção é o título: “A Segunda Guerra Fria”. Para o autor, prefaciado pelo embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, em resenha de Marco Aurélio Weissheimer, nós estamos sob o espectro de uma Segunda Guerra Fria promovida pelos Estados Unidos cujo motivo central é conter o avanço econômico da China, evitar o soerguimento da Rússia, e acredito, sustar a ascensão das outras nações que compõem os BRICS incluindo é óbvio, o Brasil.

Como exemplo cita o programa norte-americano intitulado “full spectrum dominance” (dominação de espectro total) de manter a hegemonia com assassinatos seletivos, uso de Drones, espionagem global através do sistema Prism, a força militar com 750 bases militares em 350 Países.

Além do projeto “regime change”: ações desestabilizadoras “por meio da luta não violenta, via guerra psicológica, social, econômica, política” que tem como alvo a população de determinado País, “motivando ondas de protestos, boicotes, procissões, revoltas etc.” utilizando-se, claro, da grande mídia global sob controle absoluto.

O alerta contido no livro de Moniz Bandeira, mesmo com as diferenças geopolíticas, não deve ser subestimado pelos setores patrióticos, democráticos, progressistas brasileiros visto o cenário cada vez mais pesado da realidade política, econômica internacional.

Aliança em favor do Brasil

No Vermelho:
Dilma: PCdoB é protagonista do processo de mudanças do Brasil

Em discurso nesta sexta (15) a presidenta da República, Dilma Rousseff, afirmou que sua participação no 13º Congresso é um momento ímpar para reafirmar a todos os militantes do combativo PCdoB os agradecimentos pelo apoio que tem recebido ao longo dos três anos de seu governo. Ela enfatizou a “longa, duradoura e histórica aliança” que une o PCdoB ao PT em todas as eleições presidenciais desde 1989.

Por Mariana Viel, da redação do Vermelho no 13º Congresso do PCdoB

“Só sabe construir o futuro quem soube lutar no passado. Só sabe construir o futuro quem está construindo o presente e quem tem novas ideias para seguir adiante”. Dilma iniciou sua fala elogiando as posições corajosas e a clareza política do discurso do presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, na abertura do ato político desta sexta (15). Lembrou que a força da aliança com os comunistas brasileiros foi construída em momentos históricos difíceis do país. “Essa é uma união da esperança de que é possível sempre fazer e avançar mais. Para essa concepção que nos une cada conquista é apenas um começo. E ela nasceu também da convicção de que é necessário continuar mudando o Brasil”.

“Não posso deixar de dizer que aqui, vejo nos olhos de cada um de vocês a mesma chama que animou o heroísmo patriótico de João Amazonas, de Mauricio Grabois, de Pedro Pomar e de Elza Monnerat. A mesma coragem e entrega daqueles que morreram no Araguaia sonhando e lutando por um Brasil melhor. É essa mesma chama de luta que eu vejo no discurso do presidente do PCdoB, Renato Rabelo. É uma força nos discursos que mostra os compromissos com a transformação”.

Dilma ressaltou a força da trajetória que constitui o PCdoB e suas lutas e que, segundo ela, sempre irá emocionar todos aqueles que participaram do momento difícil do Brasil que foi a luta pela transformação e pela construção da nossa democracia. “Essa força eu vejo também agora no Aldo Rebelo, no Inácio Arruda, no Haroldo Lima, no Orlando Silva e em tantos outros. Queria dizer que essa mesma força está nos corações das mulheres do PCdoB, da Luciana [Santos], da Vanessa [Grazziotin], da Perpétua [Almeida], da Manuela [D’Ávila], da Jandira [Feghali] e de todas as queridas ‘marias’ mulheres deste partido”.

A presidenta reforçou que a aliança com os comunistas está construída em torno de ideais, princípios e na “certeza de que um Brasil realmente rico e grandioso é possível se dele fizerem parte todos os 200 milhões de brasileiros e brasileiras. Se sua soberania for defendida e sempre contemplada, se sua democracia for cada vez mais forte e consolidada. O PCdoB foi e é protagonista de todo esse processo de mudanças que ocorreram no Brasil. Estou certa que as vitorias que alcançamos até aqui são parte inicial das grandes transformações que necessitamos. Por isso é bom lembrar que o Brasil que o PCdoB comemorou seus 91 anos e no qual se realiza o seu 13º Congresso é um país completamente diferente daquele em que iniciamos a nossa parceria no ano de 2003 quando chegamos todos na direção do Executivo federal”.

