31 julho 2020

Militante, amiga, artista


Tereza Costa Rêgo, Vive!
Renato Rabelo

A morte de Tereza me deixou profundamente  comovido. Ela se despede, deixando uma memória de lutas junto ao Partido e um legado artístico que se tornará imortal. Conheci a camarada Joana, seu nome de guerra, no exílio em Paris, ao lado de Diógenes Arruda Câmara, destacado quadro e líder político do Partido Comunista do Brasil.

Na viagem de volta da República Popular da China, no final de 1976, após o Massacre da Lapa, em 16 de dezembro, fomos obrigados a permanecer em Paris. A operação das forças repressivas da Ditadura desbaratou a reunião do Comitê Central do PCdoB, assassinando três dos seus membros e prendendo outros quatro. Essa situação abrupta, de grande perda, nos deixava inseguros de voltar. Fui acolhido por Joana e Arruda, durante 5 meses, no apartamento em que viviam em Paris.

Convivi com eles, no exílio, inclusive com o camarada João Amazonas, e junto com outros camaradas, até final de 1979, quando então fomos beneficiados pela grande conquista democrática do Ato da Anistia. Formamos uma Direção do Partido, fora do Brasil, entre os três – Amazonas, Arruda e eu – buscando contatos internos e tentando transmitir orientações possíveis ao Partido, o qual se encontrava desorganizado no âmbito nacional e em grande parte dos estados.

Reeditamos o jornal A Classe Operária, mantivemos correspondência com endereços seguros e eu realizei viagem por um período mais extenso para Buenos Aires e Montevidéu, mantendo contatos presenciais com camaradas e com minha mulher, Conchita. A partir de 1978, minha família consegue viver comigo em Paris.

Durante todo esse período de exilio na França, Joana foi uma grande parceira, solidaria e generosa, dedicada à atenção e ajuda aos camaradas e amigos nas dificuldades de toda ordem, próprias das condições do exílio; assumiu inúmeras tarefas do Partido, viajava com Arruda, sendo sua companheira de toda hora. Os textos elaborados por Arruda, eram ditados por ele, e escritos por Joana, em decorrência das sequelas deixadas nas mãos dele pelas torturas que lhe impuseram em sua prisão em São Paulo.

Luciana Santos, nossa presidenta, em sua bela manifestação, logo após a morte de Tereza, enaltece o seu legado político: “Tereza, ao lado de Diógenes Arruda, doou energia, tempo e coragem na resistência à ditadura e na construção do nosso partido em tempos tão difíceis”.

A trajetória de Tereza Costa Rêgo tem seu lugar e sua particularidade na imensa e densa história de quase um século do Partido Comunista do Brasil, vincada por inúmeros quadros e militantes, lutadores abnegados e devotados, gente simples, trabalhadores com elevada estatura cívica, intelectuais inteiramente engajados à luta em tempos tão tenebrosos, mártires e heróis caídos em plena frente de batalhas, mulheres que apesar de valores obscuros e imposições dominantes, que tolhem inteiramente sua emancipação, numa “sociedade muito pesada”, ultrapassam esses obstáculos e se dedicam à luta transformadora, revolucionária.

Tereza é uma dessas lutadoras, é um exemplo de transgressão de todos os papeis que o patriarcado o tentou impor, nascida de uma família tradicional da aristocracia rural pernambucana. Os três tempos de sua vida são muito bem desenhados na sua trajetória: por sua origem, criada para ser apenas decorativa, preparada para um “bom casamento”, tolhida por limites retrógrados; rompe com esse status ultraconservador, desafiou convenções machistas, colocando-se contra as injustiças sociais, demonstrando sua marca de escolhas corajosas, se apaixona, se liga e segue um líder comunista, temido pelo status quo, numa demonstração ostensiva de uma clivagem com seu passado; por fim, após a morte de Diógenes Arruda, sem abandonar a sua formação política e ideológica, que lhe permitiu a maturidade e fortes convicções, assinaladas por ela própria, e seguindo escolhas corajosas, Tereza se encontra com ela mesma, desabrocha sua imensa inspiração artística, com traços e cores inconfundíveis.

