Por onde anda Marcianita?
Luciano Siqueira
instagram.com/lucianosiqueira65
O primeiro telefonema do dia é do velho e sempre presente Epaminondas:
- Lembra-se daquela musiquinha da
jovem guarda em que um cantor de voz fraca sonhava com o amor de uma
Marcianita? Veja os jornais de hoje: ela pode estar por aí...
Lembro-me da música sim, embora
jamais tenha prestado atenção à letra inteira: “Esperada, Marcianita,/Asseguram
os homens de ciência/Que em dez anos mais, tu e eu/Estaremos bem juntinhos,/E
nos cantos escuros do céu falaremos de amor...”.
Com tanta coisa importante a tratar,
o noticiário cheio de informações reais e fictícias, notas plantadas em colunas
de política e de economia, e o Epaminondas interrompe minha leitura matinal com
assunto tão irrelevante!
- Irrelevante coisa nenhuma! Leia,
homem, preste atenção ao que a NASA acaba de descobrir: poderia ter havido vida
em Marte!
De fato, está nos jornais: cientistas
da agência aeroespacial norte-americana afirmam que uma rocha sedimentar
encontrada pelo jipe-robô Curiosity contém seis elementos químicos necessários
à existência de micróbios - enxofre, nitrogênio, hidrogênio, oxigênio, fósforo
e carbono. Daí se depreende que o planeta já teve condições de habitabilidade
por gente tipo a gente cá da Terra.
Um tal John Grotzinger, comandante
científico da missão Curiosity é categórico: essa rocha é bem parecida com o
tipo de coisa que achamos na Terra. Encontramos um ambiente habitável tão
benigno e amigável à vida que, se essa água ainda existisse e nós estivéssemos
ali no planeta, poderíamos bebê-la.
Para Epaminondas, eis a senha para a
busca de Marcianita, empreitada com a qual deseja me comprometer.
Ora, tenho lá tempo para me preocupar com essa bobagem! Mas o amigo é
persistente:
- Cara, os americanos são dados a
descobertas fantásticas, leve isso a sério. Veja o que botaram no relatório da
pesquisa (prossegue do outro lado da linha com um exemplar da Folha de
Pernambuco em punho): “O jipe-robô ainda não encontrou substâncias orgânicas,
que seriam um sinal inquestionável da existência de vida em Marte. Mas isso já
não é mais necessário para dizer com segurança que o planeta era habitável,
pois a maioria das bactérias da Terra metaboliza substâncias inorgânicas.”
A tese de Epaminondas é que se antes,
sabe-se lá quando, aquele planeta era habitável, pode ter gente de lá zanzando
por aqui, feito assombração, mas de carne e osso. Marcianos e marcianas.
E enquanto cantarola a musiquinha,
chamando por Marcianita, segue especulando que pode haver elementos infiltrados
em centros de pesquisa científica, ou nas redações dos grandes conglomerados da
mídia internacional, ou na Aple ou Microsoft, ou mesmo no alto comando de
partidos da extrema direita brasileira.
- Pode ser um perigo!, adverte.
Bom, para cortar a conversa, ponho-me
em solidariedade ao conterrâneo admitindo que pelo menos num canto do Brasil
nenhum alienígena representa ameaça: a cúpula da extrema direita. Dalí nada sai
além de furor odioso contra o PT e a esquerda e maledicências típicas da viuvez
do neoliberalismo.
Nem mesmo Marcianita, com os encantos
proclamados na musiquinha sem graça, produziria ali uma ideia nova.
[Se comentar, identifique-se]
Nenhum comentário:
Postar um comentário