A mandatária brasileira fez um balanço da economia no país. Afirmou que em 2013, a inflação fechará o ano pela 10ª vez consecutiva dentro da meta estabelecida pelo governo. “Se equivocam aqueles que olham e dizem que a inflação não está sobre controle”. Ressaltou o controle da inflação e o compromisso com a estabilidade macroeconômica e com a geração de empregos — uma das principais diferenças do modelo neoliberal representado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e pela direita brasileira.

Ela apresentou os índices recordes de investimentos do governo federal através de programas centrais como o Bolsa Família, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o Minha Casa, Minha Vida, o Pronatec, e o Mais Médicos. Falou da atuação aguerrida da União Nacional dos Estudantes (UNE) na luta para assegurar o investimento dos royalties do pré-sal para a Educação brasileira.

“Temos uma união sólida feita em ações concretas e princípios e concepções. Isso não significa que pensamos igual, mas que somos capazes de realizar um debate franco em torno desses ideais e que respeitamos mutuamente nossas diferenças e a nossa força é justamente essa. É assim que se firmam as melhores alianças políticas com compromissos com o país, com a governabilidade, com o avanço econômico, com a defesa de nossa soberania e com o bem-estar de nosso povo. O fato é que o PCdoB me ajuda e compartilha comigo o desafio de governar o Brasil”.

15 novembro 2013

Felicidade

A sexta-feira é de Tom Jobim: “São coisas lindas que eu tenho pra te dar/Vem de mansinho à brisa e me diz/É impossível ser feliz sozinho”

Uma questão nodal

Um destaque do 13º. Congresso do PCdoB: O Projeto de Resolução 1 assinala a importância de coalizões políticas amplas e heterogêneas, seja para que se alcance a vitória eleitoral, seja para assegurar a governabilidade. Mas acentua: para que o movimento transformador avance no sentido da reformas estruturais que destravem a continuidade do crescimento econômico com inserção social, democracia e soberania - faz-se imprescindível um núcleo mais avançado, de esquerda, que reúna partidos, correntes políticas, centrais sindicais, setores mais combativos do movimento social, personalidades. Eis uma questão nodal.

14 novembro 2013

Sem pressa...

A quinta-feira é de Chico Buarque: “Não se afobe, não/Que nada é pra já/O amor não tem pressa/Ele pode esperar em silêncio”

"A consciência e a honra da Nação"

O 13º. Congresso e a consciência militante
Luciano Siqueira

Publicado no portal Vermelho www.vermelho.org.br  

Sou de uma geração que sentiu a chama da luta arder no peito a partir dos primeiros embates de rua e que buscou, sempre, alcançar a militância consciente, inspirada nos versos de Vandré “Vem, vamos embora/Que esperar não é saber/Quem sabe faz a hora/Não espera acontecer”.

Mas era uma consciência fragmentada, superficial, pontuada por lacunas sublimadas pelo impulso rebelde. Em meu caso pessoal, antes disso, no início dos anos 60, adolescente, voluntário do Movimento de Cultura Popular, no Recife, na gestão do prefeito Miguel Arraes, foi uma espécie de alumbramento, como diria o poeta Bandeira. Atuando no projeto Praças de Cultura, que mirava a juventude dos bairros periféricos; convivendo com personalidades de destaque, como o professor Paulo Freire; compartilhando o debate sobre as reformas de base e o sentido libertário da cultura popular – vivi uma fase em que muito via e pouco enxergava. Faltava-me maturidade para processar tudo aquilo. Sequer tinha plena consciência de que ali se fazia parte da nossa História.

É que, tal como o nosso povo em sua experiência coletiva, o militante percorre caminho próprio na busca de respostas a perguntas que se sucedem no percurso. E lhe assalta ao espírito uma felicidade imensa a cada salto na formação de sua consciência e na compreensão do rumo a seguir.

O 13º. Congresso do PCdoB contém em seu âmago uma espécie de fusão entre o impulso combativo e a consciência avançada. Tendo como fio condutor o Programa Socialista, cuja feição atualizada se consignou no 12º. Congresso, há quatro anos, o militante comunista pode agora compreender, em sua inteireza, o que se passa no Brasil e no Mundo e iluminar a peleja cotidiana pela percepção do sentido universal de cada acontecimento, estabelecendo o nexo entre o particular e o geral, entre a luta localizada e a luta nacional pelo poder político.