A minha convivência e relação de atividade com Tereza é no exilio, no segundo tempo de sua trajetória, das quais tenho grande orgulho por sua militância tão generosa. O último tempo da sua trajetória, durante quatro décadas, até sua morte, mantém-se no Partido, se transforma no principal nome feminino da arte moderna em Pernambuco. Segundo os entendidos, é uma das artistas visuais mais importantes de Brasil – ainda que o país lhe deva um reconhecimento pela dimensão do seu trabalho. Situação que tem acontecido com muitos artistas de grande estatura.

O seu legado artístico é formado por grande acervo e de quadros monumentais. São muitos os destaques de sua pintura inconfundível. Eu situo a feitura de murais, geralmente utilizados por grandes artistas para expressar significativos acontecimentos históricos como “Guernica” de Pablo Picasso (1881-1973), e os grandes muralistas mexicanos, destacando-se, Diego Rivera (1886-1957), com sua obra magistral “Sonho de uma Tarde Dominical na Alameda Central”, que tive a oportunidade de ver no original, em Madri, na Espanha, e na Cidade do México, respectivamente. De Tereza, fiquei emocionado ao presenciar sua majestosa obra, Mulheres de Tejucupapo, 8m x 2,2m, em acrílico.

Velha novas dicas de leitura https://bit.ly/310BQuN

Baboseiras

— Bolsonaro ironiza vacina chinesa contra Covid-19.
— Dupla idiotice!
— !?
— Idiotice ao negar a ciência e idiotice diplomática!

30 julho 2020

Duas faces da luta política


Frente ampla e eleições municipais
Luciano Siqueira

O Brasil é assim mesmo: complexo e multifacetado em tudo o que verdadeiramente importa. Sobretudo na luta política.

Nada é retilíneo, tudo requer a consideração das muitas faces de um mesmo problema. Pensar dialeticamente.

Numa “live” recente – esse diálogo virtual que se multiplica aos milhões em tempo de pandemia -, me fizeram a pergunta: - A frente ampla agora fica para depois?

Isto porque num dado município de certo porte em Pernambuco, correntes políticas que convergem na oposição ao governo Bolsonaro irremediavelmente competirão entre si na disputa pela prefeitura.

São contradições naturais e contornáveis, como abordei há algum tempo atrás em meu canal no YouTube ('O PCdoB e a política de alianças' 
https://bit.ly/313VeHg
). 

O pleito municipal é um episódio local, ainda que se relacione com variáveis nacionais, seja pela dependência financeira dos municípios em relação à União federal, seja porque em certa medida o mapa eleitoral que emerge das urnas pesa na correlação de forças no conjunto do país.

Mas na imensa diversidade regional (e intra-regional) que marca a sociedade brasileira e num espectro partidário em que predominam agremiações partidárias pouco apegadas à coerência programática, as alianças municipais são furta-cor.

Variam no âmbito de uma microrregião do estado, por exemplo.

A um partido ideologicamente firmado, programático e uno como o PCdoB não cabe jamais desconhecer essa realidade.

Cabe seguir, como sempre, adotando condutas flexíveis e amplas na concertação de alianças, tendo como fio condutor propostas comuns para o município. Respeitando, quando for o caso, discrepâncias em relação à contenda nacional.

Também conviver com distintos projetos que se desenham tendo em vista a disputa pelo governo do estado, em 2022. Pelejamos agora numa mesma direção e depois será “outro dia”...

A prática política consequente requer isso. Como a água da chuva, que não perde a sua identidade e ao tomar o solo penetra em todas as brechas...

Nesse ambiente, a ideia força “cidades democráticas e mais humanas” emerge como referência para a aglutinação de correntes políticas locais em torno da candidatura majoritária comum.

A quase totalidade das prefeituras amarga dificuldades imensas decorrentes do enfrentamento da pandenma sem a ajuda necessária do governo federal. Já enfrenta, inclusive, um déficit financeiro comprometedor.

Aos novos governantes caberá de imediato assegurar o pagamento da folha do funcionalismo municipal, o início do ano letivo com alunos uniformizados, material escolar à mão, escolas em condições de funcionamento, com o corpo docente pronto, a merenda escolar equacionada.
Terão que garantir eficiente recolhimento e destinação do lixo, o funcionamento das unidades de saúde, etc.


A seguir poderão trabalhar para redefinir o rumo de políticas públicas permanentes e outras inovações constantes do programa com o qual tenham sido eleitos.

