05 agosto 2019

Falando para si mesmo


Líder de quem?
Luciano Siqueira

Natural que um cidadão alçado à presidência de um país ganhe status de líder. Mesmo numa sociedade tão dividida como o Brasil de agora.

E presume-se que essa liderança se dê sobre parcelas expressivas da população, até como elemento de autoridade política.

O capitão Jair Bolsonaro não é um líder desse quilate. Obteve a maioria dos votos válidos no segundo turno do pleito presidencial em outubro, com vantagem de cerca de dez milhões de votos sobre o seu oponente, Fernando Haddad, mas em pouco mais de duzentos dias de governo vê decair seus índices de aprovação num ritmo sem precedentes.

Agora, informa o Datafolha, um terço dos brasileiros tem opinião similar à do presidente quando ele vomita impropérios de toda ordem – atacando ambientalistas, homenageando a ditadura militar, mostrando-se indiferente ao massacre no presídio de Altamira (PA), com 62 mortos e assim por diante.

No quesito avaliação do governo, apenas 33% da população considera o seu governo bom ou ótimo.

Normalmente, qualquer que seja a inclinação política e ideológica, o governante cuida de conquistar novas parcelas da população com o fim de melhorar seu índice de aprovação.

Seja pelo valor político intrínseco disso, seja para que preserve a sua autoridade perante os demais poderes da República e a opinião pública internacional.

Bolsonaro, entretanto, age de modo diferente: repete suas diatribes à exaustão, contentando-se com a aprovação do seu nicho de apoiadores, alimentados pelas “milícias cibernéticas” que cuidam de replicar suas falas.

Não é um dado positivo. Revela desprezo pelo exercício da democracia, que requer a formação de consensos em torno do governante. Sobretudo num país em crise e marcado pela dispersão de sentimentos e ideias.

Se o presidente considera possível governar com esse um terço de aprovação e com a submissão do Parlamento e a conivência da mídia corporativa, pode estar enganado.

Na medida em que a crise se arrasta e leve consigo todo um cortejo de agravamento das condições de sobrevivência da grande maioria da população, vai se formando uma consciência inicialmente difusa, e adiante organizada, de resistência que poderá – se convergir para um mesmo leito no campo democrático – interromper a aventura bolsonarista em 2022.

Quem viver verá.

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