Assim se faz a análise das transformações ocorridas no Brasil na última década e o evolver da crise global. A avaliação da trajetória do Partido nesse cenário. O aclaramento das perceptivas de construção de um projeto novo de desenvolvimento nacional que, em perspectiva, gere condições materiais e subjetivas para o salto civilizatório rumo a socialismo, nas condições em que, no mundo hoje, se trava a grande luta pela emancipação da Humanidade.

Daí decorre uma espécie de felicidade coletiva imensurável e um apego ao mesmo tempo guerreiro e amoroso pelo Partido que, no dizer de João Amazonas, representa “a consciência e a honra da Nação”.  

13 novembro 2013

Para viver um grande amor

A quarta-feira é de Vinícius de Moraes: “Para viver um grande amor, preciso/É muita concentração e muito siso/Muita seriedade e pouco riso”

Conteúdo de coalizões partidárias

O fio da meada de frentes amplas
Luciano Siqueira

Publicado no Blog de Jamildo (Jornal do Commercio online)

Quem se alia com quem em torno de que projeto e sob que liderança?  A questão toma corpo a cada episódio eleitoral, quando o jogo de forças se faz a um só tempo complexo e instável no ambiente político brasileiro. Muito diverso de países da Europa, por exemplo, de poucos partidos e matizes políticos e ideológicos estratificados e em certa medida imutáveis.

O Brasil é diferente. “Não é para principiantes”, já se disse. Aqui, além da imensidão do território e das acentuadas diversidades regionais – históricas, econômicas, sociais, culturais -, que se refletem no comportamento dos partidos, grupos e líderes proeminentes em cada lugar, o espectro partidário comporta nada menos que trinta e duas legendas. Verdade que há partidos constituídos de fato e de direito e legendas legalmente respaldadas, porém basicamente cartoriais. Agremiações programáticas, não muitas; e uma maioria de natureza circunstancial, digamos.

Mas o fato é que na hora da onça beber água, ou seja, quando se aproxima o embate eleitoral, constituem-se alianças nas quais não será pelas aparências que nelas se encontrarão a coerência e a legitimidade, mas sim pela sua essência. E esta há que se reconhecer no projeto político de cada coalizão partidária constituída.

Mais: seja porque a força do fator local, do regionalismo – como acentuou Afonso Arinos de Melo Franco em opúsculo sobre a teoria e história dos partidos políticos no Brasil -, seja pelas “facilidades” da legislação eleitoral, alianças concertadas em plano nacional obrigatoriamente não se confirmam em plano estadual. Assim, nas eleições gerais do ano vindouro, partidos podem estar juntos em torno de determinada candidatura presidencial, porém separados e em palanques opostos nos estados.

Nesse ambiente caleidoscópico, onde encontrar “coerência ideológica e política”, tão reclamada por analistas acadêmicos (em geral distantes da cena política concreta)? Certamente não será no desenho das siglas coligadas, e sim nas proposições que cada coligação sustenta.

Cá na província, por exemplo, Miguel Arraes elegeu-se três vezes governador, sempre liderando frentes políticas amplas e heterogêneas. Foi o meio de juntar forças reconhecíveis pelo eleitorado e produzir a maioria de votos necessária. Entretanto, nas três ocasiões, o ideário básico sustentado por sua candidatura pôde ser identificado no apego aos interesses fundamentais do povo e à defesa da soberania nacional. Se incoerência havia, esta esteve em correntes políticas pouco identificadas com esse ideário, mas conduzidas pela necessidade de compartilhar espaços institucionais conquistados pelo voto – que seriam inviáveis fora da frente ampla, isoladamente.

Lula governou oito anos à testa de frente nacional amplíssima; Dilma assim se elegeu; como também Eduardo Campos em Pernambuco. O fio da meada está no programa adotado.

Agora, mirando 2014, intenso é o movimento visando a concertação de alianças. Por enquanto, carente de nitidez programática. Adiante, contudo, quem defende o quê haverá de se explicitar – sobretudo no pleito nacional, onde estará em jogo a continuidade das mudanças realizadas na última década versus o risco de retrocesso.