Ou seja, a “frente ampla local” é possível sem prejudicar a construção da mais ampla convergência possível, em âmbito nacional, em defesa da democracia e destinada a isolar, enfraquecer e derrotar o governo Bolsonaro.

[Ilustração: Cícero Dias]
Veja: 
O drama do desemprego no Brasil agora https://bit.ly/2X75FJ6

29 julho 2020

Oportunismo

Em tempo de crise e de sofrimento da maioria da população, o debate político pré-eleitoral há de ser elevado e sincero. Em respeito ao povo. No Recife, parte da oposição, sem escrúpulos, distorce os fatos e tenta confundir o eleitorado. Lamentável.

Futebol, pandemia e tática


Não se pode colocar erros e deficiências dos times na conta do vírus
Um dos maiores defeitos dos brasileiros é o excesso de espaços entre os setores
Tostão, na Folha de S. Paulo


Além do Estadual do Rio, que já terminou, outros estão de volta. É ótimo para quem está em recolhimento social e é colunista de futebol.
Existe um desencontro entre o grave momento da doença no Brasil, a responsabilidade dos governadores e prefeitos em liberar as partidas e a pressa dos dirigentes dos clubes e das federações em fazer a bola rolar.
É óbvio que quatro meses sem futebol prejudica a atuação das equipes e dos jogadores, mas não se pode colocar todos os erros e deficiências na pandemia.
A quarentena deveria também ser um bom motivo para os técnicos refletirem e mudarem várias coisas na maneira de jogar. Pelo que vi até agora, tudo continua na mesma, as deficiências e as virtudes. O goleiro Cássio continua grande, no tamanho e na qualidade técnica.
Segue a expectativa exagerada, fora da realidade, com os clássicos meias de ligação, como Lucas Lima, Luan, Raphael Veiga e outros, como se jogadores desse tipo fossem insubstituíveis e como se não brilhassem porque são indolentes.
Uma das deficiências mais marcantes nas equipes brasileiras é o excesso de espaços deixados entre os setores.
Isso dificulta a troca de passes e facilita para o adversário organizar as jogadas. Todos os grandes de São Paulo repetiram essa deficiência no retorno ao futebol.
O São Paulo recuava Daniel Alves e Tchê Tchê para iniciar as jogadas entre os zagueiros, mas deixava enormes espaços entre eles e os jogadores da frente, ainda mais que o meia Igor Gomes se posicionava muito próximo dos atacantes Pato e Pablo. Todos os grandes times europeus recuam apenas um volante para iniciar as jogadas entre os zagueiros, e não dois, como faz o São Paulo.
Assim como existem times e treinadores brasileiros que tentam evoluir e mudar, algumas grandes equipes da Europa, como o PSG, possuem estratégias coletivas parecidas com as usadas no Brasil.
Na vitória por 4 a 0, no amistoso contra o Celtic, o time francês jogou com quatro defensores, dois no meio-campo, dois pontas, um centroavante e Neymar, centralizado, livre, de uma intermediária à outra. Parecia um meio-campista.
Neymar recebia a bola no próprio campo, tentava driblar uns três à sua frente, muitas vezes conseguia, mas, quando perdia a bola, deixava a defesa toda desprotegida. Essa estratégia é ótima para Neymar e o time enfrentarem equipes fracas. Espero que Tite não faça o mesmo na seleção.
Uma equipe que tem dois atacantes magistrais, como Neymar e Mbappé, é candidata a ganhar qualquer título, desde que o técnico não atrapalhe tanto. Se os dois jogassem mais próximos e mais perto da área, o PSG ficaria muito mais forte.
Repito, todos os jogadores, especialmente os melhores, precisam encontrar seu lugar em campo, que seja bom para eles e para o time. São poucos os bons jogadores que atuam muito bem em todas as posições.
Um deles foi Zé Roberto, que parou de jogar no fim de 2017, pelo Palmeiras. Ele foi brilhante como lateral esquerdo, como ala esquerdo, no esquema com três zagueiros, de ponta esquerda avançado, de meia de ligação, no Santos, e, principalmente, como meio-campista (segundo volante), atuando de uma intermediária à outra, como jogou no Bayern de Munique e na seleção brasileira de 2006, quando foi o único do time escolhido para a seleção do mundial.
Gostaria de perguntar a Zé Roberto onde ele acha que jogou melhor e teve mais prazer de atuar. Ele sabe melhor que todos nós.
O drama do desemprego no Brasil agora https://bit.ly/2X75FJ6

Conflito e soberania

A soberania chinesa e a questão de Xinjiang. Frente às recorrentes abordagens midiáticas críticas à suposta “dominação chinesa” sobre a região de Xinjiang, vale destacar o contexto histórico e alguns dados capazes de potencializar a compreensão dessa complexa problemática. Leia aqui https://bit.ly/39EAyto

28 julho 2020

Minha equipe

Agora, em reunião de controle com a equipe do meu gabinete. As demandas cotidianas sitiadas na conjuntura política. Confio nessa equipe, sempre. (Foto: LS) 

Um poema para Tereza


Tereza vezes Tereza
Marcelo Mário de Melo
(Em memória de Tereza Costa Rêgo, pintora e militante socialista)

Teresa pintou o sete
vezes setecentas vidas
mulher quebrando as algemas
vendo do povo as feridas.

Pintou murais da história
de resistência e façanha
a luta contra a opressão
onde o povo perde/ganha.

Pintou o amor a alegria
os arroubos da paixão
fazeres do dia a dia
clamor de rebeliao.

Pintou sempre em desmedida
com o seu pincel gigante
das telas para as paredes
na espiral incessante.

Pintou vendo da janela
arroubos de carnaval
clamores de liberdade
a vida no vendaval.

Pintou os prazeres plenos
as florações da beleza
as alegrias da vida
o pão e o vinho na mesa.

Todos juntos lamentamos
Olinda chora por ela
a família os companheiros
os que a lembram na janela.

Mas o maior sofrimento
devo aqui assinalar
no final desta viagem
nos pincéis do teresar.

Na saudade de Teresa
da dor o maior açoite
quem sofre mais é o seu noivo
o Homem da Meia Noite.


Fotografia: O olhar de Pedro Caldas

Foto: Pedro CaldasO olhar de Pedro Caldas

27 julho 2020

Para Tereza, com carinho


Camarada Joana
Haroldo Lima

No final da tarde de domingo, em meio a essa pandemia avassaladora, chega a notícia de que Tereza Costa Rêgo, a festejada artista plástica de Pernambuco, partira. Quem comunicou o fato foi Luciana Santos, vice-governadora de Pernambuco e presidenta nacional do PCdoB. Ao dar a informação, Luciana acrescentou que “os vermelhos perderam alguns tons de intensidade, neste domingo tão triste”.

Tereza era a camarada Joana, que vem conosco, nessa labuta libertária e pelo socialismo, desde os tempos da ditadura militar até os dias de hoje, décadas. Seu talento artístico invulgar, ela o pôs em sintonia com a movimentação revolucionária da qual participou anos a fio. Vibrava com a arte, vibrava com as vitórias da resistência à ditadura, vibrava com os avanços que via do socialismo.

O tempo passa inexorável e transforma em lembranças lances de alta intensidade.
E assim é que recordo a acolhida que tive em Paris quando lá cheguei em 1976, de passagem para a Albânia e para a China. Fiquei hospedado, semanas, em casa de Diógenes de Arruda Câmara, o Arrudão, a quem é dedicado “Os subterrâneos da liberdade” de Jorge Amado. Joana era a companheira do Arruda.

De logo um fato marcante, desses que não se esquece. Toco no apartamento cujo endereço levava. Abre a porta uma mulher. Brasileira, pelo jeito. Bonita. Estava só. Chorando.

Soubera da minha chegada e já me esperava, manda-me entrar. Fico sabendo que há poucos minutos recebera a notícia da morte de um seu irmão, lá no Recife.
Arruda chegou pouco depois. Passamos a conviver os três naquele apartamento. Dias depois a Joana me conta que acabara de saber da morte do irmão quando a campainha tocou e era eu. Naquele momento adverso em que a mente dilacerada vagueia à procura de algo, eu chegara para compensar a falta do irmão. E ficamos nos tratando como irmão e irmã até que o tempo desfizesse essas imagens.

Na Albânia e na China tudo era objeto de observações meticulosas. Fábricas e escolas, logradouros. E havia viagens , reuniões. Os programas eram puxados. Eu, relativamente jovem e cheio de entusiasmo não cansava por nada, Arruda, resistência de um touro, estava sempre disposto. E a Joana nos acompanhava em todos os cantos. Quando parava era para pintar, para presentear albaneses e chineses com quem nos relacionávamos.

Na viagem de regresso, de novo Paris. Eu demonstrava a minha admiração sincera pela arte da Joana e pela arte em geral, sobre a qual Joana sempre falava. Um dia fui ao Louvre. Vi a Vitória de Samotrácia logo na entrada, vi uma porção de coisa, vi a Mona Lisa.

Em casa, quando soube, a Joana achou ótimo eu ter ido ao Louvre e perguntou-me se eu tinha observado tal coisa, e tal outra, e mais outra. Percebo que tinha entendido pouco do que vi. A Joana fez-me então um convite magnífico, programar uma demorada visita ao Louvre com ela me explicando o que estava em exposição. Incrível. Vi um outro Louvre, interessantíssimo.

Voltei ao Brasil ainda clandestino, pela Argentina, onde estava o Dinéas Aguiar. E aí os acontecimentos vão se sucedendo, Chacina da Lapa, prisão, tortura, cadeia, anistia, liberdade, chegada de alguns que estavam no exterior, Renato Rabelo, Conchita, Arruda, Joana. Prepara-se a chegada de Amazonas, João Amazonas, o principal reorganizador do nosso Partido.

Em São Paulo, no aeroporto de Congonhas, numa tarde chega o João. O Partido tinha preparado uma recepção, lá estavam o Renato, o Arruda, dirigentes do Partido local, Joana, eu. O plano era recepcionar rapidamente o João no aeroporto e nos dirigirmos ao Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, onde haveria um ato de boas-vindas. Todos animados, o Arruda eufórico. Saímos para o Sindicato. Arruda vinha no mesmo carro que o João.

Chego nas imediações do Sindicato antes dos outros, pois saíra na frente. A Joana também chegara. Alguém, tenso, me chama e diz que Arruda morrera dentro do carro, naquela hora. Que choque. E em seguida um acerto, eu, por ser o mais chegado a Joana, deveria dar-lhe a notícia.

Comecei a falar-lhe, procurando um caminho sinuoso para abordar a questão. Ela percebeu minha dificuldade. Lembro-me bem: pegou-me nas mãos, olhou-me nos olhos e disparou: diga-me, Arruda morreu? Confirmei e acompanhei-a até o hospital e a sala onde estava o corpo do Arruda. E aí, também me lembro bem. Quando ia abrir a porta que dava acesso à sala onde estava o Arruda, a Joana toma a minha frente, fita-me com firmeza e diz: não quero que ninguém entre comigo, fique aqui. Entrou sozinha e encostou a porta.
Passaram-se longos minutos. Fui ficando tenso. Resolvi abrir vagarosamente a porta e entrei. Na sala só estava o corpo do Arruda deitado em uma espécie de laje com a Joana do lado.

Anos depois, vejo um painel enorme, impressionante: Arruda estirado em uma espécie de laje e uma mulher prostrada ao seu lado, desolada. “O senhor morto” é o nome desse quadro pintado pela Tereza Costa Rego, em Olinda.

Haroldo Lima era amigo de Tereza Costa Rego  

A luta e o afeto dão cor à vida https://bit.ly/3eQE5WQ  

Palavra de poeta


Desesper(o)anças
Chico de Assis

Há sempre um canteiro
onde regar a flor
murcha nas mãos
e um leito onde desaguar
o rio corrente dos olhos.

Não desesperes. Tua ternura
dissipou-se nas armações
irreais da tua classe.

Mas te espera
a ternura esculpida no barro
batido dos bairros operários.
Ternura marcial militar
de um filme de John Ford.

Não desesperes.Dispõe teu amor
no chão sem ladrilhos
recolhe o resíduo
do erro cometido.

E não chores mais
o tempo perdido.
O tempo
     (verdadeiro)
que se teve
não se perdeu.

(OUT/70 - três meses depois da minha prisão política, pela ditadura civil-militar implantada no Brasil em 1964)

[Ilustração: Ivald Granato]
A vida pede muitos encontros e muitas realizações https://bit.ly/2XypaLe 

Desemprego no centro da luta



Neste vídeo comento sobre o avanço do desemprego no país, juntamente com a pandemia, o que vem causando problemas para milhões de famílias brasileiras. Confira.

Veja também:

Enfrentando
a tragédia nacional
https://bit.ly/2CwMpND